quinta-feira, 5 de novembro de 2015

FanFic: "Aprendendo a viver" (+18)

Autora: Tay Jackson







Michael Jackson é um jovem publicitário de trinta e cinco anos, que tem uma filosofia de vida de acordo com os seus princípios. Apegado à sua infância bem vivida e feliz, leva consigo uma importante lição: "Faça o bem, sem olhar a quem". Mesmo com a figura do pai bêbado dentro de casa na infância, tentou se espelhar em sua mãe, ao qual sempre fora sua força. Michael cresceu  como um homem de valores, ao qual qualquer pessoa que o conhecesse o queria muito bem. Até mesmo o seu chefe, Robert Robson, dono da Robson's Enterprises, que o denomina como "O seu braço direito". 
Robson é um sujeito despachado que encara o mundo de um jeito prático, onde a vida deve  ser como o mundo dos negócios. Tudo se trata de negociações e jogos de interesses. Se não for assim, tudo se arruína. 

Michael se torna tanto o braço direito de Robson, que o mesmo lhe confia uma missão infalível: Cuidar de sua filha e lhe contar tudo que descobrir sobre ela. Porém Michael descobre coisas ao qual lhe perturba. Ella Robson, criada em um colégio interno religioso,  está atolada em uma vida sombria, cheia de mágoas e traumas. Algo que é difícil demais de superar. Lhe deixou marcas profundas que somente a ajuda de Michael para que saia desse poço profundo. 

Seu único desejo é ser feliz. Se libertar, buscar uma vida melhor. Voar como águia, indo de encontro a sua libertação. Já o de Michael,  seu anjo protetor, é ver em seus lábios um sorriso sincero.

Canção tema da história 



Não é estranho?

O jeito com que as coisas podem mudar?

A vida que você controla, virada de cabeça para baixo

De repente, alguém significa mais do que antes

A casa em que vive passa a ser uma esperança

Bridge:

Sinto muito, mas quis dizer

Muitas coisas ao longo do caminho

Essa é para você

Chorus:

Eu já lhe disse que me dôo?

Eu já lhe disse que me dôo?

Eu já lhe disse que me dôo

Por você?

Eu já lhe disse que me dôo?

Eu já lhe disse que me dôo?

Eu já lhe disse que me dôo

Por você?

O tempo que levou

Escrevendo palavras para meu livro

Parece ter subitamente parado

O portão que fechei

Da última vez me machuquei

Parece ter se aberto

Então

O que está acontecendo agora

Está tentando me alcançar

Diga-me para aproveitar aqui e agora

Bridge:

Sinto muito, mas quis dizer

Muitas coisas ao longo do caminho

Essa é para você

Chorus:

Eu já lhe disse que me dôo

Eu já lhe disse que me dôo

Eu já lhe disse que me dôo

Por você?

Eu já lhe disse que me dôo de amores?

Eu já lhe disse que me dôo de amores?

Eu já lhe disse que me dôo de amores

Por você?






Capítulo 1




Quando eu era criança, a vida parecia ser simples. Brincávamos tranquilos como se a vida fosse uma eterna diversão. A vizinhança era calma, nada de crimes ou violências por aí. Podíamos ficar até tarde nos aquecendo na fogueira, tocando um som, ou até mesmo brincando de esconde-esconde, o que viesse. 



Sempre fui o popular da minha turma, era eu que escolhia as brincadeiras, eu tinha as melhores ideias de uma nova diversão. E também, muitas vezes colocava meus amigos encrencados, por convencê-los a escapar da proteção de seus pais para ir do outro lado do quarteirão, para brincar no play ground perto da praia. Realmente foram ótimos tempos, onde o mundo parecia ser fácil em lidar. 



Aos meus oito anos, quando me falavam que a vida de adulto era complicada eu nunca imaginei o quanto seria. Não fazia parte da realidade de um garoto de oito anos, acostumado a se embrenhar na floresta para subir nas árvores e ficar lá o dia inteiro sem pensar em beber e nem se alimentar. 



Assim quando eu nasci minha mãe me deu o meu nome. Ela sempre dizia que jamais escolheria o nome do seu filho antes de seu nascimento, como a maioria das mães fazem. Ela queria olhar nos meus olhos e entender as minhas reações. Mas não pense que ela me bombardeava de nomes esquisitos esperando um sorriso, ou um choro, porque não. Ela olhou nos meus olhos e Michael veio de repente. Talvez eu tenha cara de Michael talvez é o nome que realmente combina comigo. Eu gosto do meu nome, nunca me queixei como a maioria das pessoas se queixam dizendo que preferiria outro. 



Lembro-me da minha mãe com carinho, sempre presente, sempre atenta às minhas necessidades. Fora uma mãe carinhosa em todos os aspectos, acho que por isso me tornei o homem que sou hoje. Acredito que os filhos são o reflexo dos pais, ou de quem os cria, sem essa base o caráter se modifica. Já vi muitos dos meus amigos que não tiveram a mesma sorte que eu, se darem muito mal depois de adultos, por causa de uma criação ruim. Mas também vi muitos com criação exemplar se tornar o mesmo mau caráter. Talvez seja questão de humano para humano, ou sei lá. 



Se minha infância fora tranquila e cheia de diversão, por outro lado a minha adolescência fora completamente ao contrário. Não que tenha sido um bicho de sete cabeças, ou uma turbulência sem fim, mas fora o período que eu me tornei inseguro. Não tinha mais a mesma quantidade de amigos que tive na infância, não era o mais popular e não tinha ideia nova para assunto ou algo para fazer. Os jovens da minha época queriam outro tipo de diversão, eles arrumavam encrenca, queria beber, se drogar. Coisa que eu não fazia a mínima questão. Eu tinha consciência do que acontecia a pessoas viciadas, o quanto se acabavam. Correndo risco de morrer ou algo pior, se é que tinha algo pior que a morte. Talvez sim, perambular por aí como se fosse um morto vivo, dependente de um vício que te destruiria aos poucos. Tive de enfrentar tanto com o meu pai que era como um pesadelo para mim ter aquela vida um dia. 



Minha mãe era um anjo, costumo dizer que é a mulher da minha vida. Mas meu pai por outro lado, era o oposto. Vivia trabalhando o dia todo, eu mal o vi a minha vida toda. Quando estava em casa era sempre bêbado e discutindo com a minha mãe. Teve momentos que eu fingia estar dormindo só para ouvir os choros estridentes dela, por sofrer tanto com um homem viciado. Não consigo entender como uma mulher como ela pôde se apaixonar por ele, mas quem sou eu para julgá-la? Talvez o amor seja muito mais forte do que qualquer outra coisa, se tem uma pessoa que sabia amar era ela. 



No dia que ela morreu o mundo acabou para mim, eu não tinha mais a minha base, nem mesmo o que fazer para continuar. Fiquei perdido no mundo sem saber como reagir. Mas uma voz dentro de mim, que eu sabia que era a dela, me dizia para seguir em frente e lhe dar orgulho. Talvez seja por isso que me tornei um adulto satisfeito consigo mesmo, pelas atitudes em que tenho assumido. Sentirei muita falta dela, mas eu sei que sempre estará no meu coração, brigando comigo sempre que eu fizer algo errado. 



Hoje sou um publicitário, desenvolvedor de marketing para a empresa de publicidade da Robson's Enterprises. Tenho orgulho do meu trabalho, sou muito bom no que faço e meu chefe me adora. Acho que prosperei na vida. 


San Diego era a cidade perfeita para mim, eu adorava o clima ensolarado praticamente o ano todo, a vizinhança cheia com sorriso estampado no rosto como se a vida fosse fácil. Lembro-me da minha infância e me sinto à vontade. Por esse motivo todas as manhãs eu fazia uma corrida básica pelas calçadas, como estou fazendo neste momento. É bom para a minha saúde e para o meu corpo físico, sinto-me revigorado, com a força de que preciso. 

Uso uma calça moletom cinza e um casaco de frio com capô sob minha cabeça. Está ensolarado, mas um pouco frio. As calçadas repletas de ambulantes vendendo suas mercadorias e crianças brincando de cordas do outro lado da rua, dá um clima acolhedor.

—Ei, Michael! Como vai? —Sou cumprimentando pelo dono da quitanda em que às vezes fazia compras. 
Seus vegetais e hortaliças estendidas sobre a calçada está de boa aparência. Pronta para ser servida no prato da dona de casa. 
—Estou muito bem, obrigado. —Diminuo o ritmo da corrida para cumprimentá-lo. 

Uma das melhores coisas é saber que alguém gosta de você. Que alguém lhe respeita e lhe cumprimenta, sempre que o ver somente porque faz parte daquele dia-a-dia. E eu tenho certeza que não é só porque eu sempre deixava cinco dólares a mais quando comprava alguma coisa. 

Entro no meu prédio às pressas, eu tinha que trabalhar. Subo as escadas correndo ignorando o elevador é mais uma forma de me exercitar. Rodo a chave na maçaneta da porta e entro no meu apartamento pequeno, mas aconchegante. Primeira coisa que faço ao fechar a porta é tirar os meus tênis, a segunda são as calças e a camisa molhada de suor. Depois a cueca caminhando nu pelo lugar com intuito de tomar um banho. Uma das vantagens de morar sozinho é poder transitar dentro de casa completamente nu sem se preocupar com pudores ou regras.Eu faço as regras! Ligo o chuveiro deixando cair sob meu corpo. Uma água quente e relaxante tirando todo o suor do meu corpo, me tornando limpinho e pronto para o trabalho.

Busco uma cueca limpa no meu armário após o banho. Encaro minha imagem ao espelho sabendo que meu tipo físico me agrada. Malhar servia para duas coisas: manter uma saúde equilibrada e ter uma aparência boa. Logo depois, visto uma calça social, camisa social. Faço o nó na gravata ainda olhando-me no espelho. 

Eu sempre fui um cara inseguro, ainda mais na minha adolescência. Meu rosto era cheio de espinhas, era magricelo e todos os meus amigos tinha namorada menos eu. Demorou a beça até eu perder a virgindade, por causa da minha timidez. Agora hoje não. Eu tenho uma aparência que eu gosto. Corpo definido, sem aqueles exageros de musculatura. Rosto quadrado bem masculino ao qual eu deixo a minha barba pôr fazer, crescida, mas bem arrumada. Meu cabelo é negro, curto, mas ainda é possível dar alguns puxões e notar uma mexa caída na frente. Odeio deixá-lo crescer mais que isso. Meus olhos são bem negros em um grande expressivo. Sim, eu sou um cara bonito hoje em dia. Não sei por que ainda estou sozinho, talvez seja porque eu tenho me focado mais no trabalho do que conhecer garotas. 

Só tive um namoro sério em toda a minha vida, e mesmo assim, fora muito breve. Não foi uma paixão arrebatadora, mas também não foi algo frio e sem sentido. Ela era uma amiga de faculdade, adorávamos a companhia um do outro, ela me fazia rir. Perdi a virgindade com ela, foi muito bom, e algo importante na minha vida. Até hoje eu não sei por que terminamos se nos dávamos muito bem. Talvez seja porque ela tinha outros interesses que não condiziam com os meus. Ela queria ir a Nova York e conquistar o mundo, eu apenas fazer o que eu gosto na minha cidade mesmo. Ficamos juntos por seis meses. 

Borrifo um perfume no meu corpo e já estou pronto para ir à Robson's Enterprises. 
Meus pertences estão dentro da mochila que coloco nas costas. Pego minha bicicleta e saio de casa. Transito pelas ruas pouco movimentadas, cumprimentando uns e outros que encontro pelo caminho. A empresa não é tão longe assim, então logo chego prendendo a bicicleta com correntes e cadeados na minha costumeira vaga. 

—Ei Michael, você é o cara! —Vince vem me cumprimentar com um sorriso amplo no rosto, assim que cruzo o corredor da empresa. Fico encabulado em saber o que eu havia feito de bom.

Olho ao meu redor e todos estão em seus cubículos colocando o trabalho a todo vapor. 

—O projeto que você desenvolveu foi um sucesso, já somos um dos melhores da marca. O cliente adorou. 

Fico satisfeito, tenho minhas qualidades e muito foco no que eu faço e acredito. Eu tinha certeza que não sairia por menos. 

—Senhor Robson já sabe? —Talvez o presidente sabendo, aquele que sempre me diz que sou o melhor no ramo da publicidade, cuja confiança sempre fora depositada em mim, eu poderia subir de cargo. O diretor quem sabe? 
—Com certeza. É por isso que me pediu, assim que você chegasse, para lhe dizer que fosse até sua sala. Pode ser que vem coisa boa por aí. 

Fico ansioso, talvez seja agora que eu teria a oportunidade de conseguir prosperar dentro da minha área. Não que eu seja ambicioso ao ponto de sempre querer mais e mais. Mas eu já estou tanto tempo naquela empresa, desenvolvendo os mesmos projetos, sempre elogiado, que penso que mereço. Senhor Robert Robson sempre diz que eu mereço. Pode ser agora. 

—Então não vamos deixar o chefe esperar. —Me preparo para ir até o andar da presidência, talvez trilhando por um caminho bom para mim. 
—Boa sorte, Jackson. Você merece. —Vince coloca dois dedos na têmpora direita e joga para cima, uma forma de cumprimento. Faço o sinal de volta pegando o elevador. 

Arrumo meu terno, alinhando-o perfeitamente no meu ombro. Meu sorriso é esperançoso. Posso contar nos dedos a poucas oportunidades que tive na vida. Uma vez trabalhei como auxiliar de gerência em um banco para conseguir pagar um curso barato de publicidade. Não era o emprego dos sonhos, mas pude me manter muito bem. A carga horária era bem agitada e quase não tinha tempo para nada. Sem contar o meu chefe autoritário que me tratava como se eu fosse o seu escravo. Fora bastante estressante, mas graças a Deus consegui sair de lá e fazer o que eu realmente gosto. 

Bato na porta onde há um letreiro talhado, com o nome do presidente. Logo ouço me mandar entrar. 
Sr. Robson está relaxado em sua cadeira, sem terno e com a gravata mal arrumada. É deste modo que diz que o ambiente é seu e de mais ninguém. O admiro imensamente por ter conseguido construir um império praticamente sozinho. Um dia chego lá. 

Sua aparência é de um senhor bastante jovem ainda, tipo físico em forma e a barba já quase ficando grisalha. Sr. Robson é o tipo de cara que eu diria que quando crescer queria ser exatamente igual a ele. 

—Michael! Que honra lhe receber! Não imagina o quanto estou orgulhoso de ti. —Sorrio de lado, tendo a certeza que eu também me sinto orgulhoso.

Ele se levanta da cadeira parando ao lado da janela com vidraças do chão ao teto. É uma visão bem panorâmica da cidade lá fora. Espetacular!

—Você se tornou um dos melhores que tenho trabalhado até agora. É um rapaz centrado e admirável. Lembra-me quando eu tinha mais ou menos a sua idade, a sede que eu tinha de colocar esse lugar para ser um dos melhores do mundo. —Dá uma pausa, encarando-me. —Não somos os melhores, mas um dos melhores pode ter certeza que somos. 
—Meus parabéns, senhor. Essa empresa é como se fosse a minha casa, me dedico ao máximo para desempenhar um trabalho perfeito a cada dia. 
—E tem conseguido. É um dos meus braços direito e eu confio imensamente em você. 
—Muito obrigado, senhor. 

Acho que ser elogiado pelo chefe, era um privilégio, além de uma satisfação interna que não tinha preço. 

—É por este motivo que quero lhe fazer uma proposta. Você fez o teste e foi aprovado, - Parece que minhas desconfianças estão bem certas. Estou empolgado.
—Sim, senhor. Estou a todo ouvidos. 
—Terá um evento muito importante no Hotel Pollo neste final de semana, preciso que me auxilie. Terá convidados que sinceramente não faço ideia de quem sejam, mas preciso fechar negócios. Não quero parecer um idiota que fica perguntando de cinco em cinco minutos quem se trata. Além de deselegante, não posso parecer que não conheço os meus próprios convidados. Perderei contrato e consequentemente ficarei mal falado entre eles. O que estou tentando dizer, é que eu preciso que seja o meu assistente. Decore os nomes de cada um deles e suas funções, principalmente coisas pessoais. Preciso me enturmar. 

Sabe naquele momento que você está quase chegando ao orgasmo e sua parceira grita dizendo que seus pais haviam chegado, e que você precisa se esconder? Suas bolas vão a baixo, e seu pinto despenca em um broxa filho da puta? Foi exatamente o que eu senti. 

—Assistente? —Pisquei meus olhos várias vezes, na tentativa de acordar daquele sonho, só podia ser um. 

De publicitário muito bem sucedido, com o trabalho reconhecido por várias outras partes no âmbito empresarial, a assistente de Robert Robson em um evento? Que porra de teste é esse que eu havia passado? Tento forçar um sorriso, mas acho que não deu muito certo. 

—Você é o cara que eu mais confio por aqui. Sei que é profissional impecável, não conheço ninguém que se empenha tão rápido em um assunto. Preciso que tome nota dos convidados, que lhes envie os convites e me auxilie na festa. Jackson... —Senti sua mão no meu ombro. Aqueles elogios pareciam bem falsos agora. Maldita hora que eu acreditei na admiração desse homem. —É só por este final de semana. Preciso demais da sua ajuda. 

Olho para seu rosto e neles pude perceber um pedido suplicante e misterioso. Não entendo o porquê, mas sei que sou realmente o único que pudesse lhe ajudar. Qualquer outra pessoa poderia fazer esse trabalho para ele; seus assistentes, assessores, até mesmo os seus funcionários. Esta não é a minha função, mas não quero contestar, ainda mais por perceber o pedido e naturalidade íntimo e pessoal. 

Não quero ser o responsável de Robson perder contrato, sei que não sou, mas se eu não ajuda-lo pode ser que aconteça. Robson é um empresário espetacular e sabe se virar sozinho, porém é a mim que ele quer. Mas e que opção eu teria? Sou apenas um funcionário que pretendo um dia subir na vida.

—Se é o que o senhor quer. 

Ele sorri aliviado, e percebo que realmente é algo que só eu poderia ajudar. 

—Minha filha está para chegar. —Me avisa com um tom bastante animado. —Estou ansioso em revê-la. Será uma festa espetacular, você vai ver. —Ele dá uma piscadela e eu sorrio feliz por ele.
—Parabéns, senhor. Não sabia que tinha uma filha. 
—Vinte e seis anos. É belíssima. Tenho orgulho dela, muito mesmo. —Ele me olha como se me analisasse, fico sem jeito, muito sem jeito.

Essa moça deve lhe dar orgulho com certeza, para falar assim, devia ser maravilhosa. Às vezes me pego pensando se meu pai teria orgulho de mim. Não sei, quem sabe?

Robson me entrega pastas e mais pastas dos convidados. Empresários de quase o mundo inteiro. Pessoas polidas, que esbanjam dinheiro as cheias. Vou para o meu cubículo e decoro cada nome e o papel empresarial de cada um. 

Wilsom Chapter, um cara ao qual muita gente o admira, é dono de quase a metade das ações do ramo eletrônico. O cara desenvolveu aplicativos importantes para o desenvolvimento da internet. Com certeza um marco. 

Decoro mais um, e percebo que Sr. Robson está realmente interessando em fazer negócios com aquelas pessoas. Imagino por um instante, o que a empresa poderia se tornar com cada talento trabalhando juntos. Seria incrível! Os comerciais que poderíamos fazer, os mechandising de divulgação, tudo. Imagino como eu faria cada publicação de cada produto.

Meus olhos batem diretamente para a foto de uma moça em uma das pastas. Cabelos ruivos, pele muito branca e olhos verdes. Linda! Procuro seu nome e vejo que se trata da filha do chefe. Ella Robson. Nunca pensei sobre a vida pessoal do meu chefe. Tudo que sei é que é viúvo, e mora sozinho em uma mansão cinematográfica aos redores de San Diego. Ele disse que sua filha está para chegar, e percebi o quão animado estava quando avisou. Com certeza seria uma noite importante, e eu faria de tudo para ajudá-lo. 

Mexo a mão no mouse do computador para tirá-lo do modo descansar e começo a pesquisar sobre a moça. Descubro que mora na França desde cedo, ficou anos afastada do seu pai e da cidade. Não tem nada a ver com os negócios e estudou em colégios religiosos de muito prestigio. Encontro uma foto com o pai, está fazendo uma careta engraçadíssima revirando os olhos. Sorrio por gostar daquele momento de descontração. Parece feliz, apesar do olhar bastante apagado como se estivesse triste por dentro. Senhor Robson por outro lado, está tão feliz que ouso dizer que nunca o vi desta forma. 

—Assistente do presidente, é isso? —Vince apareceu do nada. Provavelmente ficou sabendo pelo meu desânimo e as pastas em cima do meu colo na tentativa de decorar e emitir convites para todos os convidados. 
—Pois é. Grande progresso, não acha? 
—Ah, não desanima. Sabe que o Sr. Robson não deixa ninguém da empresa se meter nos eventos sociais que organiza. Se escolheu você, é porque apreço deve ter. —Dou de ombros.
—Pode ser. 

Só espero que esse apreço todo servisse de alguma coisa positiva na minha vida. 

Vince ajeita seu paletó xadrez com cores alegres, abre o um sorriso e bate no meu ombro. Mas antes de se retirar ajeitas os óculos de grau. Não consigo entender o que faz um homem usar traje caipira no ambiente de trabalho. Mas, acho que não importa muito, Vince é um grande amigo, apesar de meter o bedelho onde não é chamado. Acontece que ele é o cara mais fofoqueiro daquela empresa, mas também o cara mais legal que eu conheço. 

No final do dia estou exausto, são muitos nomes e muitas funções. Sem contar em muitos convites que tive de enviar para todos. Seria bem mais fácil se Robson já conhecesse seus próprios convidados. Quem organiza uma festa e não conhece quem vai se juntar a você? Somente os poderosos a fim de fechar negócios. 
Quando chego em casa mal como nada. Jogo-me na cama enterrando minha cara no travesseiro, sem roupa alguma. 









Capítulo 2



Mais uma vez pronto para o trabalho, depois de uma boa corrida. Percebo que não há nada de bom na geladeira para se comer. Se por um lado é vantajoso morar sozinho, por outro tem seus defeitos. Quase não tenho tempo de comprar nada para comer. Fiquei muito relapso com a minha alimentação, fazendo um lanche rápido no caminho do trabalho, um almoço mais rápido ainda e quem sabe alguns quitutes para o jantar? Pizza talvez. Descido comer no trabalho mesmo, como todos os dias.

Continuo decorando os nomes dos convidados e suas funções no ramo empresarial, assim que chego, no meu cubículo, enfrente ao computador. Usando pastas e google, para as pesquisas. Quase não faço o meu costumeiro trabalho, acho que Robson nem iria se incomodar, pela necessidade que quer tudo em ordem. 

Estou exausto e de saco cheio, se isso é ser o braço direito do chefe, eu nem queria saber como trata o restante. Sou um publicitário, mas sempre fui tratado como um funcionário comum por Robson. Porém tento fazer tudo da melhor forma, não adiantaria nada reclamar agora, o jeito é se concentrar e tentar fazer o melhor.

Lavo meu rosto na pia do banheiro masculino, olho-me no espelho, estou com o semblante cansado. Paro para pensar por um instante sobre a filha do chefe, Ella Robson. Imagino por breves segundos como Robert é como pai, talvez um grande amigo, conselheiro. Divertido talvez, e muito, muito conservador. Se me lembro bem, ele a mandou para um colégio religioso. Será que tem mais filhos? Penso que não, sendo assim, estaria na empresa dando ordens, e eu não seria o seu braço direito. 

Continuo pesquisando sobre Ella, descubro que viveu no internato a partir dos seis anos e terminou os estudos aos vinte. Porém continuou morando na França por mais seis anos até seu regresso a San Diego. 
Me desfoco um pouco da filha do meu patrão e continuo com o meu trabalho, até o final do expediente. 
***

Visto um terno muito bem polido para o "evento do século", é assim que chamarei daqui em diante. Ser notado como o "chaveiro" de bolso do Sr. Robert Robson está sendo muito constrangedor para mim, na boa. Não que eu quisesse notoriedade, mas ao menos ser reconhecido pelo meu trabalho. Imagina quantas oportunidades melhores eu teria, levando em conta todos os empresários que irão àquelas festa? 

Uma limusine me espera do lado de fora do prédio. Ao menos terei alguma regalia. Percebo que trabalhar para o Sr. Robson, ou, ao menos, ser o seu braço direito, havia privilégios. Me dou conta quando estou diante daquela festa regada a luxo e sofisticação, mesmo estando em uma posição desconfortável para mim, noto que nenhum dos funcionários estão presente. Recordo-me do que Vince disse, que somente os funcionários de sua inteira confiança, compareciam aos seus eventos. Por um instante, sinto-me orgulhoso. 

—Michael! —Sou ovacionando de simpatia vinda do Sr. Robson. Sim, sou um cara de confiança e tenho consciência disto. —Que bom que veio! Me ajudará muito. —Assinto, e lhe dou dois tapas no ombro. 
—Sou um funcionário, não sou? —Ele nega com a cabeça. 
—Não, você é muito mais do que um simples funcionário. —Sou o seu braço direito. Dou um riso interno, conhecendo aquele discurso. —Beba um drink e relaxe. Quando os convidados da alta sociedade, ao qual não faço a mínima ideia de quem seja, aparecer. Preciso que me tire desse constrangimento. 
—Sim senhor. —Assinto e me retiro. 

Há uma porção de drinks na área do bar, bebidas de todos os tipos e todos os gostos, até mesmo uma que nem sabia o nome. Penso que seja importado. Escolho um conhecido por mim com uma cereja no fundo. Há também frutas e petiscos de gente rica, que mal sei por onde começar. Porém meus minutos de mordomia acabam quando os convidados maiores chegam. Olho o ambiente e está repleta de pessoas sorrindo e conversando. Uma escadaria ao lado em que meu chefe está, é digno de príncipes e princesas. Me sinto em um palácio dos tempos antigos. 

—Quem são? —Sussurra Robson apontando para os convidados à frente. 
—François e sua esposa Madame Noir. São do ramo da rede de restaurantes mais bem sucedido da França. Soube que começará uma campanha para expandir os negócios aqui também. Quem sabe não fecha negócios que o Robson's Enterprises? —Robert abre os olhos em um evidente interesse. Eu sabia que meu chefe lá no fundo adorou a ideia daquele evento, serviria para vender o seu peixe. —Sua esposa, é dona da metade das ações, mas gasta os dias em salões e compras, quem trabalha mesmo é François. Mas é uma boa mãe, preocupada com a educação de seus filhos, os mandou para Suíça em um colégio conservador. 

Lembro rapidamente de sua filha, que também enviou para um colégio com as mesmas características. Não entendo o motivo pelo qual pessoas ricas tendem a enviar seus filhos para longe em busca de melhor educação. Se me tornar pai um dia, o que espero que sim, eu jamais o mandaria tão longe. Penso que serei um dos melhores pais, ou senão, bem perto disto. 

Robert se mantém atento ao que eu disse sem transparecer que lhe informo algo. François e sua esposa aproximam para cumprimento.

—Robert Robson! Que maravilha conhecê-lo pessoalmente. —Seu cumprimento é amistoso, carregado por um sotaque fortíssimo francês. —Esta festa está lindíssima. Creio que será uma ótima oportunidade para nos conhecermos melhor. 

Sua frase está carregada de ocultismo, o que me parece que François também tem os mesmos interesses que Sr. Robson, fechar negócios importantes. Me fez entender que pessoas ricas organizam festas apenas por interesses profissionais do que qualquer outra coisa. Agora entendo o objetivo daquela festa.

—Ótima ideia. —Robson abre os braços em uma simpatia impar que só ele consegue transmitir. —Será um prazer tê-los em nosso país, e em nossos negócios. Aliás, como estão as crianças? —Se volta para Madame Noir em uma preocupação plausível. —Soube que estão na Suíça estudando em um dos colégios mais exemplares do país. Fico contente que se preocupem com a educação de seus filhos, é realmente importante. —Dou um risinho meio que escondido, por Robson usar a minha pesquisa para puxar assunto. Entendendo muito bem aonde quer chegar. O que aquele cara faria sem mim? 

Me desligo um pouco do assunto, que mal ouço a resposta da Madama Noir. Uma visão a minha frente faz com que o resto do mundo parecesse um borrão aparente. Uma bela jovem de cabelos ruivos esvoaçantes descia elegantemente pelos degraus da escada digna de reis e rainhas ao nosso lado. Lembro-me que conhecia muito bem aquele rosto. É a Ella, filha de Robson! Ela chegaria hoje, e claro que estaria presente em um evento de seu pai. O vestido branco cheio de plumas e pompons na calda é bastante comportado, mas elegante. Sua maquiagem é sutil e sua expressão permanece distante e opaca. Ela é belíssima! 

—Papai! —Sua voz firme e profunda soa metódica, mas agradável de ouvir. Nunca imaginei ouvir um timbre tão intenso e arrebatador como este na vida. 
—Ella! 

Robson esquece, por um instante, o assunto que conversava para dar atenção a sua filha. Percebo que aquele efeito não era somente eu que senti. Abre os braços e abraça como se não quisesse nunca mais solta-la. O sorriso dela é opaco e não parece sincero. Franzo a testa. Não é para estar feliz?

—Quanto tempo, minha filha! Quando chegou?
—Ainda pouco. Pensei em esperá-lo em casa, mas não contive a curiosidade de conhecer senhor Robert Robson em uma festa a negócios. —Balanço a cabeça em saber que senhor Robert Robson em uma festa a negócios é somente paparicação e simpatia exageradas, só para conseguir um ótimo contrato. 
—Fez bem, muito bem. —Ele segura a mão da filha girando ambos para a minha frente. Levo um susto incompreensivo quando os meus olhos a fitam. 

Ella realmente tinha uma beleza própria. Algo que fazia meu peito retumbar. Balanço a cabeça tentando não pensar nisto. 

—Quero que conheça meu braço direito. Aquele que me dá orgulho, que está comigo nos bons e maus momentos, aquele que sempre faz a coisa certa e é como um filho para mim. —Franzo o cenho de novo, diante daqueles elogios exagerados. Um tanto fora de hora ao pensar que não me apresentou a outros convidados, já que sou membro da sua empresa. Por que me apresentaria a ela, uma figura íntima de sua vida pessoal? 

Ella apenas dá um sorrisinho sem vontade e abaixa a cabeça sem olhar para os meus olhos. Estranhamente fico tímido pelo seu desinteresse. Mas do que estou reclamando? Sou apenas um funcionário naquela noite, um assistente. Robson podia negar, mas sou sim. Enquanto ela é a filha do meu chefe que estudou em dos melhores colégios no exterior. 

—Como vai? —Pergunto insistindo em puxar-lhe conversa.
—Muito bem, obrigada. —Desta vez foi simpática prendendo o seu olhar com mais demora no meu, fazendo minhas mãos suarem. 
—Fique à vontade, Ella querida. Aproveite a festa que logo conversaremos. —Assente e depois puxa a barra do vestido, dobrando os joelhos ao cruzar os pés nos outros, em um aceno ensaiado e bem fora de época. Isto me confunde um pouco, mas me convenço que deva ser este o tratamento de pai e filha. 

Quando a moça deixa a sua presença, Robson puxa o meu ombro para me falar como se estivesse de segredos.

—Jackson, preciso de mais um favor seu. —Me preocupo por um momento, não fazendo ideia do que deseja agora. Só espero que não seja mais um evento no dia seguinte para que eu decorasse mais uns tantos mil convidados. Já basta aquela noite para me deixar exausto. 
—Sim, senhor. 
—Você viu a Ella, não é? —Assinto cuidadosamente em uma incógnita perfeita no meio da minha testa. —Ela está de volta, finalmente minha filha está aqui depois de tantos anos. Preciso que a vigie, que siga os seus passos como um guarda-costas. —Arregalo os olhos diante daquele pedido além dos limites determinados por mim.

De publicitário bem sucedido, braço direito do patrão, para chaveiro de bolso e agora babá também? O que ele mais me pediria? Que limpasse sua bunda depois de usar o banheiro? 

—Senhor Robson, eu...
—Eu sei que é uma proposta incomum, e muito inapropriada. Mas Ella é uma moça que eu não a conheço bem. Viveu tantos anos fora que eu não sei como lidar. Não conheço os seus gostos e muito menos sua personalidade. Sei que ela nunca teve um namorado e gostaria muito que tivesse. —Gelo quando seu olhar se volta para mim com intensidade em sua última frase. Era idêntica quando ele dizia uma frase ocultista frisando seus interesses nos negócios. "o quê?" meu cérebro grita. 

Será que esta história de braço direito, é somente para que eu fizesse esse "favor" para ele? Começo entender o real motivo de minha presença, e também o motivo pelos elogios, ao qual servia apenas para prestar-lhe favores pessoais. 

—Sua filha não vai gostar nada quando souber que está sendo vigiada, ou até mesmo espionada por mim, senhor. Acho que não daria certo. 
—Ora, Michael! Eu sei que você é esperto e dará o seu jeito. Arrume papo, se enturme. Você é um rapaz muito bem apessoado e sei bem que as garotas gostam disto. Não seja covarde. —Sorrio nervosamente, sentindo minhas mãos trêmulas e minha cabeça rodar. Acho que estou cansado demais com o trabalho e acabei caindo no sono e tendo pesadelos do dia do evento, só podia ser. 

Respiro fundo encarando o fato de que não teria escolha, ainda mais quando era para o capricho de Robert Robson. 

—Tudo bem. Farei o meu melhor, não se preocupe. —Recebo um sorriso de gratidão e um tapa no ombro. Meu chefe olha atrás de mim e um convidado o faz se afastar, deixando-me terrivelmente espantado com o que houve ali. 






Capítulo 3



Contemplo minha imagem confusa diante do espelho do toalete. Estou vivendo algo surreal, quero entender qual é o tipo de pai que coloca um cara para vigiar a própria filha. Talvez esta resposta eu nunca teria. 

Será que Ella é uma moça tão complicada em lidar ao ponto de Sr. Robson ter de pedir um favor como este? Deve ser por esse motivo que a enviou para a Europa. Mas a que preço? Pensar sobre deixa-me tonto.
Dou uma boa olhada ao redor daquele banheiro, tudo impecável. Também, fazia parte daquele cenário cinematográfico ao qual me meti. 

Volto ao salão, Sr. Robson vem às pressas em minha direção. 

—Ella está no jardim. Vá até lá, puxe assunto. Estou contando com você. —Antes de falar alguma coisa, recebo um tapinha no ombro e meu chefe desaparece da minha presença. 

Sacudo a cabeça, sentindo um pouco falta de ar por conta daquela pressão toda. Respiro fundo e tomo meu rumo — não opcional — até o jardim. 

Ella está sentada em uma mureta que ornamenta um lindo carvalho atrás dela. Está distante, como se estivesse refletindo sobre algo. Aquelas rendas que emoldura seu pescoço parecem sufocante, mas nada tão claustrofóbico quanto sua vida parece ser. 

—Oi. —A cumprimento, sem saber direito por onde começar. Com um "oi" parecia bem mais correto. Ela me olha com um sorriso de canto. —Posso me sentar? —Assente me deixando um pouco mais tranquilo. Ao menos não era uma mal educada e mal humorada como eu temi. 
—Está uma noite linda, não acha? —Respiro fundo olhando para o céu assim que me sento. 

A lua está tão grande e tão cheia que parece que explodiria. As estrelas todas brilhantes e incontáveis. Lembro uma vez minha ex-namorada dizendo que quando a lua está desta forma, é sinal de que alguma coisa boa viria. Só espero que tenha algum sentido. 

—Se você consegue encontrar beleza nestes termos pode até ser. —A encaro por um instante, segundos. Ela faz o mesmo logo em seguida. —Acha mesmo que não sei o que meu pai pediu? —Engulo em seco. Fui pego! Eu sabia que não daria certo. —Não vejo outro motivo para estar o meu lado agora, se não foi meu pai quem mandou. 
—Ele só está tentando lhe proteger. —Ela ri com ironia. Fico perdido, sem saber como reagir, o que fazer. 

Ella não seria o tipo de pessoa que deixaria me aproximar depois do que sabe. Robert Robson me meteu em uma fria das grandes. Não sei como faria amizade com ela, depois disto. Uma aproximação natural, sem qualquer tipo de interesse. Não sei porque quero, mas gosto dela. Seria legal tê-la como amiga.

—Papai adora me proteger, este é o grande problema. 

Percebo a tristeza em seu olhar, e, pela primeira vez na vida consigo enxergar o sofrimento de alguém. Eu não sei direito o porquê a superproteção do meu chefe para com sua filha, possa ser tão doloroso para ela, mas até que eu posso imaginar. Talvez se eu estivesse em seu lugar me sentiria claustrofóbico. Mas também há outro lado: Ella é uma garota, se fosse um homem seria com certeza diferente. 

—Talvez precise de proteção. —O olhar que me lança é bem frio e condenatório. 
—Por que sou uma mulher? Também é machista a este ponto?
—Não, eu só...
—Acho melhor me deixar em paz. Não vou deixar que acate as ordens do meu pai quando o assunto é a minha vida. Vá embora, por favor. 

Eu também acho toda a história de vigiá-la uma bobagem. Quando senhor Robson me confiou essa missão eu não concordei e não concordo agora. Não seria eu que faria de sua vida mais infeliz do que já parece ser. 

Assinto, dando o fora dali. Eu só queria chegar em casa e descansar de toda essa loucura em que me enfiei. 
Me jogo na cama sabendo que finalmente eu terei paz, amanhã é domingo eu terei mais chance de dormir até tarde. Ótimo! Sem escritórios, senhor Robson me mandando decorar convidados, sem eu ter que vigiar a sua filha. Em pensar que eu só quero um cargo maior na minha área, talvez eu precisasse ser aprovado antes. Tipo aquelas provas de resistência que a vida lhe impõe só para dizer que terá o que deseja, mas também irá se lascar um bocado para alcançar seus objetivos. 

Abro os meus olhos e vejo que já amanheceu. Praguejo a mim mesmo quando olho ao relógio e vejo que ainda são seis horas da manhã. Quem acorda cedo em um dia de folga? Parecia um pesadelo. Mas não tenho mais sono, decido fazer uma caminhada.

Faço minha higiene matinal, uma vitamina com frutas quase apodrecidas na fruteira para me alimentar e vou para rua, vestido com o meu moletom de corrida. 

Pensar em Ella enquanto corro não foi tão difícil afinal, considerando que aquele assunto ainda me intriga. Não sei como fora sua criação, como o senhor Robson é como pai, muito menos sei como ela é como filha. Somente consigo imaginar que não eram uma família comum. 

Dou um gole na minha água, que carrego na garrafinha, e pego outra avenida. Estou a fim de chegar à orla da praia e me exercitar por lá. É uma manhã linda, um sol incrível e meu corpo coberto de suor. 

Seja lá o que acontece na família de Robson eu não quero nem saber. O problema não é meu, por mais que insista que devo cumprir suas ordens. Não sou uma babá, um segurança, muito menos um guarda-costas. Eu teria de receber um belo de um aumento. Não dá para dizer que sou um braço direito e encarar tudo como se fosse favores de amigo. 

Paro em frente aos ferros de exercícios postos na areia. A praia está praticamente vazia. É um domingo de manhã, mas quase ninguém iria à praia àquela hora, acho que só eu mesmo. Arranco minha camisa suada e começo a malhar na barra de ferro, pendurado. Subindo e descendo, subindo e descendo. Estou ofegante, sentindo meus músculos todos travarem. 

Talvez eu devesse trabalhar de guarda-costas. Só seguir mulheres indefesas por aí, e ganhar muito dinheiro. Pode ser que o trabalho não seria tão exaustivo, quanto trabalhar demais buscando algo melhor e não conseguir nada. Solto as barras de ferro já me sentindo exausto. 

Um banho de mar parece ser apropriado agora, levando em conta o calor que sinto. Retiro a calça do moletom, dando graças a Deus que uso uma sunga, caminho até a praia. Percebo uma moça sentada na areia encarando o mar, aqueles cabelos ruivos esvoaçando são familiar. Ella! 

Continuo caminhando até ficar em pé parado ao seu lado. Não falo nada até notar a minha presença. Seu olhar percorre todo o meu corpo de um jeito que me deixa sem graça. Começa das minhas pernas até o meu peitoral, uma demora demasiada no meu abdômen. Sou muito tímido, é inevitável ficar sem jeito. Porém gosto muito da sua atitude, meu ego fica mais... Elevado. 

Mas percebo que também fica sem jeito quando se dá conta da forma em que me olha. Vira o rosto para o outro lado.

—Está me seguindo? Meu pai também mandou você vir até aqui? —nego com a cabeça.
—De jeito nenhum. Estava apenas me exercitando, e tive a intensão de dá um mergulho. Acredite ou não, não tem nada a ver com você. —Ela dá de ombros e volta a contemplar à vista. 

Não sei, fico com pena dela um pouco. Seu olhar bastante triste há um vazio por dentro que transparece. Me sento ao seu lado, sem pedir permissão. 

—O que há com você? Por que tanta tristeza? —Pergunto sem medo algum de levar um fora, a curiosidade é maior. 

Ela sorri debochada. Pega um isqueiro dentro da bolsa e logo em seguindo um cigarro já o acendendo. Me sinto péssimo com aquele ato. Uma moça tão requintada e de uma educação exemplar fumando? Não que uma pessoa de seu nível não possa fumar, mas Ella não parece ser o tipo de pessoa que fuma. Não pela educação que teve. Se é que tenha a ver com educação, uma pessoa fumar.

—Não sabia que fumava. —Torna lançar um olhar descontente para mim. É, acho que estou me metendo demais em sua vida, mas somente pelo fato de ter me surpreendido tanto.
—Por quê? Você não fuma? —Nego com a cabeça.

Eu nem mesmo gosto deste tipo de vício, nem mesmo bebia. Digo, bebo socialmente um gole ou outro, nada de vícios exagerados e nada que afete a minha saúde. Cresci vendo o pai com hábitos ruins, é tão destrutivo que não quero para a minha vida, muito menos a uma moça tão jovem. 

—É um santo, senhor... —Titubeia tentando encontra o meu sobrenome. 
—Jackson! Meu nome é Michael Jackson.
—Michael. —Meu nome no tom de sua voz parece algo agradável de ouvir. — Um santo? Pelo nome... Hum! Anjo Michael? —Sorrio pelo deboche, negando com a cabeça.
—Só não gosto de me meter em encrenca, nada demais. —Dou de ombros e ouço sua gargalhada. 
—O cigarro me acalma me faz esquecer os problemas, sabe? —Que problemas uma moça rica e bem educada teria, meu Deus do céu?
—Tantos assim? 
—A vida não é fácil pra ninguém, pra mim é que não seria. Você não deve fazer ideia do que é ter uma infância longe do seu pai, da sua casa, vivendo trancada em um lugar que sustenta uma educação rígida, onde qualquer erro que você faça na vida é como ser levada a cruz como Jesus Cristo. 

Uau! Fico um pouco tonto, engulo em seco, por imaginar como deveria ter sido difícil. Já ouvi falar de educação assim, até imagino como deva ser, mas pelo que ela me conta fora ainda pior. 

—Eu só queria ficar ao lado dele, consolá-lo quando mamãe morreu, mas tudo que ele fez foi me mandar pra longe. Nunca tive um pai, muito menos uma mãe, tampouco alguém que eu pudesse confiar. Parece desesperador, não acha? Tente viver na pele o quanto ruim possa ser? 
—Eu sinto muito. —Me compadeço, ela sorri de lado.
—Não sinta. Eu estou livre agora, a menos que você me impeça. —Sorrimos juntos. Eu não a impediria de ser quem é. Não depois de tudo que ouvi. 
—Senhor Robson não é um cara ruim, Ella. Ele adora você, pode ter certeza. Talvez este seja o modo que encontrou para proteger você. Tenho plena confiança de que tentou fazer o melhor. —Ela assente, sabendo o que eu disse é verdade. 
—Pode até ser verdade, mas eu não tenho certeza. —Um silêncio se formou de repente. Só quero que não se sinta tão chateada com a vida em que leva, mas percebo que eu não posso resolver. —Por que não me acompanha a uma festa esta noite? —Franzo o cenho diante do convite. —papai quer que me siga. E se você fizer e contar para ele que me comporto direitinho, só para ele largar do meu pé? Vou permitir só com esta condição. —Abro um sorriso mais confiante. Assim posso fazer o que foi confiado a mim, e de alguma forma tentar ajudá-la com os seus problemas sociais. 

Tinha tanta coisa que queria mostrar a ela! Nossa cidade, a vizinhança que tanto preso, os desenhos que faço, ou o meu trabalho. É... Não parece algo empolgante para uma garota, mas se deixasse um pouco feliz para mim já está valendo. Uma festa para começar é de bom tamanho. 

—Eu topo. —Dá uma tragada longa em seu cigarro soltando a fumaça na minha cara. Sorri genuinamente, quando tusso. 
***

Vesti uma camisa social branca, dobrando nas mangas até o antebraço, uma calça preta jeans e um tênis. Estou pronto para me encontrar com Ella na boate que me convidou. Talvez dançar um pouco e conversar sobre bobagens poderia ser muito agradável, ainda mais tendo uma companhia tão bela quanto a dela. Olho ao espelho e estou bonito, uma aparência que me agrada. 

Pode-se dizer que estou um pouco nervoso também. Faz tempo que não saia com mulher alguma, mesmo não sendo necessariamente um encontro, o peso é o mesmo ou até pior. Robson me pediu para vigiá-la, iríamos a uma boate que nem sei direito o que se esperar. 

Pego um táxi até o local marcado. Estou em frente ao estabelecimento. Encontro Ella com um copo de cerveja na mão dançando como se o mundo acabaria logo pela manhã. Está feliz, e descontraída, mas eu sabia que não era do jeito certo. Está bêbada. 

—Ella? —A chamo rente ao seu ouvido ao qual não para de dançar. Olho para mim e sorrir, enlaçando seus braços no meu pescoço. Pude sentir o cheiro da bebida.

Fico impressionado em dar de cara com uma mulher tão linda nessa situação. Não que a julgasse por beber, mas sei que a educação que recebeu não condizia com as suas atitudes. Parece um reflexo da sua ânsia em liberdade. 

—Dance Michael! Liberte-se. —bebe um gole da sua bebida de novo. 

Não tenho reação nenhuma, apenas tento segurá-la para não cair ao chão.

—Pensei que iríamos conversar, mas pelo jeito. —Gargalha como se eu fosse um bobo. É, estou sendo um careta mesmo, por incrível que pareça. 
—Quando eu saio é pra me divertir, e não pra conversar bobagens. —Rodopia em uma dança desengonçada e cai nos meus braços. —Opa!
—Tome cuidado, Ella. Vá com calma. —A amparo em meus braços ao qual me abraça. Suas gargalhadas são típicas de pessoas que encheram a cara.
—É essa a desvantagem de ser aprisionada a vida toda, Michael. Quando nos libertamos, tendemos a fazer tudo de uma vez. 

Concordo, afinal, nunca nos ensinaram como a vida pode ser lá fora, não temos noção do quanto pode ser complicado. Ainda mais para uma pessoa criada com rigidez. Conheço a vida por minha conta, sempre quebrei a cara por aí, vi coisas e senti coisas ao qual me fizeram o homem que sou hoje. E uma menina que só recebeu cuidados e proteção, talvez represálias quando fizesse algo de errado. Eu temo por ela. 

Ella caminha até o bar, se serve de uma tequila, acende um cigarro, e consume tudo de uma vez. Olho aquele cigarro estranho e temo não ser apenas um simples cigarro. Oh meu Deus, eu não acredito! 

As informações sobre aquela garota veem em avalanche em cima de mim. Será que senhor Robert Robson sabe sobre os vícios da filha? Por que me mandou vigiá-la? Será que eu deveria contar a ele o que eu sei? Nunca me vi em uma situação tão difícil. 

—Abre esse sorriso, Michael! Vamos dançar! Ande bebe um pouco. —Me oferece um copo com algo misturado que desconfio da inocência de uma simples bebida. Nego com a cabeça.
—Deveríamos ir a um lugar mais calmo, para conversamos. Poderíamos conhecer a cidade amanhã, o pôr-do-sol é lindíssimo. —Sua gargalhada me faz dar conta de que aquela proposta é uma completa bobagem. Que diabo de homem eu sou? Um frouxo? Só quero que pare de abusar desta forma. 
—Você é hilário! Parece até que saiu dos livros de romances que a Madre Bianca nos forçava a ler. É um cara perfeito? É, Michael? —Nego com a cabeça, sem saber ao certo o que falar. 
—Só um cara tentando mostrar que nossos problemas não podem ser mascarados usando artifícios, temos que enfrentá-lo. Não é hora de sabotar nossa própria felicidade. A vida é curta demais. —Ella me encara de cenho franzido, revira os olhos, mas não é de tédio. Suas pernas bambeiam e ela desmaia em meus braços. 
***

A deito na minha cama, retirando as suas sandálias e cobrindo-a com o meu lençol. Não acho prudente levá-la para casa neste estado. Sento em uma poltrona observando-a a dormir. Está bêbada demais e drogada também. Cruzo meus dedos um no outro, apoiando no queixo.
Fico assim até ouvi-la. Acho que no dia seguinte. 

—Onde estou? —Me desperto, completamente desconfortável na poltrona, me dando conta que acabei adormecendo. Ela está confusa olhando para os lados. 
—Está em minha casa, eu não podia levá-la no estado em que se encontrava. —Ouvi um suspiro de alívio. —O que você fez, Ella? —Minha voz é carregada de decepção.
—Michael, não comece tá? Até parece que você nunca fez besteiras na vida. 

Me lembro uma vez que fui em uma festa quando tinha dezesseis anos, bebi todas, dancei, peguei mulheres. Passei a minha adolescência toda com complexidade que quando me ofereceram este tipo de diversão me libertei de vez. Mas me lembro bem de quando cheguei em casa quase cinco da manhã, o olhar que minha mãe me lançou. Pude notar a decepção dela, e se tinha uma coisa que mais me magoava era decepcioná-la. Como se não bastasse o que papai fazia. Não ouvi nenhuma palavra vinda de sua boca, nem um sermão e nada do tipo. Apenas o seu silêncio e aquele olhar que me matava. Quando o efeito do álcool melhorou, decidi que nunca mais queria ver aquele olhar de novo para mim. 

—Isso não justifica. Uma coisa é você fazer besteiras por um momento, como um erro. Reconhecê-lo e depois mudar. Tentar mascarar a sua angustia nos vícios só irá destruir você.

Levanta da cama procurando suas coisas. 

—Passou muito tempo mesmo com o meu pai. —Calça as sandálias. —Desse jeito irá dominar o mundo, está indo em um belo caminho. 
—Não deboche, sabe que estou certo. 
—Eu não sei de nada disso aí, não! —Altera a voz bastante nervosa. —Passei a minha vida inteira prisioneira de mim mesma. Não vai ser um pau mandando que irá que impedir. —Seu olhar desdenhoso me enerva. Era mesmo uma menina mimada afim de só fazer besteiras por aí. 
—Então vai, faça. Depois quando se ferrar bata no peito e encare as consequências como uma mulher de verdade. Não é o que você é? —Arqueio a sobrancelha deixando-a em silêncio. —Robert vai ficar decepcionado quando descobrir que todas suas tentativas, foram parar no ralo.
—Você não dirá nada a ele! —Imposta a voz com um pedido desesperado. —Ele vai me mandar pra aquele lugar de novo, Michael. Por favor, é tudo que eu lhe peço. —Pensei por um momento. Aquele assunto não era meu, por mais que tenham me jogado de paraquedas, são os seus problemas e suas questões. Eu não tenho realmente nada a ver com isso. 
—Não se preocupe. 

Ela concorda com a cabeça, pega suas coisas, pronta para ir embora.

—Valeu. —Assinto vendo-a ir embora. 







Capítulo 4



Corro até o outro lado da rua, assim que uma van percorre a via em uma velocidade adequada, a bola rola quicando no sentido oposto. Ela é rápida, mais ainda do que minha corrida, porém me esforço ao máximo para alcançá-la. Um carro buzina, alertando-me que estou no meio do caminho. Aceno um gentil desculpa, e continuo minha jornada atrás da bola "saltitante" — assim que irei chamá-la. Minha valência é que há um tronco de uma árvore cortado pela metade entre a avenida e a calçada, a bola fica imprensada entre ele e o hidrante. Me agacho capturando a bola entre os dedos. 

—Obrigado, tio Michael. —Nick, um dos garotos que brincava de bola, para trás de mim ofegante. Ele veio atrás de mim enquanto tentei buscar sua bola que vai parar do outro lado da rua por conta de um chute mal calculado. 
Lhe entrego a bola com um sorriso no rosto.
—Vão brincar perto da praia, há um campinho apropriado para jogar bola. Perto das vias é muito perigoso. 
—Pode deixar. —Me olha com um olhar amistoso, sorriso genuíno.

Quando olho para os meninos do bairro sempre me lembro da minha infância. Era inevitável não lembrar. Fora a única base boa da minha vida e guardo com carinho dentro de mim. Adoro crianças e adoro vê-las felizes. No dia em que me tornar pai, — o que espero que um dia aconteça —, quero que a vida deles venha ser exatamente como a minha fora na infância; alegre e cheia de sorrisos. Serei um pai paciente, conselheiro, companheiro e principalmente um grande ouvinte. Serei o oposto do meu pai, eu seria tudo que ele precisasse, com o maior prazer do mundo. Pois acredito que um pai deva cuidar, instruir, e, acima de tudo, ser alguém em quem seu filho possa se espelhar. Me espelho em minha mãe, tudo ela foi por mim, mas não posso dizer que uma figura paterna não me fazia falta, porque estaria mentindo. Talvez seja por este motivo a minha ânsia de ser para um filho o que nunca tive.

Volto para casa, tomo um banho para ir ao trabalho. Termino de alinhar a minha camisa social listrada em branco e azul-bebê no meu corpo. Passo um pente nos cabelos superficialmente, de um lado para o outro. Volto a olhar-me ao espelho — estou bem. 

Seria um dia cheio de trabalho, dá para perceber assim que fico sabendo do novo contrato que a Robson's Enterprises fechou com Noir's Restaurants. É, pelo visto aquele evento repleto de jogos de interesses e puxa-saquismo deu para alguma coisa. O que significa que terei muito trabalho pela frente.

A Robson"s Enterprises se trata de publicidade e propaganda, como a Noir's Restaurants está abrindo uma filial em San Diego, nossa empresa foi a escolhida para fazer os trabalhos de divulgações, a logomarca do estabelecimento e os contratos de merchandising. 

O bom é que nossa equipe é eficiente até demais, daríamos conta de um planejamento tão grande quanto as exigências feita pelos Noirs. 

Mas mesmo tentando me focar no trabalho e não querer mais pensar em nada, aquela história que envolve Ella ainda me incomoda. Eu conheci o seu tormento, o seu lado obscuro que tenho certeza que esteve escondido por muitos anos de seu pai. Eu não sabia o que falar a Robert que flagrei sua filha fumando um cigarro suspeito e bebendo até cair. A indecisão me perturba. Se contasse o machucaria, mas também se não contasse, Ella poderia entrar em uma fria pior ainda.

—Robert está lhe chamando na sala dele. —Meu batimento cardíaco falha apenas com a possibilidade em estar frente a frente com o meu chefe.

Era óbvio que me perguntaria sobre sua filha, iria querer saber como me sai vigiando-a assim como pediu. A indecisão continua me deixando em pânico.

Subo o elevador, bato na porta, adentro a sala recebendo o sorriso simpático de sempre. Sento-me na cadeira ficando frente a frente com a expressão ávida por informações do meu chefe, e ainda assim, não consigo me decidir sobre dizer a verdade ou mantê-la guardada comigo. Talvez fosse o pior perrengue que havia passado em toda a minha vida. 

—Então? —Robson ergue as sobrancelhas esperando por resposta. Me dou conta que ficar de saia justa me torna um completo idiota. Minha voz não sai e não tenho reação nenhuma. —Soube que foi a uma festa com Ella no domingo. Foi divertido? 

Robson está na expectativa, eu por outro lado, tenho vontade de sair correndo. Não consigo entender tanto interesse, mas percebo que há um e muito bem oculto. 

—Fo...foi. Foi sim, foi ótimo, senhor. —A respiração de Robson flui audivelmente como se estivesse segurando-a por um longo prazo, mostrando a mim que meu chefe estava tão nervoso quanto eu. 

Estou no meio de um problemão que mal consigo entender como fui parar aqui. Robert Robson era um empresário nato, um homem de negócios admirável no âmbito empresarial. Era bem sucedido, e dono de uma fortuna invejável, mas não sabia lidar com a sua filha, nem ao menos sabia das suas "escapadas" rumo à perdição. 

—Sabe, Jackson. —Ele se levanta, caminhando até a janela. 

O dia está ensolarado, o clima ameno deixa a vista um colorido fascinante, mas eu sei que o clima era outro em seu interior. Está uma tempestade devastadora. 

—Quando Ella era uma criança eu só queria saber de protegê-la. A morte de sua mãe foi horrível. Minha filha era tudo que me restou, eu não podia perdê-la também, entende? —Maneio a cabeça. —A melhor forma de fazê-lo era levá-la para um dos colégios mais conservadores que encontrei. Ela teria uma educação adequada e ficaria segura... De mim. —Ouço mais um suspiro e me compadeço. —Não consigo parar de pensar que a morte de Sarah foi por minha causa. 
—Claro que não! — Me levanto da cadeira em um sobressalto. —Não é justo se culpar dessa forma! Sua esposa morreu cometida de um câncer, e não tem nada a ver com o senhor.
—Eu não tinha tempo para o nosso casamento, quase não ficava em casa. Eu nunca sabia do que minha mulher precisava. Sempre enfurnado na empresa, sempre procurando o que fazer para os meus negócios prosperarem. Minha família ficou em segundo plano. Talvez se eu não tivesse sido tão negligente, o câncer poderia ser descoberto mais cedo e Sarah teria alguma chance. Talvez o meu amor e cuidado, poderia ter curando-a. - Eu nada disse, mas eu podia sentir a dor do meu chefe. 

Quantas vezes eu me pego pensando se quando presenciava meu pai espancando a minha mãe eu poderia ter feito algo, poderia ter enfrentando. Nada me tira da cabeça que minha mãe ficou doente da mesma doença que Sarah por desgosto, se esta realmente for a causa. Minha mãe foi a minha vida desde sempre, e perdê-la ruiu o meu mundo. 

—Eu não queria que Ella se contaminasse da mesma forma. Ela era uma criança, eu não podia destruí-la também. 
—Já parou pra pensar que ter o seu distanciamento, pode ter sido ainda pior? —Ele me olha com uma pressa tão grande que vi o quanto falei demais.
—O que você quer dizer? 

Contar a verdade ou não contar? Robert está ferido, feri-lo ainda mais com as informações que tenho, não seria saudável para ninguém. Até então eu não havia obtido uma decisão, mas agora ouvindo parcialmente sua história e seu empenho em proteger sua filha, não era justo eu despejar seu fracasso em cima de seu colo, como se não fosse nada. 

—Ella precisa do seu cuidado, da sua atenção. Morou tempo demais fora do país, acho que devem retomar a relação de pai e filha de novo. Não acha? —Maneia a cabeça rudemente, como se estivesse desconfiado de algo. 
—Eu não a conheço direito, Michael. Eu não sei nada sobre a minha própria filha, não sei se consigo retomar uma relação que talvez não tenha nem começado. É por isso que preciso que a conheça por mim, quero saber tudo sobre ela através de você. Quem sabe eu tenha coragem de me aproximar? 

Eu mal consigo respirar. É me confiado uma responsabilidade bem maior do que eu poderia suportar. Meu chefe não conhece a filha, — literalmente —, Ella é uma rebelde que precisa da atenção do pai, e por isso se meteu em coisas erradas. E, percebo sua necessidade do amor e do carinho do pai. Preciso ajudá-la, tira-la dessa vida, e trazê-la sã e salva para a vida de seu pai novamente. Só não sei se sou capaz de cumprir com a minha missão.

***


O céu tem um estrelado incrível capaz de iluminá-lo assim como a própria lua. Caminhar pelas ruas de San Diego sem contemplar o céu é um verdadeiro pecado, em minha opinião. Mas nem mesmo isto seria capaz de aplacar um enorme impasse em que me meti. Cuidar de Ella é um passo muito grande a prosseguir. Não sei nada sobre adolescentes rebeldes ansiosas em explorar os perigos do mundo. Não sei nada sobre uma relação conturbada entre pai e filha, apesar de ter tido algo como isto durante a vida toda. O diferente é que eu sei que Sr. Robson ama a filha, apenas não sabe lidar com ela. Já meu pai, eu nem sei se um filho era o que queria. De qualquer forma, estou disposto a tentar. 

—Eu quero essa grana ainda hoje, garota! 

Olho para a minha direita e me deparo com uma cena digna de pena. 

—Eu não tenho, eu já disse. Meu pai tem muito dinheiro, podemos ir até a empresa e eu lhe pago. Não fique irritado. 

Ella está descabelada, amarrotada, suja, bem diferente da garota bem arrumada e sensível que conheci. O cara que lhe cobra dinheiro, dá medo de olhar. Mal encarado, com uma postura dura e violenta. Não posso deixá-la nesta situação. 

Sua mão forte e disposta a assustar segura com força o maxilar de Ella, balançando de um lado para o outro. Arregalo os olhos, com medo de que seja ainda mais violento.

—É típico dessas viciadas pertinentes, dizer que tem grana só para nos fazer de otários. Mas eu já saquei, garota. Ou você me paga agora, ou vai conhecer o meu brinquedinho. —Com a mão esquerda tocou em uma arma brilhante e prateada. Meu Deus do céu!
—Ei, ei, se acalma! —Me posiciono entre eles, Ella pula para trás surpresa com a minha presença. —Não faremos algo que possamos nos arrepender depois, certo? 
—Quem é você? —Pigarreio, ajeitando o meu colarinho. Afasto dos dois e olho para Ella. 
Está com maquiagem borrada, expressão distorcida como se estivesse grogue, porém bastante assustada. 
—Sou o irmão dela. —Forço um riso, respondendo a primeira coisa que vem à mente. Ella franze o cenho, provavelmente me achando um louco, concordo. —Estou aqui para pagar sua dívida. Quanto ela deve?
Pego a carteira no bolso traseiro da calça, começando a contar as poucas cédulas que tenho. 
—Michael, não! —Ella segura no meu braço tentando me impedir, mas ignoro. 
—Quinhentos dólares. —A informação me atinge como um raio. 

Quinhentos dólares são tudo que tenho para terminar o mês. Penso sentindo minhas pernas bambas. Como uma pessoa gasta isso tudo em drogas? Será que realmente Ella fumou tudo isso? Nem me atrevo saber. 
Nem preciso contar o restante. É tudo que tenho na carteira. Lhe entrego demonstrando tranquilidade. 

—Dívida paga? —Encara-me desconfiado, dando um leve maneio de cabeça. 
—Dá próxima, pegue suas dívidas, gracinha! —Acaricia o rosto de Ella antes de sair. Percebo o asco que ela sente. Acho bem feito. 
—Não acredito que fez isso. —Ótimo, agora eu seria questionado. 
—Pois é, sou incapaz de deixar uma mulher em apuros. —Volto a caminhar pelas ruas, tomando o meu rumo de volta, mas ela está atrás de mim, confusa e sozinha. 
—Eu não cheirei muito, é só...
—Olha aqui, Ella, na boa! Não acredito que está fazendo isso com o seu pai. Não acredito que esteja fazendo isso com você! Caramba. Só vai servir para estragar a sua vida. Você é jovem, bonita, com um futuro brilhante a percorrer. Quer mesmo jogar tudo fora? 

Ela ri sarcástica. É, eu sei que estou dando um de papai querendo dar ordens a uma menina mimada que sabe direitinho o que está fazendo da sua vida. Mas é isso, eu não sei controlar o meu instinto de "perdedor de tempo, com almas sofridas que sabem muito bem a porra em que está se metendo".

—Meu pai não liga pra mim. Ele nem se quer foi me visitar no internato. Eu nunca o vi em reuniões escolares e quando liguei para dizer o que estava acontecendo comigo naquele inferno, ele simplesmente me disse para eu obedecer às freiras. Nem se deu ao trabalho de escutar. —Olho em seus olhos borrados de lágrimas de dor, escorrendo em torrentes. Meu peito se comprime. 
—Ele liga sim, só não sabe como fazer. Seu pai sofreu muito, Ella. A morte da sua mãe foi muito dolorosa pra ele, há culpa em seu coração que ninguém pode remover. Ele só não sabe como recomeçar. 
—A morte da minha mãe também foi dolorosa pra mim, Michael! Eu a vi sofrer por anos, sentindo dor, suplicando para que Deus a levasse de uma vez, enquanto aquele filho da puta ficava o dia inteiro dentro do escritório. Eu tinha apenas seis anos de idade, mas me lembro bem. Meu pai nunca ligou para nós, nunca se preocupou com a dor dela e você vem dizer a mim que a morte da minha mãe foi dolorosa para ele? E para mim? Ninguém pergunta, não é? Eu preferia que ele tivesse morrido no lugar dela. —Ella saiu correndo da minha presença, sem me dar chance de impedi-la. 

Ella despeja sua dor em cima de mim como um caminhão despejando dejetos de lixos no rio. Talvez eu houvesse pensando em sua dor antes, talvez ela estivesse coberta de razão por estar na situação em que se encontra. 

—Ella, espere! Vamos conversar. 

Suspiro fundo, frustrado com a posição derrotista em que me encontro. Imerso em um lago de pura impotência e desânimo. Daria tudo para abrir os olhos e acordar desse pesadelo. 




Capítulo 5










O som ligado no último volume toca um rap de rua. 50 cent estronda as caixas acústicas enquanto eu preparo uma gororoba para comer. Nada tão apetitoso, é somente para forrar o meu estômago. Uma dose de vinho apenas para esquentar o sangue e continuar estourando os tímpanos com 50 cent e o seu Many Men. 

O soar da campainha é quase inaudível, fazendo-me correr para atender com receio da pessoa estar esperando por muito tempo. Diminui o volume com o controle remoto e abro a porta. A imagem de Ella com um olhar perdido e assustado fez-me paralisar. Nunca que Ella Robson estaria no meu apartamento por livre e espontânea vontade. Ou estaria? 

— Oi. — O som da sua voz foi arrastado, quase sem vontade de ser proferida. Um tanto fraca, eu diria.

Pensei na bagunça que o apartamento está. Um homem que vive sozinho nem sempre se preocupa com organização, porém a convido para entrar. Não quero ser mal educado.

—Ora, a que devo a visita? 

Não posso mentir que ainda estou chateado com sua postura, e o modo em que vem tratando o seu pai.

Ella retira algo da sua bolsa que tem uma alça envesada por seu corpo. Entrega a mim e percebo que se trata da grana que eu havia pago o seu "bagulho".

— Ella não precisa. Sério. O que está fazendo? 

—É seu, Michael. Eu sei que não tinha essa grana, sabia que fez isso só para não me ver se ferrando. —Me encara com admiração e ao mesmo tempo envergonhada. —Não tinha obrigação nenhuma, mas mesmo assim...

Abaixo a cabeça, me sentindo incomodado com esta observação. Não sou nenhum santo, muito menos um cara que quer concertar o mundo. Tampouco alguém cuja vocação é de um herói salvador. Não deixaria de forma alguma uma mulher como ela em apuros só porque fazia algo de errado. Não é como a maioria das pessoas deveriam agir? Penso sobre isso, e não me sinto convencido.

—Não foi nada, Ella. De verdade. Mas por outro lado fico pensando... —Estreito os olhos a encarando, um tanto pasmo falando a verdade. —Como uma moça tão bonita e de uma família maravilhosa, pode entrar nessa? —Ela bufa, depois desvia o olhar de mim. 

—Você não entende, Michael. Não conhece o lado sombrio da minha vida. Tudo que tive de passar para tentar sobreviver. Não faz parte da sua realidade, e muito menos quero apresentá-la a você. Mas posso dizer que não foi nada boa. —Sinto que Ella sofre, seu olhar me diz, mas não tenho como ajudar alguém que se fecha tanto. —Aquele lugar... Você não faz ideia como era. 

Estreito os olhos. Ella deve ter sofrido um bocado e até entendo, mas...

—Não justifica. —Sussurro determinado. Dentro de mim sei que é errado. —Amenizar uma dor estragando a sua vida é coisa mais patética que existe! —Arregala os olhos, provavelmente nunca havia escutado palavras tão sinceras na vida.

—Sei que para você parece bobagem, mas pra mim é bem compreensivo, levando em conta tudo que eu passei. —Respira fundo. Eu a encaro tentando encontrar algo compreensivo, não encontro nada. —Em fim, eu vou indo. Não há mais nada a se fazer por aqui. —Me estende o dinheiro, mas recuso a pegá-lo. Ella larga em cima do braço do sofá e se retira por onde entrou. 

A porta se fecha fazendo um estrondo alto. Me permito fechar os olhos por conta do barulho. Talvez encabulado pelo que vi. Talvez chateado também. Queria saber quando é que eu pararia de me compadecer da dor dos outros e deixá-los com os seus próprios problemas, acho que nunca. 

Ella sofreu demais naquele internato, sofreu de uma forma que ficou marcado pelo resto da vida. Se eu entendesse o que houve, talvez eu compreendesse melhor ao invés de julgá-la. Hunf! É tanta coisa que preciso pensar, resolver, ao invés de me meter nesse assunto que fico até cansado. 

Pego a quantia dobrada no braço do sofá e noto o quanto aquela grana vem a calhar naquele momento. Estou mesmo precisando fazer algumas compras, o que tenho na minha dispensa não dá nem para o café da manhã. 


Volto a ligar 50 cent no último volume, tentando não me envolver com os problemas dos outros, percebo que falho quando me pego pensando em Ella novamente. Tão linda, porém tão sofrida. Tão forte, porém tão vulnerável. Aqueles olhos distantes e tristes! Se eu pudesse fazer alguma coisa, qualquer coisa, para aparecer um sorriso sincero em seus lábios, eu juro que faria sem hesitar. Se tornou uma questão de honra para mim, mesmo não fazendo ideia de como faria. 

O telefone toca, arrancando-me do devaneio abruptamente. Chego a soltar um palavrão diante do susto. Dou um salto acrobata a partir de detrás do sofá até do outro lado, me sentando no mesmo. Pego o telefone e atendo. A voz de Robert Robson me estremece, não quero mais ter de confrontá-lo sabendo de um segredo como este. 

—Este é o meu garoto! —Sua voz é animadora, porém eu juro, se eu ter de falar, não será tão segura como a dele. —Você é o meu convidado especial para almoçar conosco neste final de semana. Quero que se integre mais à família, conhecer Ella e tentar me ajudar naquele assunto. —Estremeço, de verdade. Não consigo entender que carma é este que tenho de carregar. Em nenhum momento Robson me pergunta se quero ajudá-lo com "aquele assunto".

—Sr. Robson, eu... —Tento me livrar, mas sou interrompido.

—O almoço se dará às 13:00hrs da tarde, não se atrase. 

—Senhor, eu... —Tento argumentar de novo, mas sou impedido novamente. Droga!

—Não se preocupe com formalidades, uma camiseta e uma bermuda estão ótimo. Desta vez não falaremos de negócios. Até breve, Jackson! —Desliga o telefone, sem me dar chance de abrir a boca. 

—Mas que porra é essa? —Sibilo, percebendo que algo de errado acontece ali.

Por que Robson quer tanto que me integre a família. O que tem de tão importante a minha presença? Estranho, muito estranho. Não é só porque ele quer que eu conheça sua filha e lhe desse algum tipo de informação. Ou é? Saber o que sua filha faz é tão desesperador assim? Bom, levando em conta tudo que sei, é sim, e quanto mais antes ele souber melhor. Acontece que eu não tenho coragem de fazê-lo, eu não seria responsável pela dor dele, de jeito maneira. Mas estou encurralado, não é mesmo? O jeito era tomar um banho no dia seguinte, vestir uma roupa informal e comparecer ao almoço na casa do meu chefe. 

***



Coloco uma calça jeans bege, e uma camisa branca, com mangas até o antebraço. A camisa é apertada, porém marca bem as minhas definições, já a calça, tem um caimento perfeito em meus quadris. Dou uma última olhada no meu visual. Estou bem! Ajeito o colarinho, passando a mão na cabeça. 

Um dos empregados de Robson que me recebe, quando toco a campainha. Uma simpatia que nem sei se mereço, fazendo-me sentir como alguém especial. Provavelmente ele foi quem o instruiu para que eu fosse tratado desta forma. Questiono o motivo, não encontro nada. 

— Michael, meu garoto! É muito bom revê-lo! Agradeço por atender ao meu pedido. 

— Eu que agradeço pelo convite. Nem sei se mereço tanta atenção. — Robson indica o sofá para que eu pudesse me sentar. Puxo um pouco a calça na área da coxa e me sento.

Aquela casa é magnífica. Tudo do bom e do melhor. Móveis modernos e escadarias que mais parecem que saiu de um filme medieval. Parece rústica e antiga. Essa admiração pela idade dos reis e rainhas pode ser notória em tudo que Robson fizesse. Até mesmo na empresa, há uma atmosfera deste tipo. As escadas de formato em caracol dá uma sensação de infinidade, fazendo todos dar graças a Deus que há elevadores. Esta é uma casa de aparência antiga, mas posso dizer com toda certeza o quão luxuoso é. 

—Óbvio que merece! Como não? Você é o meu braço direito, cara! —Por que é que eu tinha a sensação que não é só isso?

Robson senta-se à minha frente, com a perna direita por cima da esquerda, braços abertos escorados no encosto do sofá e um sorriso bem amplo, mais que o normal. Oh, cara, pera aí! O que há? 

—Conversou com Ella esses dias? O que conversaram? —Ufa, ele quer saber sobre Ella e sobre a minha conversa com ela. Acontece que ainda não tive coragem para lhe contar o que andamos conversando.

—Sim, Ella tem sido ótima. Foi maravilhoso, senhor. Sua filha é incrível. — me sinto sem jeito, não sei o que falo. Não há o que falar sem entregar o contratempo que tivemos. Prefiro me silenciar, mas sinto que não me livrarei ainda. 

— Isso é ótimo. — Permanece me encarando esperando que eu dissesse algo, mas não consigo nem ao menos mudar de assunto para me livrar desta conversa. 

— Ella tem sorte de encontrar uma pessoa como você. —continua e eu franzo o cenho. Não foi ele o causador desta encrenca? —Sabe Michael? Eu sempre quis ser avô. Venho me perguntando se um dia conseguirei. — franzo o cenho mais uma vez, diante da frase carregada de insinuações, mas tento não me apegar. 

— Claro que terá! Ella ainda é jovem e muito bonita. Com certeza conhecerá um cara legal para constituir família. —Robson ajeita o pescoço, para me encarar com paciência. 

— Então a acha bonita? — maneio a cabeça, um pouco preocupado em fazê-lo. 

— Ella é uma moça muito bonita. — Reafirmo a minha resposta e percebo que Robson se alegra. 

Ele olha por cima dos meus ombros, como se estivesse olhando para uma pessoa atrás de mim. Pela minha visão periférica posso perceber a silhueta de Ella, adentrando a sala, e sem cerimônias sentando-se ao meu lado. 

A filha de Robson está realmente linda. Usa um vestido roxo comportado até a metade da coxa, seus cabelos ruivos estão soltos, ondulados nas pontas. Sua maquiagem está leve, mas tem uma aparência bem mais saudável que da última vez. O que me faz acreditar que não deu suas escapadas durante à noite. Sua aparência é de quem dormiu bem e está disposta, para o meu alívio. Ou pode ser apenas por estar diante de seu pai.

—Viu só, minha filha? Michael aprecia a sua beleza. —Fico sem jeito, mas não o suficiente para me constranger, apenas abro um sorriso tímido para Ella, que rir desconfiada. 

—Senhor Robson, o almoço já será servido. — Uma moça uniformizada anuncia, quebrando aquele clima desconfortável que se instala. 

—Oh, ótimo! Já estávamos famintos, não é Michael? —Assinto e me levanto. 

Sigo Robert e Ella até a mesa posta no jardim da casa. O clima era agradável e a vista do jardim era impecável. Uma piscina logo à frente e à direita um pequeno campo de golfe. Me sinto satisfeito. Sem contar com a comida, tudo do bom e do melhor. Ella se senta à minha frente e Robson na cabeceira do lado direito ao meu. 

—Sabe Ella, Michael tem sido um dos melhores funcionários que eu já tive em anos. Ele é articuloso, sabe lidar com as negociações e faz o seu trabalho como nunca vi antes. Sem contar com o seu talento incrível em criação. 

O elogio é agradável, mas o motivo dele me deixa apreensivo. A impressão que dá é que Robson quer sempre embelezar a minha imagem diante da filha. Como se fizesse, Ella se agradaria de mim e de quem sou. Não estou reclamando, mas às vezes parece exagero o interesse do meu chefe. 

Começamos o almoço assim mesmo, nesse clima de elogios e estranheza aguda, só para perturbar a minha mente. 

—O senhor já disse várias vezes sobre o quão bom Michael Jackson é e sobre sua fantástica habilidade para com as sua empresa, papai. Além do mais eu sei o tipo de profissional eficiente que ele possa ser. —O tom de Ella está carregado de ironias, mas o sorriso está intacto como uma máscara esculpida e colada em sua face. Ela é muito boa nisto. 

Robson dá um longo gole em seu vinho e eu faço o mesmo. 

—Mas vale ressaltar. É de homens como este que preciso em nossa família. —Engasgo um pouco, mas logo me recomponho, sob o olhar insinuativo de Robson. 

Me pergunto por um instante qual é a minha intimação agora. Será que Robson me quer como genro? Não, parece óbvio. Primeiro me convida para a sua casa, depois fala de netos e agora isto? Como pude ser tão idiota em não perceber? Será que esse papo furado de "conhecê-la para poder me contar como a filha é" foi apenas uma desculpa para me aproximar da filha, com outras intenções? 

Ella revira os olhos, mas não se abala, pelo visto ela conhece bem o pai e conhece bem suas intenções. Com certeza deva ter enchido seus ouvidos em elogios e louvores, afim de que eu marque pontos com a filha. Agora eu pergunto, desde quando preciso de ajuda para me relacionar com alguém? 

—Senhor Robson, eu... —Tento argumentar, mas sou interrompido como sempre.

—Fiz reservas no Noir's para vocês. Seria magnífico os dois jovens saírem para jantar e se conhecerem melhor. O que acham? —Olho depressa para Ella está chocada, e não posso dizer que comigo seja diferente. 

—Pai eu não posso! —Ella reclama. Talvez por sentir a pressão de seu pai, eu também consigo sentir. 

—É claro que pode, filha. —Robson é pacífico e paciente, inabalável. Eu por outro lado... —Não vai me fazer perder a reserva que custei a conseguir, não é? Os Noirs fizeram esse favor a mim, não irá cobrar nada por conta da parceria. Irei lhes dar de presente. 

Dou um gole longo na minha bebida na tentativa de fazer descer aquele bolo na garganta que se formou chamado "confusão", "estranheza" e "perplexidade". Robson insistiria nisso, e não posso fazer nada para impedir. 






Capítulo 6 


—Se você não quiser ir, tudo bem. Papai não pode obrigá-lo a nada.

Seria muito mais fácil se eu tivesse sido de fato obrigado. Talvez eu simplesmente não aparecesse no encontro que arrumaram para mim, a final sou um homem e ninguém ouse a me impor nada. Mas quero ir. Conhecer mais de Ella, ficar ao seu lado e tentar ajudá-la de alguma forma. Quem sabe eu obteria mais informações sobre sua vida conturbada? Além do mais, não é sacrifício nenhum ir a um restaurante acompanhando de uma bela jovem como Ella é. Estaria me estranhando se fosse problema.

—Pode ter certeza que eu irei. Não estou sendo obrigado a nada, muito pelo contrário. —Olho para os lados me certificando que Robson está mesmo do outro lado do jardim para atender o telefonema que recebeu. Inclino meu rosto na direção de Ella em uma tentativa de sussurrar, quando percebo que o caminho está livre. —Eu quero muito que me conte mais sobre o que passou no internato. 

A moça infeliz com a alma afundada em tristeza, olha distante, como se estivesse viajado para um lugar somente dela. Balança a cabeça soltando um riso irônico. Não consigo ficar com raiva dela por muito mais tempo.

—Não há nada que você deva saber, Michael. O que posso dizer é que aquele lugar é um inferno e se alguém me perguntar quais são os pesadelos mais horrendos que já tive na vida quando adormeço, pode ter certeza que minha resposta será, quando penso que ainda estou naquele lugar. —Fico ainda mais surpreso pela forma como descreve o lugar onde passou sua infância e parte da adolescência. Estou ávido por respostas, mas sei que não obterei desta forma.

—Minha nossa, Ella! O que houve de tão perturbador? Sério, eu não consigo pensar em nada. 

Castigada com cintas e palmatórias corretivas? Meia dúzia de freiras gritando sermões sem parar em seu ouvido? Talvez orações ajoelhada em milho cru. Não, nada que pudesse dizer que seria sim algo traumático, levando em conta sua atitude. 

—Se eu contar, você nunca mais iria querer saber de mim. —Franzo o cenho diante daquela frase enigmática, oculta e repleta de mistérios. Acho que quem ficaria perturbado seria eu. 

—Bom, crianças, eu preciso ir. —Robson se junta a nós, e eu me ajeito na cadeira. —Mais trabalho, sabe como é? Mas fique à vontade, Michael. Ainda têm muito o que conversarem. —Assinto agradecido, sorriso fraco, ainda pensando na frase de Ella que me enlouquece e corrói por dentro como ferrugem. 

***


Aquele restaurante tem um clima aconchegante, uma atmosfera fiel à sua origem, bem francesa. Os metres trajados a caráter e a música que toca ao fundo, em uma altura adequada, é francesa. A iluminação bem fraca, mas é possível enxergar tudo com perfeição. Ella e eu sentamos em uma mesa estratégica que nos inclui ao local, mas ao mesmo tempo somos integrados ao clima natural, perto do jardim. Posso afirmar com toda certeza que adorei aquele vento fresco batendo em nossa pele. 

—Sabe? Até que não estou me sentido como se estivesse indo para a forca, como seu pai fez parecer. Sua companhia é agradável e o restaurante é incrível. —Ela sorri de uma forma sincera desta vez, seus dentes são bem brancos e o sorriso é lindo. Me pego observando-o por um longo período de tempo e vê-la sorrindo com verdade me deixa estranhamente satisfeito. É tudo que eu queria e acabo conseguindo. 

—Quando papai cisma com alguma coisa, fica bem difícil dissuadi-lo. Você deve se acostumar. —Levanto as mãos em rendição.

—Já me acostumei. Mas fico feliz por ter aceitado vir, mesmo eu sabendo que não era o que queria. —Ela me olha com ternura, uma expressão serena e genuína entona sua face, agraciando o meu coração.

—Você é o único cara que conheço que sabe um pouco de mim. Conhece o meu lado sombrio, e quando se encontra alguém assim, não é bom afastá-lo, ainda mais quando você tem certeza que ele é de confiança e irá ajudar. —Me sinto lisonjeado, saber que alguém confia em você dessa forma é gratificante, me sinto orgulhoso de quem sou.

—Sabe, eu tinha uma amiga no internato que era minha parceira de tudo. Ela me livrava de encrencas se metendo nelas em meu lugar. Algumas vezes eu me sentia culpada, mas ela sempre dizia que era forte e que aguentava mais do que eu. Conversávamos sobre muitas coisas, e principalmente, sobre o dia em que sairíamos dali. Ela falava que se casaria com um italiano, porque sempre admirou o visual europeu deles. Dizia que eu encontraria um cara que cuidaria de mim, e, não importa o que acontecesse, ele estaria ao meu lado. 

Suspiro abrindo um sorriso, talvez eu me encaixasse nesse papel. Eu seria incapaz de deixá-la sozinha, parece que sua amiga descreveu o meu perfil perfeito. Acho que é isso, eu seria capaz de tudo para erguê-la desse poço em que se enfiou, custasse o que custasse. 

—Esse sou eu. —Levantei um dedo, acompanhando o seu riso. — Acho que quando você conhece um pouco da vida, e tem uma noção exata do horror que possa ser lá fora, você consegue ser um pouco complacente com as pessoas. Você quer vê-las bem, ainda mais quando percebe que ela pode ter um futuro promissor, quando o peso dos problemas aliviarem. Ninguém merece sofrer, Ella, apesar de ser tudo que um ser humano passa, mas tentar buscar a felicidade não é pecado. A vida é curta demais para mergulharmos nessa obscuridade que a vida nos impõe. —Mas uma vez seus olhos são ternos, como se eu houvesse dito algo surpreendente. 

—E se eu não conseguir, Michael? E se eu mergulhei tão fundo que não possa mais nem encontrar o caminho de volta? O que será de mim?

—Se de fato aconteceu, eu estarei aqui para ajudá-la encontrar o caminho de volta, sem hesitar. 

Seguro em sua mão com força e ela faz o mesmo, ainda mais forte que eu. Sinto a quentura de sua pele, sua carne trêmula, sou obrigado a aplacar o seu medo usando a outra mão. Seu olhar perdido volta um pouco medroso também, mas percebo que está confiante, talvez em mim, ou minhas palavras. Sinto que sou responsável por ela e não fugiria dessa responsabilidade nem se dependesse disto. 

***


Degustamos um ensopado de vitela acompanhado de um vinho branco que achei deliciosíssimo. Acho que a culinária francesa tem suas qualidades, sempre com ingrediente especial um vinho que deixava a carne suculenta e saborosa. Porém nada me faz mais feliz que a companhia de Ella. Temos uma conversa amistosa e tão descontraída que acabo contando com sua simpatia para comigo. Estamos nos dando bem, parece que eu conquisto o meu lugar em sua vida. 

—O que estão achando da nossa comida? —Senhor Noir vem até nós com a mesma simpatia que esbanjava no evento do senhor Robson. O sotaque francês carregado me impede de entender a última frase, mas acho que deva ser um: " Está do vosso agrado?

—Sim, muito obrigada. Está tudo ótimo, inclusive as vitelas. O molho então... Vocês fazem um ótimo trabalho aqui. —Sorrio para Ella, era uma moça muito educada e seu elogio parece sincero. 

—Para mim o mesmo, senhor. Nunca havia experimentado antes ensopado de vitelas, e nem um vinho como este. Diria que estou impressionado, no bom sentido, claro. —Riram do meu comentário. 

Mas para falar a verdade eu realmente não estou acostumado com culinárias requintadas, tudo que eu almoço e janto são gororobas que eu mesmo invento, somente para não ficar de barriga vazia e não morrer de fome. 

Quando se é um homem sozinho você não se preocupa com alimentação muito bem. Algo que mate a fome do momento já está de bom tamanho. 

—O senhor é assistente do senhor Robson, estou certo? 

Assistente... não é bem isso que gostaria de ser lembrado, mas infelizmente foi assim que senhor Noir e sua esposa me conheceu. 

—Na verdade, Michael é um publicitário formidável. Papai vive elogiando-o pela sua eficiência. É ele que está planejando o marketing do restaurante, que diga-se de passagem, está ficando maravilhoso. —Encaro Ella por um instante. Não fazia ideia de que sabe tanto sobre a minha profissão e o que estou fazendo. Lembro-me que com certeza Robson havia lhe dito. Me sinto orgulhoso por ter falado de mim com tanto carinho como acabou de fazer. 

—Oh, mas que marravilha! A companhia está excepcional, nunca vi tantos clientes chegarem tão rápido em todas as minhas inaugurações, graças a suas habilidades em produção de propaganda. Muito obrigado, meu rapaz. —Ganho um aperto de mão e me encho de vigor por ter meu trabalho reconhecido. Acho que todo mundo gosta de ser elogiado, eu não sou diferente. 

—Obrigado, senhor, eu faço o meu melhor. 

—E com isso vai longe. Pode apostar. 

***


Caminhar pela orla da praia à noite com Ella me faz sentir que éramos dois amigos de anos. Alguém que eu pudesse contar as minhas coisas e ouvir também. Fazia tanto tempo que eu não conversava com alguém assim.

—Adoro essa praia, principalmente quando eu era criança. Fazia o cenário perfeito da minha felicidade. —Ella olha na direção das ondas, o vento frio sacode seus cabelos ruivos, e o perfume dos fios invadia as minhas narinas, fazendo com que eu me agitação por dentro. Era xampu —Mamãe vinha comigo todos os finais de semana. Nadávamos, fazíamos castelos de areias que as ondas logo vinham para desmanchar. —Solta um riso. —Éramos inseparáveis. Eu acho que nunca vi uma mãe cuidando tão bem de um filho como ela cuidava de mim. 

Lembro da minha mãe e sei do que está falando. Eu vivi. Mulheres que são como nosso espelho para a vida, merecem sim exaltações e serem lembradas para sempre. 

—Também tenho uma mãe a quem devo me orgulhar. Tudo que me tornei devo a ela. 

—Infelizmente não posso dizer o mesmo. —Sua face se entristece, como se uma onda de sentimentos ruins houvesse a submergido. —Às vezes tento imaginar como minha vida seria se ela estivesse ao meu lado. Temo que seria bem melhor do que é agora, e isso me assusta. Imaginar que eu tinha chance de não ter passado pelo o que eu passei, me deixa furiosa. 

—Talvez seja apenas para um aprendizado. Quando a vida nos impõe barreiras é para nos ensinar, nos mostrar que podemos ser melhores do que imaginamos ser. É quando descobrimos nossas forças, e isso nos dá ânimo. 

—Temo que não posso sozinha. 

—É aí que você se engana, somos bem mais fortes do que achamos que somos. Basta querermos fazer o melhor e possuir o melhor. —Ella me olha com admiração, mas me sinto envergonhado. Não queria ser visto como um moralista ou alguém que conhece tão bem da vida que tenta soberbamente ensinar a alguém. Era apenas um meu jeito de fazê-la sentir melhor. 

—Que tipo de pessoa você é, Michael? Um anjo? Porque eu realmente desconheço esse tipo de ser humano. —Não disse como um deboche igual da última vez. Seus olhos estão lacrimejados e ela me encara com ternura. 

Abaixo a cabeça por entender o seu questionamento. A vida poderia ser bem mais fácil se existisse alguém que podemos contar, mas há um mal lá fora que cega as pessoas e as tornam egoístas demais, ao ponto de não saber compreender a dor do próximo. Não que eu seja um homem maravilhoso ao ponto de tentar curar o mundo, mas pelo menos o que tiver ao meu alcance eu farei, e com muito prazer.

—Só alguém que quer vê-la sorrir com sinceridade. Que necessita arrancar essa dor que eu sei que sente e curar as feridas. Um anjo? Não, de jeito nenhum. Prefiro dizer que sou um ser humano que sente prazer em sorrisos sinceros. —Seus lábios se abre em um sorriso satisfeito, seus olhos esverdeados ganha um brilho tão intenso que meu coração retumba. E por puro instinto acarinho suas bochechas rosadas, sentindo o toque macio da sua pele. Nunca havia visto uma mulher tão linda quanto Ella. 







Capítulo 7




Descanso minha cabeça no travesseiro, mas não sinto vontade de dormir. Talvez ficar olhando para o teto até não aguentar mais ao ponto de desmaiar de sono, já está valendo. Eu não consigo parar de pensar em Ella e sobre nossas conversas de ultimamente. Tudo parece tão significativo que é como estar conectado a alguém que nem ao menos sei o porquê. 

Descobrir o que a aflige é minha principal prioridade, mas às vezes tenho medo de conhecer seus motivos. Ela deixou bem claro que sua vida no internato fora impossível. Não sei ao certo que poderia ter passado, mas sei que é algo terrível. Prefiro pensar que tudo irá se resolver e Ella acabará abandonando os vícios e me ouvir. Era tudo que eu queria naquele momento.

Consigo dormir, o suficiente para me sentir satisfeito. O dia seria longo de trabalho e meu corpo descansado me prepara para o dia lá fora. A empresa está cheia de trabalho, me focalizo no que tenho que fazer e me desligo do mundo. Mexer com gráficos e estatísticas era um dos meus prazeres, ainda mais ter que planejar uma propaganda perfeita para o restaurante dos Noirs. Eu tive várias ideias a partir do que foi pedido, e minhas mãos já estão a todo vapor nas teclas do computador. 

Quando olho à minha frente Vince está me encarando com um sorriso malicioso, como se soubesse de alguma travessura minha, mas prefere somente ficar analisando. Queria saber até quando as pessoas ao meu redor continuariam dando uns de loucos. 

—Tá me estranhando, cara? Qual é? —Deixo meu trabalho de lado apenas para tirar uma com a cara dele.

—Soube que saiu pra jantar com a filha do chefe ontem à noite. É isso mesmo, Michael? De braço direito à genro? —Bufo uma risada, achando o comentário uma bobagem. 

—Não sabia que as fofocas dentro da empresa poderia ser tão veloz assim. —Levanto de onde estava sentado, a fim de beber um copo de água no canto da sala. Vince me segue. 

—Só que a fofoca foi o próprio Robson que fez questão de espalhar. —Paraliso com o copo de água na mão, antes de beber. —Ele disse que você está prestes a entrar para a família. Estava em uma empolgação só. 

Penso que estou no meio de algo surreal, algo que vai além da minha compreensão. Por que Robson faz tanta questão assim? Qual é o proposito? Percebo que talvez nunca chegasse a uma conclusão. Eu ser o seu genro? 

Bebo a minha água, na tentativa de fazer o intenso nó que se formou na garganta. 

—E então, Michael? Ela beija bem? —Reviro os olhos. 

—Não aconteceu nada, Vince. Ella é ótima, uma amiga. Nada demais.

—E você acha mesmo que acredito nisso? Primeiro Robson pede que a vigie, depois vai almoçar na casa dela, e depois jantar juntos em um dos restaurantes, que em um ano inteiro de trabalho, não conseguiremos pagar? —Caminho até a minha mesa de volta, com Vince enchendo a minha cabeça. Estou tão enfiado nessa história que provavelmente não seria nada fácil sair. 

—Não há nada... nada entre mim e Ella. Somos amigos nada demais. Não entendo qual é a do Robson, não sei qual é o interesse. Mas se eu fosse ele me preocuparia com a saúde da filha ao invés de bancar o cupido. Ella tem problemas e muitos. —Vince franze o cenho e vejo que se preocupa. 

—O que houve? 

—Eu não sei o que é, mas algo de muito grave aconteceu em seu passado que a fere profundamente. Tento ajudar, mas não sei se consigo. —O operador de sistemas, louco por encrencas abre um sorriso amplo.

—Você gosta dela? Não é? —Balanço a cabeça negando, mas enrubesço por causa da timidez. —Claro que gosta! Se não gostasse não estaria tão afim de buscar repostas e querer ajudar.

—Só pelo fato de querer ajudar um ser humano, já é uma justificativa em tanto, não acha? —Ele balança o dedo, achando a minha desculpa uma bobagem. 

—Não, não, não. Ella é bonita, não dá pra querer ajudá-la só porque se trata de um ser humano. Você seria muito burro se fosse apenas por isto. —Sorrio balançando a cabeça. Incrédulo diante de sua perspectiva. 

Não sei o que sinto por Ella. Na verdade, por enquanto, o que sinto é pena, uma vontade insana em protegê-la. É uma moça lindíssima, e seu cheiro aguça meus instintos, mas não passa disso. 

—Ela é uma amiga, mas nada. —Enfatizo convicto. —Por favor, pare de dá uma de Robert Robson e vamos trabalhar. Preciso terminar essas edições ainda hoje. 

Finalmente Vince me deixa em paz e recomeço meu trabalho como se nada tivesse acontecendo. 

***


Estou cansado e morrendo de fome. Mal vejo a hora de chegar em casa e descansar. Tomar um banho quente e relaxar o meu corpo. Meus pés doem e vejo que ainda faltam alguns quilômetros de caminhada até chegar em casa. Maldita hora que gastei minhas economias com aqueles pesos de malhação invés juntar para comprar um carro. 

Minhas vistas estão turvas e percebo quão exausto estou. 

—Não, por favor, não faça isso! —Uma voz feminina de pavor rompe o silêncio daquele beco escuro. Entro em alerta por conhecê-la, e saber direitinho de quem se trata. —Não! —O grito agudo de dor me deixa agitado.

Sigo o som da voz, acabo em uma viela fétida. O grito de protesto fica ainda mais nítido e bem mais apavorante. 

—Só uma vez, gatinha. Vai ser rápido! —Um homem alto e negro surge no campo da minha visão, e bem em sua frente os cabelos ruivos e esvoaçantes me dá uma certeza absoluta de quem é a dona da voz. 

Ella está sob os braços daquele homem. Descabelada, chorando, desesperada. A mão dele sobe perturbadoramente pelas suas pernas, seus lábios percorrem o pescoço daquela garota indefesa que acabei assumindo um papel de protetor. A raiva me atinge como uma bomba. De repente o cansaço desaparece, e uma onda de violência me afeta, no exato momento que percebo a ereção daquele canalha esfregando em Ella.

Dou um solto na frente dos dois, encaixo meu braço com o punho fechado no abdômen dele, contudo soco seu estômago afastando-o de cima dela. 

—Seu desgraçado! 

O homem está no chão, me olha assustado. Mas eu por outro lado, estou afim de acabar com ele. 

—Quem você pensa que é? —Ele se levanta rapidamente, sem se abalar. Me encara estufando o peito. Não me intimido! 

—Alguém que não vai permitir que faça nada com a garota! Ficou maluco? Vai ter que lutar comigo primeiro. —Mostro meu punho, já pronto para socá-lo de novo.

—Você se acha esperto, mas não sabe com quem está se metendo. Só estava pegando o meu pagamento.

Dou uma olhada em Ella encolhida no chão, trêmula e soluçando. Provavelmente está drogada, devendo dinheiro de drogas. Me sinto decepcionado, mas não é hora de me focar nisto. 

—Está aqui o seu pagamento. —Desfiro um soco em sua cara. Sinto como se batesse em concreto, mas insisto dando um chute na boca do seu estômago que fez o homem ficar sem ar. 

Ele reage, tenta revidar o soco, mas dou um giro e chuto sua cara, fazendo sua boca sangrar. Santas aulas de karatê que peguei apenas dois dias, mas ainda assim me lembro dos truques de defesa e contra-ataque. 

O homem bate a cabeça no muro e desaba no chão, nem me dou ao trabalho de ver se matei aquele filho da puta ou não. Simplesmente pego Ella pelo braço e saímos de lá imediatamente. 

—Michael, eu juro. Eu não cheirei. —Tenta se explicar, seguindo-me. Mas estou furioso demais para escutar.

É nítido na sua cara que havia cheirado sim. Parece um zumbi perambulando. Sinto raiva, chateação. 

—Porra Ella! A gente já conversou sobre isso! —Percebo que já estou berrando no meio da rua. A garotinha indefesa chora, mas não sinto remoço, desta vez não. —Você poderia ter morrido. Já pensou sobre isso? Faz alguma ideia do que poderia ter acontecido com você se eu não tivesse passado? 

Sinto minha garganta se apertar só de pensar na possibilidade. Ela já sofreu tanto, que não posso e não quero vê-la sofrer de novo. Ella para mim é uma bonequinha, ao qual merece cuidados e não dor. 

—Eu sinto... muito. —Ela treme, não tem forças sobre suas pernas e cai ao chão ajoelhada. 

Era incrível como Ella muda tão de repente. Ora um bela dama comportada com toda a etiqueta que uma moça de seu porte poderia ter, mas no outro, um trapo humano, completamente suja, como se não tivesse alma. Ou talvez tivesse sim, mas completamente degradada. 

—Dessa vez não, Ella. Já chega! 

Minha paciência está por um fio, mas era com tudo. Por ter entrado nesta situação de paraquedas, por te visto um filho da puta tentando violá-la. Por saber que ela está acabando com a sua própria vida. 

Meu peito está pesado, sinto como se sufocasse. Estou exausto ainda mais emocionalmente do que fisicamente. Suspiro, mas o ar me falta. 

Caminho de volta ao meu rumo, e ouço-a gritar o meu nome. 

—Michael, por favor! Não me deixe aqui. Não tenho para onde ir. —Paro de caminhar, fecho os meus olhos com força. Sou incapaz de deixá-la sozinha. Acho que sou um otário mesmo, deve ser por isso que esse carma veio para a minha vida. —Não posso ir pra casa neste estado. 

Viro o meu corpo e olho para ela. Seu choro é ininterrupto, e ela desmaia. 









Capítulo 8

Carrego-a para dentro de casa, no meu colo e fecho a porta. Me pergunto se essa cena seria corriqueira de agora em diante. Ella acorda assim que eu a deito na cama. Seus olhos estão bastante vermelhos, encarando um ponto fixo sem piscar. Parece atônita, fora de si, completamente catatônica. 

—Ella? —Chamo, sentindo um medo tão grande, que por um instante, fico sem reação. 

Seguro seu ombro e balanço com cuidado, uma forma de fazê-la voltar a si. Ella desvia seus olhos para mim, fitando diretamente os meus olhos. Parece possuída. 

Fico imaginando sobre o que deva estar passando por sua cabeça. Com certeza fora um momento traumatizante. Se eu não tivesse chegado, sem nenhuma dúvida aquele canalha abusaria dela. Só de imaginar, minha raiva volta de novo, junto com o arrependimento de não ter acabado com ele de vez. 

—Está tudo bem? —Ela assente, mas volta a chorar de novo. 

Odeio vê-la chorar, odeio ser inútil ao ponto de não conseguir fazer nada que impeça seu sofrimento. Até tento não me importar, colocar na cabeça que se estar passando por tudo isso, é tudo culpa dela. Mas quando olho em seus olhos, e pela forma que chora, sei que é bem mais complicado. 

Um colega que tive na adolescência era um usuário de drogas também. Bebia e cheirava ao mesmo tempo, sempre dizia que os vícios o fazia esquecer dos problemas. Ele era um artista muito bom, tocava bateria em banda de garagem. Tinha uma expectativa muito grande em se tornar um dos melhores e fazer com que sua banda fizesse sucesso. Várias oportunidades que se abriu, porém nunca conseguiu realizar seu sonho. Uns diziam que ele precisava ter algo a mais, outros disseram, que não era bom o suficiente, acabou afetando sua autoestima. Daniel nunca superou os “nãos” ao longo do caminho e se afundou nos vícios. Nunca mais tive contato com ele, mas não precisa ser expert para saber que sua vida piorou ainda mais. 

Olho para Ella e sei que seu caso não seria uma frustração, ou até poderia ser, já que nunca teve o amor do pai. Mas seus olhos me dizem que é bem além disto.

Ofereço água, comida e ela rejeita. Só quer ficar deitada e dormir. Penso que está confortável em minha cama, ir para casa neste estado não seria uma boa ideia. Já penso no amontoado de cobertores que eu faria no chão para que ela pudesse tomar todo o espaço da cama, mas assim que faço menção de me retirar meu braço é capturado. 

—Fique comigo, Michael, por favor? Eu não quero ficar sozinha. Não esta noite. —Fico sem graça, mas prefiro atender ao seu pedido. 

Ella vira-se para o lado da janela e eu deito olhando para o teto, pareço uma estátua sem movimento algum, ansioso para o que o dia nascesse novamente. 

Rapidamente pego no sono.

Um gemido ao meu lado me desperta, tento me situar, e vejo que estou na minha cama, que peguei no sono e Ella está ao meu lado. Viro para o lado que se encontra, ainda está escuro, mas ela se debate inteira. Geme de agonia, sua cabeça balança no travesseiro. É como se estivesse sentindo dor, como uma tortura. 

Penso que possa ser o efeito da droga, mas ao prestar bastante atenção , ela ainda está dormindo. Se trata de um pesadelo? Confirmo minha suspeita quando ela começa a chamar o nome de alguém que tenho a impressão que já ouvi alguma vez, quando estávamos na praia. 

—Por favor, Madre Bianca, já chega! Eu não quero mais, me perdoa! —O corpo de Ella chacoalha, tem lágrimas rolando de seus olhos. —Não toque em mim assim, eu lhe peço. Isso dói! 

Me desespero. Ella está sofrendo naquele pesadelo e eu preciso tirá-la dessa situação. Acendo o abajur ao meu lado, seus dedos estão retorcidos, como se levasse um choque, suas pernas imóveis como se estivesse amarradas. Me impressiono com a cena, era como se fosse um gostinho de tudo que ela sofreu naquele maldito internato. 

—Ella acorde! —Tento acordá-la. Não sei ao certo se balanço o seu corpo, se grito o seu nome. Não sei como agir. 

Levo minha mão até o seu rosto, dou duas batidas enquanto ela suplica por clemência. Não obtenho sucesso. 

—Eu não quero mais! Pai, me tira daqui! Me ajuda, pai, por favor! —Seu sofrimento é digno de pena e, para falar a verdade, não quero mais ouvi-la. Ela precisa acordar. 

—Ella, acorde! —Brado chacoalhando o seu corpo com violência. Seus olhos se abrem e sua respiração é alterada. 

—Michael? —Seus olhos me observam e sua expressão se anuvia por perceber que estou ao meu lado. 

Ella se joga nos meus braços e me aperta com força, como se eu fosse sua salvação. Um anjo protetor ou alguém que está prestes a arrancá-la do abismo. Retribuo o abraço deixando que chorasse em meus braços. Deixando que chorasse até não aguentar mais. Minha garganta fica seca. Me compadeço. Nunca vi alguém sofrer tanto assim. Acarinho seus cabelos tentando lhe passar segurança. Acho que dá certo, pois seu corpo relaxa em meus braços. Pouco tempo depois tudo está calmo, sua respiração está ainda alterada, o soluço havia diminuído. A deito ao meu lado na cama, e cubro o seu corpo. Ela volta a dormir.

***



Abro a geladeira e os armários de mantimentos. Não há nada para se comer! Praguejo a mim mesmo por ser um homem que vive sozinho, e ainda por cima desleixado, negligente com coisas básicas de que um ser humano precisa. Encontro umas massas para preparar Waffles, mas não creio que seja uma boa coisa para oferecer à uma hóspede. 

Corro até o mercado, a fim de fazer algumas compras rápidas antes que Ella acorde. Quando chego a casa ainda está em silêncio e dá tempo de preparar, ovos mexidos com bacon, para mim, e panquecas de chocolate com calda de mel para ela. Suco de frutas cítricas. Preparo um prato bem bonito e servo à mesa. Acho que nunca havia preparado algo tão caprichado para ninguém antes. Uma decoração que nem sei aonde achei criatividade. Só queria que se sentisse bem na minha casa. 

Quando termino de colocar a jarra de suco na mesa, Ella aparece pela sala, com os cabelos revoltos e com as mesmas roupas de ontem. Está um bagaço, mas continua linda. Olha para a mesa posta, e percebi o quanto está com fome.

—Não quer tomar um banho antes? —Ela assente, bagunçando mais ainda seus cabelos ruivos. —Há uma toalha limpa no banheiro. Roupas eu não sei o que oferecer, mas se quiser usar uma das minhas fique à vontade. 

Ella não diz nada, pela sua expressão está um pouco envergonhada e depois segue o rumo para o banheiro. 

Volto a lembrar dos momentos de tensão que vivi na noite anterior. O quanto estava cansado do trabalho e quando penso que finalmente iria descansar, tenho de enfrentar uma das coisas mais conturbadas do mundo. Não consigo entender o que aconteceu. Os pesadelos de Ella, a forma como me abraçou. O pavor interno em que vive. Todos os demônios que a assola. 

Depois de alguns minutos ela volta, usando uma camisa minha vermelha. Seus cabelos estão molhados e penteados, seu rosto muito melhor, mas um pouco inchados e vermelhos. Talvez pela ressaca, ou não teve uma boa noite. Seus pés descalços me fez fantasiar, imaginando que Ella está em sua própria casa, que nos conhecíamos há anos e tínhamos algum tipo de relacionamento. Foi bom imaginar, mas também assustador. 

—Coma! —Peço assim que ela se senta. Continua em silêncio, capturando o garfo e já comendo o seu café da amanhã. Parece faminta, mas me sinto satisfeito quando solta um gemido de agrado com o gosto. 

—Espero que tenha dormido bem. —Continuo, apenas para puxar assunto. 

—E dormi, muito obrigada. —Assinto, mas não estou satisfeito, preciso falar mais, entrar no assunto "pesadelo" e conversar sobre seu quase estupro. 

—Pensei que depois da conversa que tivemos, você não iria mais... —Ella me interrompe.

—Me desculpa. —Pede de novo com a voz branda. Seu olhar é sincero. 

—Não é a mim que você deve desculpas, e nem para ninguém. Isso é com você mesmo. —Balanço a cabeça. —Está ainda mais claro pra mim o quanto você sofreu naquele lugar. Foram dias terríveis e seus pesadelos, Ella... Isso tem que acabar. Uma hora você tem que confiar em alguém para se abrir, mesmo que esse alguém não seja eu. 

—Michael, se eu contar você nunca mais vai querer olhar para minha cara. —Seus olhos se enchem de lágrimas, mas ela não chora. Franzo o cenho com a gravidade da situação. 

Como assim eu nunca mais olharia para a cara dela? Se sofreu torturas no internato quem devia pagar são as freiras e não ela. Por mais que o que tenha feito foi algo grave. 

—E eu preciso tê-lo ao meu lado. 

Me levanto atordoado, não sei se dou conta dessa responsabilidade toda. Eu mal sei o que devo fazer da minha vida. Para falar a verdade, minha vida nem está mais nas minha prioridades, até esqueci por um instante quem sou. 

—Elas te batiam? Te torturavam? O que aconteceu? —Meu tom aumenta, estou farto de perguntas sem respostas. Estou cheio de tudo isso. 

Ella vem para próximo de mim, está cara a cara comigo, seus olhos verdes assustados como de costume. Seus lábios estão trêmulos, e sua pele alva está ainda mais pálida. 

—Eu prometo que vou ficar longe das drogas. Prometo que vou tentar, mas eu preciso da sua ajuda. Eu quero você ao meu lado, é o único que me conhece do jeito que eu preciso. É o único que parece querer me ajudar sem esperar nada em troca. Por favor, Michael, me ajuda? 

Aquele olhar, aquele pedido. Era difícil demais recusar, eu sou incapaz de recusar. Assinto, tenho a certeza que estou cometendo um erro. Mas era um erro que estou disposto a encarar, eu queria pagar para ver. 

—Você pode contar comigo... —Dou uma pausa, apenas para umedecer os meus lábios que estão secos por conta do estresse. —Pra qualquer coisa. 

Ella se aproxima mais de mim, ainda olhando no fundo dos meus olhos, mas faz algo inusitado que perco o ar por um instante. Coloca seus braços envolta do meu pescoço e seu cheiro natural de jasmim invade minhas narinas, que estremecem as minhas pernas. Sua testa encosta na minha, fico de cara com seus lábios carnudos e rosados. São atrativos, sensual. Tudo em mim se acende, fico tonto, ofegante. Depois leva seus braços para a minha cintura, me abraçando com fervor. Um ato de agradecimento, mas não pude deixar de pensar o quanto sensual fora. Enfio minha mão dentro de seus cabelos úmidos, enquanto ela descansa sua cabeça na curvatura do meu ombro. Sinto um arrepio quando deposita um beijo molhado na minha pele, balbuciando um "obrigada" quase imperceptível. Relaxo, a abrigando perfeitamente em meus braços. Foi o momento deliciosamente surreal que já vivi na vida. 





Capítulo 9




O mar está propício para um banho matinal antes do trabalho. Está calmo, a atmosfera fresca. Inspiro o ar arborizado com cheiro de maresia. Eu adoro aquele toque nostálgico que me invade todas às vezes que encaro o mar. Sinto-me livre! 

Meu primeiro mergulho é como se lavasse a minha alma, vou ao profundo de mim e conheço o meu interior. Sinto o toque suave de Ella no meu corpo, ali submerso. Sinto coisas, mas tento espantar os pensamentos. Aquela aproximação que tivemos foi genuína. Posso até dizer que nunca havia sentido nada igual antes. Foi sensacional. 

Abro os olhos e percebo que estou submerso a muito tempo. Fico de pé, retiro a água do rosto para poder enxergar melhor, uma onda vem com tudo e me derruba. Começo a rir bobo e sozinho por conta do tombo... Prefiro dizer que foi por conta das lembranças, foi como um tombo literalmente. Não consigo me entender, porém me sinto bem.

Caminho de volta pela areia, já sabendo que estou atrasado para trabalho. Tomo um banho rápido, ao chegar em casa. Visto minha costumeira roupa social. Estou pronto. 

Quando chego, um burburinho se instala na sala de produções. É que seria o dia das gravações do comercial do novo restaurante da cidade. Estou ansioso para conferir, afinal, fui eu quem planejou. O estúdio está preparado e senhor Robert Robson está animado, dá pra ver assim que entrei.

—Michael, meu querido! As gravações estão indo a mil por hora, que bom que chegou! —Viu só? Eu avisei.

—Desculpe a demora, tive alguns imprevistos. —Imprevistos estes que foram puro deleite próprio.

—O importante é que esteja aqui. 

Robson segura o meu ombro, desta forma, assistíamos juntos as gravações. Um comercial cinematográfico com um casal francês jantando com a Torre Eiffel de cenário. Reproduzimos um fundo computadorizado que reproduzia Paris e todas as suas luzes. Achei magnifico tudo quando tive a ideia. 

Quando tudo acaba, tive de seguir Robson até sua sala, ele fez um pedido indispensável com um tom preocupado. Eu sabia que não tinha nada a ver com trabalho e sim o outro problema que ele havia me arrumado. A confirmação chega quando começa a abrir a boca. 

—Estou preocupado com a Ella. Já tem dois dias que não dorme em casa, anda estranha quando chega pela manhã e nunca sei em que está pensando. Por favor, Michael. Se sabe de alguma coisa me diga de uma vez.

Sou incapaz de dizer o que sei, não quero decepcionar meu chefe por enquanto. Então busco outra saída que só iria me encrencar mais.

Também não posso trair Ella. Aquela mulher confia em mim, por alguma razão, e eu não estragaria tudo, quando estou quase perto de descobrir, ou ao menos de tê-la ainda mais próxima de mim. 

—Ella estava comigo... no meu... apartamento. —Gaguejo um pouco e os olhos dele se acendem em surpresa, mas pelo que vi é surpresa boa. —Não é nada disso que está pensando. Só assistimos a um filme e jogamos conversa fora, nada demais. —Recebo um tapinha no ombro.

—Não importa. Se Ella está com você é tudo que eu preciso saber. —Robson parece tranquilo, como se o problema estivesse sido resolvido. Não era para me sentir revoltado com a omissão do pai de Ella, mas aquilo já está fora do aceitável para mim.

—Não sente remoço? —Altero um pouco a voz o impedindo de sair. 

Encaro Robert Robson com um vinco em minha testa. Sua expressão tem uma interrogativa impressa. 

—Sua filha volta depois de anos, você mal a conhece e se sente feliz por outro cara está fazendo o papel que você deveria fazer? —Sim, me estresso muito. Dá para notar o quanto aquela menina precisa de um pai e o seu pai, está omisso delegando este papel a outro. Estou sendo o pai de Ella, cuidando dela e dando conselhos. Mesmo eu tendo apenas trinta e cinco anos de idade.

—Que história é essa, Michael? —Ele não gosta, mas quer sabe? Eu não estou nem aí. —Ficou maluco?

—Ella viveu naquele internato por anos, trancafiada sem nem conhecer direito o sol nascer. Havia perdido a mãe e consequentemente o pai, porque este nem lembrava que a própria filha existia. Você tem ideia do quanto Ella sofreu em um lugar desconhecido? E o pior, sozinha! Porque nem um telefonema da sua própria filha o senhor atendia. 

—Ella disse isso pra você? É assim que ela se sente? 

—Ela se sente como qualquer um se sentiria se fosse abandonada pelo próprio pai, senhor Robson. —Ele abaixa a cabeça, e fica pensativo um instante, foi como se caísse a ficha, ou como se estivesse dormindo e alguém jogasse água fria na sua cara. 

—Eu não a abandonei! —Seu grito foi convicto. —Eu estava confuso, tudo estava desmoronando eu... —O interrompi não querendo ouvir mais nada.

—Conheço bem o seu discurso, mas não adianta colocar desculpas no passado se vai continuar a abandonando, para outro fazer o seu papel. Com licença, preciso ir. 

Me retiro da sala, com um gostinho de satisfação. Foi bom dá um choque de realidade em Robson, me senti bem. Finalmente me sinto como se fizesse algo de útil naquela história toda. 

***

Rabisco um desenho contemplando a pracinha da cidade. Crianças brincam e pessoas fazem caminhadas diante de mim, e eu começo a desenhar o retrato daquele vida em que me encontro. Talvez uma bela ruiva de olhos tristes e indefesos compunha os traços curvilíneos daquelas linhas. Levando em conta que estou pensando nela neste tempo todo... 

—Boo! —Levo um susto quando Ella aparece do nada sentando-se no banco onde estou sentado. O sorriso que dá quando percebe que me assustei foi maravilhoso de ver. 

Ela está sóbria, arrumada, maquiada. Cabelos penteados e roupas limpas. Seu sorriso é... Verdadeiro. 

—Não acredito que se assustou, Michael! —Acompanho o seu riso. Mas o motivo é que meus pensamentos estavam nela. É como ser pego em um momento íntimo. 

—Estava distraído, por isso. 

—E o que está desenhando? —Mostrei meu desenho sem vergonha e Ella se surpreendeu. —Uau! Você faz isso maravilhosamente bem. —Fico grato pelo elogio. 

—O mérito é todo seu. —Ela me encara de um jeito carinhoso, faço o mesmo. Não consigo entender o que sinto, tudo em mim parece se abalar com a sua presença. Tudo fazia sentido agora. 

—Adorei esses olhos expressivos, acho que não tenho olhos assim. —Dou uma olhada para aquelas duas órbitas verdes e percebo que tem tudo a ver sim.

—É porque eu desenhei os seus olhos quando você está assim, alegre. Quando está mal e entristecida eles ficam mais murchos. O primeiro é o meu favorito. —Agora sim me envergonho do que falo e desvio os olhos. Quando volto, ela está me encarando novamente como se descobrisse algo. 

—Eu não vou mais me entristecer, Michael. Eu juro. Não quero mais aquela vida. Se depender de mim tudo vai mudar. —maneio a cabeça. Se for verdade é um alívio para mim. —Por isso me convido pra passar a noite em seu apartamento. Não sei, assistir um filme, comer uma pizza. Juro que não vou me apossar da sua cama de novo. Quando ficar tarde eu vou embora. —Sorrio gostando da ideia. 

Passei a me acostumar com a presença de Ella, vê-la todos os dias faz parte do meu dia. 

—Acho que sentiria falta se não encontrar o meu apartamento atribulado como esteve por esses dias. —Ela gargalha, me dando um leve tapa no braço. 

***

Nunca compartilhei tantas risadas quanto naquela noite. Ella e eu pedimos uma pizza e assistíamos ao filme: Airplane ( Apertem os cintos, o piloto sumiu) Leslie Nielsen é um comediante formidável, eu não consigo parar de rir. 

—Esse boneco inflável é incrível, tão fofo! —comenta Ella que mal consegue falar de tanto rir. 

—Tenta colocá-lo para pilotar um avião se vai acha-lo fofo ainda. —Ela me olha com uma cara engraçadíssima de medo e começamos a rir tudo de novo. 

Está descontraída, leve, parecia em paz. Estou tão orgulhoso que invés de sorrir pelo filme, eu sorria de satisfação. 

Perdi completamente quem sou. Não consigo entender o que sinto por dentro. Era um misto de sensações e, posso dizer que não era ruim, muito pelo contrário. Estar com Ella é como redescobrir a vida como um todo. Era a minha chance de ensinar e ser ensinado, era uma troca justa e bem vinda. 

—Adoro filmes de comédia. Rir é tudo que eu precisava nesse momento. —Comentou ela mordendo um pedaço de pizza portuguesa. 








A TV já está desligada e no som uma música suave toca, era um instrumental, um do maiores pianistas nos Estados Unidos, Ray Charles com Let it be. Eu adoro Jazz, Blues e qualquer clássico da black music americana. 

—Sorrir é bom para qualquer pessoa, melhor ainda para aqueles que sofrem. —maneia a cabeça concordando. Vejo seu olhar triste de novo, mas logo muda de assunto. Talvez se permitindo não se entristecer hoje.

—Gosta de Jazz? —Observa o mestre soando pelas caixas de som e eu afirmo orgulhoso.

—Fez parte da minha infância. Minha mãe ouvia todos os dias enquanto arrumava a casa. Traz uma nostalgia impar, gosto de nostalgias ainda mais quando se tem o que se lembrar. 

—Você fala de sua mãe com muito carinho. Dá pra ver o quanto você a amou. —Sorrio feliz. Suspiro também ao lembrar o quanto ela me faz falta.

—Foi a minha heroína. Se sou essa pessoa que me tornei hoje, ela é a responsável. É por isso que tento me apegar à coisas que ouvia na infância. Sinto mais próximo dela. 

—Também toco piano. É uma das minhas habilidades que mais me orgulho. —A encaro surpreso. Também bastante curioso para ouvi-la tocar. Deveria ser divino observá-la dedilhando as teclas do piano e um som puro e relaxante soar em forma de som. 

—Uau! Deve ser uma das tarefas mais difíceis. Já acho complicado tocar violão quem dirá piano. Mas é sem dúvida um instrumento sofisticado, e muito belo. —Ela concorda balançando a cabeça.

—Não sei por que aprendi, talvez seja porque era o meu único companheiro na infância. Quando você não tem nada, acaba se agarrando ao que vier pelo caminho, e o piano estava bem ali as segundas e quartas no pequeno conservatório do internato. 

Perceber o quanto a infância de Ella poderia ter sido tão ruim eu sentia uma tristeza dentro do peito. Não consigo imaginar uma criança com tudo para ser feliz, no entanto só sobraram as a angustias. Acabava de perder a mãe e consequentemente sua vida. 

—Eu sinto muito, Ella. —Ela dar de ombros. Não quero entrar no assunto que mais a magoa. Não quero perder aquele momento tranquilo falando de dor, mas eu não consigo ser indiferente com sua história de vida. 

—Não sinta, já foi. Mas as marcas ainda ficam, não é mesmo? Os pesadelos são terríveis e o medo... —Seguro em sua mão com força, levo-a até o meu peito e acaricio o dorso com as pontas dos dedos. 

Sua mão está quente, muito quente e um pouco trêmula. 

—Eu vi o quão medo você sente, presenciei um de seus pesadelos. Deve ser desesperador se acontecer com frequência. —Ella bufa.

—Você nem imagina. É como reviver aquele momento várias e várias vezes. —Estou curioso, mas não quero ser invasivo. 

Ella ainda tem medo, disse que se falasse eu nunca mais olharia para a cara dela, como se fosse possível. Eu jamais a abandonaria em momento difícil, nunca faria uma coisas dessas, ainda mais sabendo que sou o único que ela confia. Mas também não quero que se sinta envergonhada, então acho melhor tudo ir no seu próprio tempo. 

—Conheço um grupo de apoio, fui umas vezes com um amigo meu quando ele sofria com vícios. Eu não pude ir a um desses com o meu pai, eu ao menos tive a oportunidade de conversar qualquer coisa com ele, imagina oferecê-lo um grupo de apoio? Foi uma forma que eu encontrei de aprender algo mais sobre vícios e tentar ajudar alguém. 

—Grupos de apoio? Já ouvi falar, mas não sei como funciona. 

—Pessoas se sentam em círculos e então contam suas experiências de vida. Sabe, não serve somente para vícios de drogas ou álcool, as pessoas podem se abrir, desabafar o que está entalado. Uma forma de se sentir mais libertos. 

—Não sei se quero contar a mais ninguém o que aconteceu, Michael. 

—Não precisa dizer se não quiser, apenas ouça as histórias das pessoas e você verá que não é a única que passa por problemas. Talvez até alivia, e um dia vai chegar a hora que você vai conseguir colocar tudo pra fora. 

—Você iria comigo? —Aquela pergunta de reconsideração à minha proposta me alegrou demais. Quem diria eu, poder convencer alguém como Ella a se aliviar. Abro um sorriso amplo.

—Mas é claro! Estarei ao seu lado segurando a sua mão. —Ella retribui o sorriso e é uma sensação maravilhosa. 









Capítulo 10 — Ella Robson — Bônus.







Estar com ele era como estar no paraíso. Eu me redescobri, volto para o meu eu, para casa. Todos os sentimentos bons que guardei por tanto tempo dentro de mim se aflora me permitindo viver novamente, coisa que pensei que fosse impossível.

Vivi tanto tempo com medo, reclusa e assombrada. Com pavor de qualquer barulho de batidas na porta do quarto. Medo da vida, dos seres humanos. Encontrei nas drogas um escape, elas me anestesiavam e me blindavam de todas as lembranças ruins durante oito anos da minha vida, desde os meus doze anos até os vinte, ininterruptas vezes. 

Não lembro de ter dado um sorriso na minha infância; pular corda, brincar de bonecas. Era uma diversão além das minhas possibilidades, era tão impossível quanto atravessar um mar sob os próprios pés. Olhar-me no espelho sempre fora uma tarefa complicada, meu reflexo transmitia a mim a dor que me assolava por dentro. Um sofrimento contínuo sem chance alguma de recuperação. 

O meu maior pesadelo eram à noite, sempre às 22:00hrs. Me lembro de estar na minha cama, no dormitório, olhando assustada para os lados, um arrepio constante perpassando pelo corpo, uma vontade de morrer, todas às vezes, que ouvia o ressoar dos saltos brancos de Madre Bianca, atravessando os corredores até o meu quarto, apenas para me buscar. Eu não entendia direito o porquê eu, mas era como uma penitência, como uma criminosa de um crime hediondo pagando suas dívidas à sociedade sem ao menos saber o porquê. 

Mas aqueles dias tenebrosos havia acabado, porém deixou sequelas aos quais se não fosse por Michael, eu tenho certeza que me afundaria de vez. Ele se tornara a minha droga, a minha maconha injetada no sangue para prolongar ainda mais o efeito da adrenalina. Meus sorrisos voltam e a dor de antes se torna alívio. Devo muito a ele, e tenho a absoluta certeza que jamais quero me afastar desta tábua de salvação ao qual me agarrei à mãos de ferro, senão eu estaria perdida. 

Ir para casa naquela noite foi estranhamente difícil para mim. Depois de assistir a um filme maravilhoso, ao qual tirei boas gargalhadas, comer pizza e sem dúvida ser agraciada com a melhor companhia de todas, é como ir do céu ao inferno. Mas preciso voltar à realidade, eu já fui peso o suficiente para ele. 

A casa de meu pai também tinha a figura perfeita dos meus pavores. Fora lá que minha mãe morreu, foi de lá que fui duramente forçada para aquele abatedouro sem ter direito de protestar. Sei muito bem que meu pai não tem culpa do que houve, ele ao menos sabe o que se passava comigo. Reconheço quando Michael diz que ele queria o melhor para mim, mas definitivamente não fora o melhor, muito pelo contrário. Vi a morte várias vezes em minha frente, mas por alguma razão não me capturou, talvez se fizesse seria bem mais fácil. 

Caminho na ponta dos pés ao entrar em casa. Não quero me deparar com Robert Robson, mais conhecido como meu pai, me pegando chegando àquelas horas. Ele me faria inúmeras perguntas querendo saber se estava na casa de Michael, ou se finalmente me acertaria afetivamente com ele. Essa obsessão de meu pai querer que Michael e eu ficássemos juntos é no mínimo ridículo, mas pensando bem, não é tão loucura assim. Bom, ele é homem e eu sou mulher. É lindo, não posso negar. Céus, o que estou pensando? Michael é só uma espécie de anjo que está disposto a fazer o que ninguém mais pôde a minha vida inteira. Sim, tenho motivos de sobra para cair aos seus pés, porém não quero estragar nada do que ainda me resta, ou me tornaria definitivamente um dedo pobre, tudo que toco vira lixo. 

Entro no meu quarto tirando as sandálias que apertavam os calcanhares. Dirijo-me até o banheiro, mas no caminho me deparo com o espelho. Meu reflexo se encontra intacto, estou saudável e corada, bem diferente da imagem cadavérica que sustentei por alguns anos. Sorrio ao lembrar da conversa que tive com Michael. O seu cheiro também vem à mente, é baunilha misturado com loção pós-barba e o cheiro natural de homem que emanava pela atmosfera, causando sensações inimagináveis dentro de mim. Somos tão diferentes! Temos uma vida e uma criação completamente oposta um do outro, porém nos completamos. Ele sempre tem algo para me ensinar e eu como uma boa aluna, sempre presto atenção nas lições do mestre. 

Me sinto bem, não tenho vontade de cheirar, estou entorpecida de sensações. A adrenalina me invade e meu ventre se agita em frios e anseios todas às vezes que o sorriso maravilhoso dele, vem à memória. Estranho, não? Prefiro dizer que é prazeroso.

Tomo um banho rápido e já estou na cama usando minha camisola de cetim branca. E com os pensamentos em Michael, adormeço.
***

Meus pés estão amarrados com cordas grossas que apertam os meus tornozelos de uma forma horrível. Meu coração está tão acelerado que parece que sairá pela boca. Minha garganta está seca. Os punhos amarrados da mesma forma que os pés, estão esticados e cada vez mais sendo puxados como se eu faço um elástico. Não consigo me mover, estou encurralada como uma ovelha a espera do abate. 

Quero gritar, preciso que alguém me salve, mas sei que é inútil. Não há ninguém ali, a não ser Madre Bianca bem na minha frente com aquele sorriso amplo e um chicote nas mãos. Ela está feliz por eu estar nesta situação, é como uma vitória pessoal. 

Me debato, mas sei que não vou escapar. Meu corpo inteiro dói, estou com sede, não há água, comida e muito menos clemência. O grande relógio diante de mim badalam exatas 22:00hrs. A hora do pesadelo. 

Há cruzes por todo lado. A imagem de Jesus sangrando causa-me pavor invés de trazer a paz. Parece tão doloroso estar pregado naquela cruz, tanto quanto era doloroso estar presa em uma maca de aço esperando o sacrifício. Não via a hora de o terceiro dia chegar e eu ressuscitar. Mas sei que esse dia não chegaria. 

Escorria suor da minha testa, minhas lágrimas derramavam em torrentes. Súplicas, lamúrias e queixume não estavam me salvando. Eu sucumbiria. As risadas preenchiam meus ouvidos dando-me uma sensação de terror. Aqueles dentes amarelados, uma verruga ao lado de nariz. Uma imagem perfeita de uma bruxa cruel e insana. Nem os trajes de uma freira comportada me emitiam tranquilidade, muito pelo contrário. 

Estou sozinha, completamente a mercê de seus caprichos, mas eu sei que desta vez não iria me açoitar. Iria fazer outra coisa ainda pior. Eu sei, Karoline me disse o que acontece quando eu estivesse amarradas por cordas, deitada em uma maca de aço. Um ritual! Choro compulsivamente quando sinto as mãos nojentas de Madre Bianca acariciar as minhas coxas, subindo cada vez mais. É asqueroso, sujo e nojento. Preciso sair desta situação, preciso sair correndo, No entanto, sou obrigada a enfrentar. 

—Não! —Grito longamente, mas não há quem me socorresse. 


Acordo atordoada, ofegante, suor por todo o meu corpo. Olho ao meu redor, não há Madre Bianca, nem cruzes, Imagem de Jesus e tampouco aquele relógio medonho. Meus pés estão livres apesar de ainda sentir a dor e o aperto. Estou em casa, no meu quarto. É somente um pesadelo. 

Minha garganta ainda está seca, ainda estou aturdida. Levanto-me da cama, pego a jarra de água despejando o líquido no copo. Começo a beber com desespero. Aqueles pesadelos me matavam, era como reviver consecutivamente aquele horror em que vivi. O medo me assola como uma alma penada me observando. Pelo menos não é real.

Custo a dormir de novo, mas Michael está lá para me acalmar de novo. Lembro-me que ele sugeriu um grupo de apoio, para que eu pudesse desabafar e liberar os demônios dentro de mim. Fico indecisa, se Michael souber o que acontecia comigo naquela sala, talvez sentiria nojo de mim e me afastaria de vez, porém se eu tiver de colocar para fora, com certeza ele seria o meu ouvinte. Não consigo confiar em mais ninguém que não fosse aquele homem. Durmo de novo com a imagem de seu sorriso no rosto. 
***



Já é dia, sinto o sol esquentar a minha pele por debaixo do lençol. Havia esquecido as cortinas abertas para que a lua pudesse iluminar o meu quarto, mas nem lembrei que o sol poderia perturbar os meus "mais meia horinhas". Coço os olhos, me espreguiço. Levanto-me ficando sentada na beira da cama, bocejo e depois caminho trôpega para o banheiro. 

Olho minha imagem ao espelho, estou com olheiras, cara amassada e vermelha. Nem falo nada sobre o meu cabelo, todo desgrenhado. Mas ainda sinto uma sensação de paz mesmo sabendo que o meu pesadelo veio para me perturbar novamente. Não sinto medo, mas força. Uma vontade inimaginável de me sentir livre, de recuperar tudo que um dia eu perdi. 

A mesa do café da manhã já está posta e meu pai já está sentado em uma postura elegante; uma perna em cima da outra, com o jornal em mãos. Já está pronto para o trabalho, terno completo na cor cinza claro. Seus cabelos impecáveis e sua barba bem feita. 

Olho para ele e percebo o que fez minha mãe se apaixonar pelo meu pai. Para um homem de quase cinquenta anos ele ainda está em forma. Bem apessoado e suas horas de malhação na academia que mantemos em casa, ajudava com o biótipo escultural que sempre prezou. O encaro e tento buscar outros adjetivos para listar, mas vejo que só a aparência o salva. Papai sempre fora um pai ausente, um marido mais ausente ainda. Não me lembro de vê-lo dar um beijo em minha mãe, ou de dizer "eu te amo". É frio quando o assunto envolve os sentimentos íntimos, mas eu não o julgo, deve ser complicado para um homem como ele, um homem que tem que, quase sempre, agir mais com a cabeça do que com o coração. Sempre trabalhou com mãos de ferro para construir o seu império, tenho certeza que teve de abrir mão de muitas coisas. O admiro como pessoa. Talvez como pai eu nem ao menos conheço, nem sei por onde começar. 

—Bom dia, Ella. —Seu cumprimento matinal não é animador como de costume. Está me olhando sério como se quisesse me dar uma bronca. Me tremo toda, não gosto de levar broncas. —Chegou tarde ontem à noite. Eu ouvi a porta sendo destrancada. 

Sério que ouviu? Que tipo de super audição Robert Robson tem? 

—Passa a maior parte do tempo fora, e quando está nem ao menos conversamos. —Dou um riso irônico interno. 

Agora ele quer bancar o pai? Está preocupado em conversas ou em saber que horas eu cheguei? Entendo suas vontades, porém não as suas exigências. 

—Eu estava com o Michael. Assistíamos a um filme juntos e comemos pizza. —Só foi eu tocar no nome de quem ele idolatra que sua expressão muda. Sua sobrancelha antes erguida se atenua e o sorriso brota em seus lábios. Impressionante! 

—Oh! Com o Michael, é? 

—Sim, passamos muito tempo juntos. —Uso nossa amizade para me safar de algumas outras escapadas que andei dando ultimamente. 

—Ótimo! Isso é maravilhoso. Michael é um cara incrível. Vai te colocar juízo. Ele viveu sozinho por muitos anos, teve que enfrentar tantas dificuldades — mesmo sendo tão jovem. Ele vai te ensinar os perigos da vida e ajudá-la a enfrentar as dificuldades. —Disso eu já sabia, mas o que mais me irrita é ver meu pai jogando no colo de Michael o que ele deveria fazer. 

—Michael não é o meu pai. Ele só é uma pessoa ao qual você o incumbiu de me criar, como se fizesse o papel de pai. Acontece que essa não é a obrigação dele. 

—Claro que não, mas pode ser outra coisa. —Seu olhar sugestivo comprova o seu desejo, ao qual até hoje não entendi. —Sabe, ele me enfrentou. Disse coisas ao qual eu tenho noção, mas que infelizmente não posso mais mudar. —Fico curiosa para saber que coisas foram estas. —Só que eu não consigo, Ella. Existem coisas na vida que você não pode simplesmente mudar, ou concertar. As coisas são como são e não há nada que eu possa fazer. Mas ele pode. Michael é jovem, boa pinta e eu sei que se preocupa com você, deu pra perceber isso ontem. Não consigo encontrar ninguém melhor. 

Cruzo meus braços em cima do peito e o encaro, um tanto desafiadora. 

—Por que quer tanto que Michael e eu ficamos juntos? Há um proposito? 

Michael me faz bem, tem as qualidades que meu pai citou, e me sinto livre com ele. Não seria nada difícil me apaixonar, levar esse relacionamento para algo mais forte e mais concreto. Mas essa inquietude que papai demonstra de me ver ao lado dele, é difícil de compreender. 

—Como eu disse, Michael é um cara de caráter, tem boa índole e se preocupa com você. Não vejo ninguém melhor para ser o meu genro. —Aquele discurso não me convence. Se fosse somente isso, as coisas aconteceriam normalmente sem pressão, e é isso que papai faz, me pressiona. A resposta vem a seguir: —Estou ficando velho, Ella, não me sobrou mais nada dos Robsons na minha família. Preciso de netos para levar o meu nome adiante, ou tudo que construir morre junto comigo. 

Sinto meu coração falhar uma batida quando me dou conta do seu real interesse. Me sinto uma mercadoria, uma de suas negociações para manter o seus negócios funcionando. Faz todo o sentido agora e eu estou tão magoada que tenho vontade de morrer. Ele não se importa comigo, mas com ele mesmo. Um nó se forma na minha garganta e eu sinto vontade de chorar, mas não faço. 

—Pode deixar, papai. O seu império não irá se perder. —Minha voz está carregada de ironias e decepções. —A final, você se importa com ele o suficiente para não deixá-lo ir água abaixo. E tem conseguido, fez um ótimo trabalho enquanto eu continuava naquele inferno sem saber se um dia eu sairia ou não. —Me levanto da mesa sem apetite alguma de tomar café da manhã. —Mas não se preocupe, o seu verdadeiro filho, que é a empresa, não perecerá. 

—Ella, não foi isso que eu disse. —Jogo o guardanapo na mesa e me retiro da sala. —Ella, volta aqui! —Ouço me chamar, mas não dou ouvidos. Estou chateada demais para voltar, magoada e com o meu emocional destruído. 

Essa noite eu não volto para casa. 





Capítulo 11 — Ella Robson — Bônus II



Caminho pelas ruas sem saber direito para onde ir. Iria para a casa de Michael, mas sei que à esta hora está no trabalho. E mesmo que estivesse, talvez não tenho mais coragem de despejar os meus problemas em seu colo de novo. Já não bastasse meu pai e eu, quase sempre. 

Acho que ele deve pensar quanto nossa família lhe causou turbulências desde quando aparecemos em sua vida, e de verdade, me sinto envergonhada. Ele não merece toda essa vida de merda que tenho passado. Um pai que o pressiona para se casar com uma mulher que ele nem conhece, e uma mulher com um passado sombrio em suas costas. Não é assim que eu gostaria de tê-lo conhecido. Michael é legal demais para passar por isso. 

Porém minhas tentativas de não procurá-lo para chateá-lo ainda mais, foram por terra quando o vejo correndo em minha direção. Está fazendo uma corrida matinal, usa uma calça de moletom e uma regata branca. Não corria depressa, é só para manter o exercício. É incrível como meus problemas desaparecem quando eu o vejo. Um sorriso de canto brota nos meus lábios e meu coração se agita sem que eu ao menos fizesse algum esforço para isto. 

Michael é a minha força, o meu colete salva-vidas que eu apoio sempre que as ondas agitadas do mar da minha vida vinham debater contra mim. O meu porto seguro, que enche o meu coração de euforia no exato momento que os meus olhos o encaram. 

Ele me nota, diminuiu a corrida e vem até mim. Sua testa está coberta por suor, sua camisa branca molhada está transparente. Fico fascinada, contemplando de camarote seus belos músculos! 

—Ella, você por aqui? —Abro meu sorriso sapeca diante da sua pergunta divertida. 

—Sempre nos encontramos no momento em que eu mais preciso, não é? É impressionante. —Retiro uma camada de suor da sua testa com a mão e ele dá uma risada por conta do que eu disse. Sorriso lindo, que atenuava toda a turbulência interior. 

—Esse sou eu. Alguém solicita a minha presença eu apareço como um raio. Acho que sou o flash. —Sua expressão divertida de dúvida me faz rir. —Foi o flash que descrevi, não foi? —Assinto ainda sorrindo. 

Mal consigo me lembrar da raiva que estava sentindo do meu pai. Mal consigo lembrar de qualquer coisa ruim que vivi depois que cruzei a porta do apartamento de Michael para ir para casa ontem à noite. 

—Mas o que houve? Aconteceu alguma coisa? —Bufo exaurida de tudo aquilo. 

—É só que as coisas parecem mudar sempre que estou longe de você. E depois volta tudo ao normal — do jeito que eu quero que esteja— quando estou ao seu lado. —Me olha surpreso, mas pelo sorriso gosta do que eu digo. 

—Vamos até em casa, assim conversaremos melhor. —Anjo Michael, o meu anjo. Sempre disposto, a fim de estar ao meu lado no momento em que mais preciso. 

—Não quero te sobrecarregar, sei que precisa ir para o trabalho. 

—Tenho alguns minutos, vamos nessa. —Sua mão forte e firme toca o meu braço guiando-me como se fizesse questão que eu fosse. Me arrepio com o toque, mas permaneço como se não me abalasse.

A visão do apartamento meio bagunçado, tanto conhecido por mim, aparece diante dos meus olhos. O cheiro dele está impregnado por todo canto. O cheiro que eu também reconheço. Fecha a porta e me convida para sentar. 

O suor do seu corpo seca, mais o cheiro do seu perfume aflora. Ele senta ao meu lado esperando que eu comece a falar. 

—Soube que foi duro com o meu pai ontem. —Começo o assunto por aí. —Parece que tocou na ferida dele. Valeu por tentar. 

—Não foi nada. Ele tinha que saber o que eu penso, e abrir os olhos para o que está fazendo. —Suspiro sabendo que não foi isso que aconteceu. 

—Como era o seu pai? Como ele foi com você além de ser péssimo e beber? —Michael pensa, buscando lá no fundo o que poderia me dizer. Percebo que é algo bem complicado.

—Eu não sei dizer. Eu não o conhecia, não convivi direito. Tudo o que sei é que passava dias e dias fora, e quando chegava brigava com a minha mãe por estar bêbado. Não tenho nenhuma lembrança boa dele. 

Me ajeito no sofá encostando as costas no encosto e relaxo. Encaro o nada e começo a pensar de que nós dois não somos tão diferentes assim. 

—A única coisa boa que me lembro do meu pai é quando o motorista me deixou na porta do internato e ele me disse uma frase que me marcou muito: " Se cuida, Ella. Lembre-se de que você é forte e logo tudo isso vai passar. Um dia estaremos juntos e sempre que precisar eu estarei lá para apoiá-la" Essa frase me encheu de esperança na época, eu me agarrava a isso todos os dias, mas percebi que foram mentiras. Ele não se preocupa comigo. 

Encaro os olhos negros de Michael que me retribui. Estamos nostálgicos e o clima é de pesar. Mas não demonstrávamos tristeza, não, muito pelo contrário. 

—Sabe? — Michael tem um tom analítico e logo presto atenção no que ele tem a dizer. —A vida é complicada demais. Quem deveria nos amar não nos ama o suficiente, ou não sabem demonstrar como gostaríamos. Buscamos sempre o que nos satisfaz de um jeito ou de outro, mas continuo não pensando que Sr. Robson não se preocupa com você. Ele só não sabe como fazer. —Assinto concordando em partes, mas também não opto. Prefiro mudar de assunto.

—Acho que a vida nos prega peça. Querendo ou não acabamos desejando o que nunca vamos ter. Nossa ganância pessoal nos faz sonhar sim, mas também nos derruba na mesma proporção. —Ele me olha com um vinco perfeito na testa de dúvidas. 

—Ainda estamos falando do seu pai? —Começo a gargalhar e ele me acompanha. 

Pra falar a verdade nem eu mais sei do que estávamos falando. Acho que comecei a pensar em Michael naquele meio tempo, quando cita que quem deveria nos amar não nos ama o suficiente. Penso que nunca tive um amor para dizer que me ama, nunca tive nenhum afeto que fosse além da minha mãe. Só que este já faz tanto tempo que nem lembro mais como se sente.

—Já amou alguém o suficiente? Sem ser alguém da família, alguém... sabe... uma mulher? 

—Já gostei de alguém. Já senti afeto por alguém, mas amor não. Essa coisa de sentir algo bom dentro do peito, de sorrir pelos cantos ao pensar em alguém, nunca senti antes, até agora. — O encaro e percebo que estou mais trêmula do que o normal, sinto minha garganta secar e meus batimentos se alterando quando seus olhos me encaram insinuantes. 

Pensar em Michael como outra coisa que não fosse só amizade causa-me um medo terrível. Não sei o que ele pensa, não sei o que esperar de tudo isso. Talvez apenas queira me ajudar e até mesmo cumprir um pedido do meu pai por este motivo continua ao meu lado. Não sei se posso sentir outra coisa por ele sem pensar em me magoar, em ter mais uma vez alguém que eu gosto indo embora. Mas aquele olhar dizia tudo, era como desvendá-lo e descobrir o seu interior. Michael gosta de mim, pode até não ser como desejo, mas ele gosta sim. Seu carinho, seu cuidado, sempre me diz que ele gosta. Mas não sei se é amor, ou atração, ou qualquer outra coisa que nos permite beijar e abraçar. Também não sei direito o que passa no meu coração. Não tenho certeza se são somente meus sentimentos me confundindo só porque nunca ninguém demostrou afeto do mesmo jeito que Michael demonstra. 

De repente sinto uma necessidade de abraçá-lo, seus lábios parecem tão atraentes agora, seu corpo ainda mais apetitoso que o normal. Meu coração retumba no peito e tudo que eu quero é tê-lo comigo, em minha vida por um longo prazo de tempo. Preciso que Michael retire de mim toda a rapina tempestuosa que sempre assolou a minha vida, e sei que somente o seu carinho seria capaz de fazê-lo. 

Estou olhando para ele com admiração e amor. Minha necessidade aumenta, nem sei quem sou, acho que sou feita de sentimentos e desejos agora. Talvez receios, mas medo não. Perco meu medo e sou envolvida por uma coragem impar que me domina a me impulsa.

Sinto sua mão migrarem para o meu rosto, seus dedos masculinos me tocam a pele, fazendo os meus olhos fecharem para absolver a sensação que aumenta e estende. Torno a olhá-lo, ele está se aproximando, seus olhos estão quase dentro de mim. Umedece seus lábios e meu ventre pulsa, junto com uma parte bem íntima minha. Não sei o que é isso, nunca senti tal coisa por ninguém. Seu rosto acaricia o meu bem lentamente, e a barba áspera me estremece. Eu o quero tanto! A tensão é tão forte que começo a suar. 

—Ella... —Michael sussurra rente a minha boca. Eu preciso senti-lo. 

—Michael. 

Suas mãos descem para a minha cintura e aperta, minha excitação aumenta e já me vejo abraçando-o com toda força, como se não quisesse mais soltá-lo. Nossos rostos próximos flertam entre si, e vez ou outra nossos lábios se tocam, sem se tocar. Era uma dança envolvente, sentimentos crescendo, até a hora que seus dentes capturam o meu lábio inferir. Me perco por um instante, estou fora de mim. Suas mordiscadas me excitam ainda mais, estou pegando fogo, a ponto de explodir. Agarro sua nuca, e nossas testas se encostam. Nossa respiração está alterada. É somente o que dá para ser ouvida. Michael abocanha minha boca bem de leve e solta, aumentando a minha vontade, mas logo repete o processo; uma, duas vezes. Não quero que solta mais, quero sentir seu gosto, por isso, quando me abocanha eu o prendo e não o deixo ir. Pressiono meus lábios nos seus com força, sua boca se abre e eu enfio a minha língua, já em busca da sua. É tão macia, tão gostosa! Nossa cabeça vai de um lado para o outro enquanto o beijo se intensifica. Chupo sua boca, experimento sua língua. Estou no céu! 

Michael geme quando meu corpo está sobre o dele, no momento em que me sento em seu colo de pernas abertas. Suas mãos me amparam, e sou tocada, apertada à medida que comíamos a boca um do outro, porque era exatamente o que fazemos, sem medo algum, sem reservas. Nos entregávamos como loucos. 

Meu peito cola em seu peitoral duro e sinto seus batimentos cardíacos bem alterados. Me encho de alegria ao perceber que o que sente, é o mesmo que eu. Minha perna roça em algo duro e percebo que Michael está excitado, sorrio sem fazer barulho em sua boca, ao notar. Eu também estou excitada, também o quero assim, coisa que jamais quis com ninguém devido aos meus temores pessoais. Mas sei que com ele é diferente, sei que seria uma libertação. 

Sua boca me larga, mas migra para o meu pescoço, seus quadris começam a se mover de encontro a mim, e eu sinto-o ainda mais duro. Seus gemidos aumenta, e o meu também. Sua mão entra para dentro da minha blusa e a outra dentro dos meus cabelos. Estamos chacoalhando nossos corpos em uma transa invisível e eu sabia que só aumentaria. Perco o fôlego, estou no meu limite, me sinto molhada e apaixonada. 

—Michael... —Clamo por ele e recebo uma mordida no meu pescoço. Junto com uma lambida sensual.

Capturo sua boca de novo, e nossa pegação começa com ainda mais fulgor. Estou exausta, mas muito afim. 

As imagens daquele dia voltam à tona como pesadelo cruel, cada detalhe, cada momento. Começo a sentir dor. Estou dolorida entre as minhas pernas e não quero que Michael saiba o que aconteceu. Começo a tremer, mas dessa vez de medo, que ele soubesse. Me afasto, mas ele, dominado pelo desejo, não me deixa escapar, sinto medo de novo e o afasto com força.

—Por favor, não! —Nos separamos e tudo que sinto é um vazio assombroso, uma sensação de perda. 

—O que houve? 

Os lábios dele estão trêmulos e vermelhos, sinais de que estávamos nos pegando há pouco. 

—Vamos com calma, tudo bem? 

Eu não quero avançar agora, mas também não quero que tudo se destruísse de vez por culpa da minha recusa. Acho que dá certo, pois Michael concorda com a cabeça com um sorriso tranquilizador no rosto.




Capítulo 12







Monto na minha bicicleta, é assim que decido ir ao trabalho hoje. Não quero gastar com taxas de táxis e nem ir a pé percorrendo quase quatro quarteirões. Seria cansativo demais, sem contar que chegaria todo suado e amarrotado. 

Nos ouvidos fones de ouvido que toca Cain and Abel de Josh Kelly enquanto percorro pelas ruas transitadas de San Diego. Era tanto congestionamento que dou graças a Deus por não estar preso dentro de um carro. Estou bastante atrasado e não poderia gastar mais tempo. 

A música é tão suave e relaxante, que nem me dou conta que estou pilotando uma bicicleta. Mas acho que só foi possível me desconectar pela lembrança do beijo que Ella e eu compartilhamos. Aquilo mexeu comigo, com os meus instintos. Fora o melhor beijo que partilhei, as sensações, o desejo se aumentou junto com os ritmos. Me pego pensando se o que estou começando a sentir por Ella pioraria. Aqueles lábios febris ainda estão me queimando, o aroma suave da sua pele em ebulição está impregnado no meu corpo. Sorrio bobo ao lembrar-se dos gemidos que dou quando a coisa começou a esquentar para valer. Foi difícil resistir, foi intenso e forte além do meu controle. O sabor de fruta fresca de sua boca deixou-me inquieto. Se Ella não tivesse feito nada para me impedir, com certeza eu avançaria fácil, fácil. 

Dou sinal ao motorista na via para pedir minha passagem pela rua, na faixa de pedestre. Recebo um sinal positivo e atravesso. Gesticulo um "obrigado" do outro lado da pista e continuo o meu percurso.

Mal consigo acreditar que o maior desejo de Robert Robson havia se cumprido. Dou uma risada sozinho, tentando imaginar como seria a cara dele ao ver aquele beijo. Não sei, talvez uma empolgação sem limites. Espanto os pensamentos. Aquele beijo fora único, acho que nunca mais a beijaria de novo, mal sei o que se passa em sua cabeça neste momento. Talvez fora apenas o impulso. Estamos tão próximos agora que é normal confundir os sentimentos. 

O toque de mensagem do meu celular vibra no bolso da calça. Não costumo parar para olhar, mas dessa vez faço. Freio a bike, afasto a bunda do banco sem sair dela, apenas para colocar os pés no chão. Tiro o aparelho do bolso e confiro a mensagem. Só depois percebo que meu sorriso era bobo ao notar que é mensagem de Ella. 

" Sabe de uma coisa? 
Eu quero ir ao grupo de apoio. Vai comigo?"

Abro o sorriso ainda mais largo por saber que Ella finalmente faria isso por ela mesma. Sinto-me orgulhoso por querer tentar, e se livrar, de seja lá o que estivesse enfrentando por dentro. 

Começo a digitar as teclas para lhe enviar uma resposta. 

"Mas é claro! Estarei segurando em suas mãos... com força!"

Logo recebo outra mensagem.

" KKK espero que sim, caso contrário minhas mãos sairá do meu corpo de tanto que vai tremer."

Começo a sorrir diante da tela do celular, acho que meu sorriso é de um bobo completamente encantado. 

"Lhe pego às 19:00, mas de táxi, ainda não tenho carro"

"Pegue-me de camelo, eu não me importo. Só quero ficar perto de você"

Essa frase me abala, confesso. Meu sorriso bobo de antes se transforma em um sorriso terno, meu peito dói pelo bombeio abrupto que sinto. Não é possível! Ofego ao cair a ficha do que estou sentindo.

***


Quando chego na casa de Ella por volta das 19:00hrs quem me recebe é Robson, ele me encara de um modo bastante inconveniente. Faz algumas recomendações, mas vejo que está satisfeito com o nosso encontro — que para ele, para todos os efeitos, é um encontro. Me deparo em uma moda antiga, onde os caras iam pedir permissão para os pais, porém não foi exatamente isto. Não estou pedindo nada, estou recebendo incentivo para fazer. Pelo visto, sou muito querido pelo Robson. 

Ella aparece linda logo após, está com um vestido aveludado na cor anil que contrasta bem com a cor muito branca de sua pele. Os cabelos estão soltos, porém as pontas bem mais onduladas, a maquiagem é como uma pintura em uma tela de um artista. Está maravilhosa! Percorro meus olhos por todo seu corpo, e esqueço por um momento que estão me observando, tamanho é a minha admiração. 

—Está... pronta? —Pergunto meio atrapalhado e logo percebo um sorriso de canto em Robson. Ella assente. —Então vamos, o táxi nos espera.

—Táxi? —Pergunta Robson incrédulo. —Não, não, tenho muitos carros, você pode usar qualquer um. —Surpreendo-me com a oferta, porém acho maravilhoso. 

—Senhor Robson, não precisa se incomodar. 

—Não é incômodo nenhum, Jackson. É só escolher um. Já tem sua carteira, não é? 

—Sim eu tenho, mas não a trouxe. 

—Ah, isso não importa. — Dá um tapa no ar sem se preocupar. —Pegue um ao seu gosto. Passeiam, se divirtam. Irão ao cinema, não é? —Olho para Ella com olhar de cumplicidade, sabendo que não iríamos ir ao cinema, pelo menos não foi o que combinei, mas de qualquer forma, depois da reunião eu a levaria em um Drive In da cidade. 

—Sim, claro.

—Pois então. Quero o melhor para os dois. —Seu sorriso é apaziguador, me sinto satisfeito. 

Seria tão bom se houvesse mais pessoas como Sr. Robson por aí. Ás vezes pego pensando que tirei, de certa forma, a sorte grande. Não pelos carrões que me disponibilizou, mas por eu ter sido tão bem valorizado naquela família como um todo. Coisas ruins acontecem com pessoas boas? Penso que não. Coisas boas acontecem com pessoas boas, às que lutam, enfrentam as dificuldades, pois lá na frente colherá o seu fruto. Porque é nas lutas e no sofrimento que nosso caráter é moldado e então descobrimos quem são os verdadeiros conquistadores. 

Como fora me permitido, escolho um Mustang preto. É o único menos "chamativo" que meu chefe coleciona em uma de suas garagens. Pois sim, porque são no mínimo umas três. Não sei dirigir essa coisa direito, mas eu pegaria o jeito. 

Por dentro era uma belezura, painéis de última geração, câmbio automático, e com uma potência inigualável. Fico tão fascinado que me pergunto, por um instante, qual era o meu destino. 

Ella sobe no banco de carona e percorremos à cidade juntos. Me surpreendo com o ronco do motor. 

Confesso que foi ruim ver que Ella está quieta demais, mal me olha e mal fala nada. Penso que é por conta do beijo que demos ontem, mas seria muito prepotência pensar assim. Deva ser pela apreensão sobre o grupo de apoio e percebo pelo o olhar dela e sua respiração ofegante. Tiro uma mão do volante e seguro a sua com força. Ela treme, mas logo sorrir para mim.

—Eu disse que seguraria o tempo todo. —Recebo um beijo na bochecha inesperadamente. A sua cabeça encosta no meu ombro, dando a entender que a acalmei um pouco. 

Estaciono em frente ao prédio, continuo segurando na mão de Ella quando caminhamos para a entrada. Um letreiro com o nome do lugar, indica que estamos no lugar certo. 

Percebi os passos de Ella travar e sua caminhada ficar um pouco trôpega. Compreendo que está assustada, não sabe o que irá enfrentar, mas a guio com cuidado, demonstrando a todo o momento que está segura ao meu lado. Sem pressioná-la e sem insistência. Qualquer hora que quisesse ir embora eu iria com ela. 

—Fica calma, vai dar tudo certo. —Respira fundo, concorda com a cabeça e continua andando. 

Logo chegamos a um hall cuja luzes estão acesas. Entramos em uma sala. Lá haviam algumas pessoas sentadas em círculos como no previsto. Ella paralisa! Aperto ainda mais sua mão, emitindo palavras de força que a fazem caminhar de novo. Respira fundo, parece que está sem ar, a situação a sufoca, mas seu esforço permite com que se senta em uma das cadeiras. Havia duas, uma do lado da outra, imediatamente as ocupamos. 

—Sejam bem vindos. —A assistente social saúda e eu maneio a cabeça em agradecimento. Ella parece fora de si, olhar perdido ao nada. 

—Está tudo bem? —Pergunto rende ao seu ouvido. Sua cabeça balança freneticamente em positivo. Mas eu sei que nada está bem. —Calma.

Encosta a minha cadeira para mais próximo dela, envolvo meus braços por sua cintura a abraçando. Quero que ela se sinta melhor, confortável durante aquela reunião. 

A assistente social se posiciona dentro do círculo. Está prestes a começar a reunião.

—Como todos vocês sabem, hoje teremos mais um depoimento. Alguém que queira contar a sua experiência de vida. Uma forma de desabafar e até mesmo, assumir que tem um problema. —Ela dá uma pausa percorrendo os olhos para cada um de nós. —Quando o problema é dividido, ele se torna menos árduo, um pouco mais leve. E então, você é capaz de superá-lo, porque as pessoas que estão disposto a ajudá-lo entendem que o apoio e a companhia de que você precisa irá curá-lo completamente. 

Ella olha para mim, com um sorriso no canto dos lábios e eu retribuo. É, parece que ela se sente segura ao meu lado, o meu apoio a deixa forte e posso dizer que era um privilégio entanto. 

—Alguém se candidata a ser o primeiro a contar-nos sua história? —Ela olha para cada um de nós, um a um, para Ella principalmente que se encolhe como uma bichinho medroso. —Ninguém é obrigado a nada, apenas se sentirem vontade em fazer. —Esperamos mais uns minutos. 

Olho para o rapaz ao meu lado, ele está como Ella, amedrontado. Olho para o gordinho a minha frente, está encarando e não parece ter medo, porém não se pronuncia. 

—Eu quero contar! 

Um rapaz moreno e muito magro, levanta-se da cadeira em uma sobressalto. Posiciona dentro do círculo com a promessa de contar sua história de vida. 

Desta vez é Ella que aperta minhas mãos com força, está gelada, e muito trêmula. Percebo o quanto é difícil para ela enfrentar tudo isso, mas fico feliz por ter chegado até aqui, ela foi muito forte e corajosa. Deposito um beijo no dorso de sua mão e lhe lanço um sorriso na esperança de confortá-la. 

—A vida não é fácil, certo? 

Consigo ler daqui o seu crachá, está escrito Shawn nele, Shawn Brown. E pelo seu tom, sei que será uma história bastante conturbada. 

—Sempre fui uma criança perdida no mundo, alguém sem lugar e sem ter para onde ir. Quando meus pais morreram eu havia acabado de fazer meus cinco anos de idade. Não havia família para que eu pudesse ir, nenhuma casa de vizinho, ou quem estivesse disposto a amparar um garoto órfão. Eu estava com medo e sozinho. A rua foi quem me amparou durante todos esses anos, mas também foi quem me mostrou as piores coisas que uma criança pudesse se envolver. Uma criança deveria estudar, ser cuidada e não conhecer certas coisas, mas eu por outro lado, me envolvi com tudo que não presta. Passei fome, e quase tiraram a minha vida. 

Olho para Ella, e a mesma presta atenção em cada detalhe, seus olhos estão fixos no rapaz. Deve estar pensando tanto quanto eu, o quanto a infância de alguém poderia ser ainda pior do que a nossa junto. Eu tinha uma mãe, Ella um pai, mas aquele homem não teve nenhum e nem outro. Posso imaginar o quanto a vida não foi nada fácil para ele. 

—O frio à noite era insuportável, mas não era pior do que a fome. Os abrigos nem sempre amparavam todos, tínhamos que chegar na hora certa para conseguir um quarto. Mas até isso era complicado, porque outras que não conseguiam, chegavam a te ameaçar. Se você não as deixasse passar em sua frente. Eu era um menino sozinho e amedrontado, mas ninguém se importava. Por vezes chorei em meio àquelas ruas sujas onde haviam mais uma dúzia de pessoas no mesmo estado que eu; fedorentas e enroladas por um cobertor imundo. Elas consumiam drogas o dia inteiro, diziam que a adrenalina curava tudo, até mesmo fome e frio, não pensei duas vezes. 
Conheci as drogas aos sete anos, e comprovei seus "dons medicinais", mas quando o efeito acabava, parece que eu sofria tudo de novo e em dobro. Não demorou muito para que eu me tornasse dependente. 
Minha adolescência eu já fazia de tudo; roubava, furtava, e qualquer outro crime que abria o meu caminho para alimentar o meu vício. Me tornei cruel com as pessoas ao meu redor (marginais, assim como eu) por medo. À noite eu mal pregava o olho, e se fizesse acordava imediatamente com a barra de ferro nas mãos tentando me proteger de um eventual ataque. Eles queriam as minhas drogas, queriam o meu cobertor que consegui a muito custo quando algum voluntário levava para nós. Queriam o meu ponto, ou até mesmo matar por diversão. Eu não podia me dar ao luxo de dormir. Sim, era um luxo, nas ruas era sim. 

Desviei meu olhar de Shawn, sua história é pesada demais para que eu pudesse suportar. Lembro dos meus amigos, de Daniel que foi pelo mesmo caminho, mas por escolha própria, não sei como está agora, se ainda vive, ou está morto. Olho para Ella e continua com o olhar fixo para ele, como se não quisesse perder nenhum detalhe. Estou louco para saber o que se passa em sua cabeça. 

—Uma época aos meus dezoito anos, eu já era um homem calejado da vida, havia vivido tudo quanto foi tipo de situação desumana. Passei alguns anos na cadeia, mas não digo que lá foi ruim, mas digo que foi ainda pior. Levei surra todos os dias, o tempo todo um queria me matar sem motivo aparente. Os carcereiros me odiavam porque eu os enfrentava quando pedia mais vigilância. Meu castigo era ficar sem comida, ou preso em uma cela solitária sendo submetido por todos os tipos de tortura. Tanto espancamento, quanto estupro. 

Sinto que Ella aperta a minha mão com força, como um susto, ou um choque. Acaricio o dorso tentando acalmá-la. Para o meu alívio percebo que está respirando com mais calma. 

Eu não quero que ouça essa história, mas seria bom para ela, assim poderia entender que há pessoas que sofrem o dobro, mas eu não posso opinar, não sei ao certo o que ela havia passado.

—Posso dizer que a prisão foi ainda pior que as ruas, pois lá fiquei enclausurado sem ter para onde fugir, o jeito era enfrentar a situação. Ainda me pergunto como ainda estou vivo, acho que alguém lá em cima gosta de mim. Decidi que nunca mais voltaria àquele lugar nunca mais. Tentei ter uma vida digna, comecei a trabalhar em subempregos para que eu pudesse pagar um aluguel e viver dignamente. Mas o vício voltou a passar rasteira em mim. Vendi tudo que consegui para comprar drogas, acabando voltando para as ruas de novo. Mas desta vez foi ainda pior, pois os traficantes iam atrás de mim para cobrar dívidas, mas eu não tinha dinheiro. Ninguém mais quis me dar emprego porque tinham medo de mim. Comecei a roubar de novo. Voltei para cadeia e voltei a passar pelo mesmo terror. Só que desta vez fui parar na UTI por causa de uma faca que atravessou o meu pulmão. 

Ouvi um burburinho de espanto de todos ao redor. Tento entender como aquele cara ainda está vivo. Com certeza Deus o ajudou e muito. 

—Custou muito para que eu me recuperasse totalmente, mas quando aconteceu, levei um tiro no peito que por muito pouco não atingiu nenhum órgão vital. Era a vida me dizendo que, ou eu abandonava essa vida, ou eu morreria sozinho como um indigente. Começo a trabalhar, começo a me livrar todos os vícios, pago as minhas dívidas e torno ter uma vida digna. É onde eu conheço a minha esposa, ela foi a base de tudo para mim, uma figura de família que nunca experimentei na vida. Alguém que pude contar nos piores e melhores momentos. Hoje estou com vinte e seis anos e posso dizer que estou completamente limpo há cinco anos. Tenho uma família maravilhosa e não vivo mais nas ruas, não tenho mais medo, durmo à noite inteira com paz. 

Os aplausos explodem no local, com certeza aquele cara era uma inspiração para todos. Enquanto estou admirando tudo que acabei de ouvir e me sinto orgulhoso pela vida que Shawn conquistou hoje em dia. Ella se levanta e sai pelas portas. Sem pensar, me levanto indo de encontro a ela. Percebo que entrou em uma das portas e quando a alcanço, vejo que entrou na cobertura do prédio, um espaço amplo e aberto. O vento está forte, e era possível contemplar as estrelas. 

—Ella? Está tudo bem? —Ela volta-se para mim, e assente. Está pensativa, um pouco atordoada eu diria. 

—Por favor, Michael, não me deixa sozinha? —As lágrimas começam a escorrer dos seus olhos, e meu coração se afundou ainda mais dentro do peito. Aquele olhar triste e medroso. Eu nunca vi ninguém precisar assim de mim quanto ela. 

Dou dois passos próximo a ela, quero que saiba que eu estaria ali até o fim. 

—Ei! Não vou a lugar algum, Ella. Estou aqui ao seu lado e não vou sair por nada. Nem se eu dependesse disso, mesmo assim que continuarei aqui ao seu lado. Sabe por quê? Porque eu sei que é aqui que eu preciso estar. —Digo com lágrimas nos olhos, algo que meu coração está cheio. Um amor muito grande me invade de repente e a sensação foi excepcional.

Ella se joga em meus braços e eu a amparo com força, buscando protegê-la, confortá-la e principalmente, tentar fazer com que o medo fosse embora de uma vez por todas. 







Capítulo 13



Sinto que Ella está um pouco mais tranquila agora, sua cabeça está encostada no meu ombro e meus braços envolta do seu pescoço. Dirijo com uma mão graças a direção automática do Mustang. Seria maravilhoso se Robson me deixasse pilotar esse brinquedinho mais vezes. 

Pego um caminho diferente e Ella logo percebe. Minha intensão é permanecer mais tempo com ela, por isso quero muito ir ao Drive In assistir um filme, ou apenas admirá-la, enquanto a vejo assistir. 

—Achei que fossemos pra casa. —Dou uma risadinha. 

—Acha mesmo que eu iria mentir para o meu chefe? Vamos sim assistir um filme, mas não em um cinema. Prefiro Drive Ins à cinemas. Sabe? Luz do luar, ar puro, nada de salas com ar artificial, tendo que dividir nosso conforto com outras pessoas que se sentarem próximo. —Eu adoro quando Ella sorrir todas às vezes que falo algo que lhe agrada.

—Você não tem jeito mesmo, não é? Sempre cheio de surpresas. 

—Aposto que vai adorar esta. 

—Não tenho nenhuma dúvida. 

Giro o volante e entramos em uma área reservada a Drive Ins. Além do nosso carro há mais uns quatro em nossa frente. Todos os casais de namorados, dá pra ver de onde estamos. Percebo que o clima é bem propício para isso, mas não me apego muito, afinal, Ella e eu somos só amigos apesar de ter nos beijado uma vez, e eu está querendo repetir a dose de novo. 

Uma grande tela está posicionada em nossa frente, está passando um trailer e sei que faltavam alguns minutos para começar. Mas antes disso, me ofereço para comprar pipocas para nós dois em uma barraquinha logo mais adiante. 

Quando volto Ella praticamente voa no saco de pipocas alegando que está faminta e que pipoca é seu petisco favorito. Não sei, estou bem, me sinto bem, Ella me faz bem. Talvez o mesmo ocorra a ela em relação a mim, talvez o que estou começando a sentir por ela seja o mesmo que está começando a sentir por mim. Não sei, tenho esperanças, não consigo pensar em outra coisa. 

—Adoro esse filme! —Brada Ella empolgada quando descobrimos qual será o filme. Tão empolgada que me assusto, sou arrancado do devaneio abruptamente. 

Olho para a tela e vejo que é um filme bem clássico "E o vento levou" de 1940, é uma história romântica em meio a guerra civil. 

—No internato nunca nos era permitido assistir nenhum tipo de filme, a não ser o nossos dias de "cinema" que eram das 13:00 às 15:00 da tarde, mas os filmes que as freiras passavam eram muito chatos. Construções de igreja, história sobre o catolicismos e outras coisas deste tipo. Só quando eu conseguia uma escapada com a minha amiga de quarto. Ela tinha esse filme, e então nós invadíamos a sala e assistíamos. Ficávamos sonhando no dia que finalmente nos libertaria daquele lugar. Remetíamos a nossa situação como na guerra civil, e que viria um Rhett, — mesmo ele sendo um vigarista —, ainda sim a ama e torna seu mundo de novo o mais bonito. 

Estou complacente diante de seu relato, uma menina que sonha em ser liberta, que sonha em ter uma vida melhor. Como é possível todas essas coisas acontecer a uma pobre menina rica que é obrigada a ficar enclausurada em seu próprio casulo? Tudo que quero é ser para ela o que nunca sentiu com mais ninguém. 

—Pois seus dias de liberdade chegou, pode assistir ao filme quantas vezes quiser, está liberado. Com direito a pipoca. —Levanto o saco de pipoca que ela segura. —E uma companhia agradável. —Aponto para mim convencido e ela sorrir. 

—Talvez você seja o meu Rhett, o cara que trará o meu mundo de volta. —Entrelaço meus dedos nos seus, assim que seguro sua mão. Assim que me sinto, o seu Rhett. —Tirando a parte de vigarista e tudo. —Contraio o rosto demonstrando falsa ofensa. 

—Por favor. —Começamos a gargalhar juntos. 

***


Não havia mais ninguém naquele campo a não ser Ella, eu e o Mustang onde nos encontrávamos deitados sob o capô contemplando as estrelas. Estamos com as mãos entrelaçadas como um casal de namorados. Acho que nem ao menos soltamos desde que chegamos ao grupo de apoio. Eu me sinto completo, somente por estar ao seu lado, sentir seu cheiro mais de perto e saber que está segura ao meu lado. 

—O que você espera do futuro? —Me pergunta de uma hora para outra, sou pego de surpresa, não sei o que dizer, eu nem ao menos pensei sobre isso. 

—Acho que ser feliz está no topo da lista de qualquer um, então não usarei essa palavra clichê. Não direi que quero ter saúde, porque se você espera algo do futuro com certeza saúde é o principal. —Ela gargalha. 

—Sim, claro. Como você terá expectativas se não tem saúde? —Concordei. —Espero que você tenha e muita. —Começo a rir com o seu comentário divertido. O papo é descontraído e leve. 

—O que espero do futuro? Ok, vamos lá. Queria muito ser um publicitário reconhecido, administrar todo o sistema de divulgação, supervisionar tudo. 

—Pensei que papai te desse esse poder na empresa. 

—Não, ainda sou o "pau mandado" gostaria muito de subir de cargo. Não por prepotência, mas por saber que sou capaz. 

—Senhor Robson sempre fazendo o que quer com as pessoas. —Dá uma risada irônica. —Ele acha que é o rei sempre. E ainda te elogia tanto. Eu sei que é meu pai, mas às vezes Robson é um falso. 

Preciso concordar com ela, mesmo não dando a minha opinião. 

—Robson sempre diz o quanto admira meu trabalho achei que me subiria de cargo, mas pelo visto o "subir de cargo" foi me colocar na sua cola. —Percebo imediatamente que minha frase soou rude e me remédio rapidamente. —Não, quero dizer... 

—Tudo bem, Michael. Eu sei o quanto deve ter sido ruim pra você se meter nisso tudo, meu pai é assim. Quando ele quer uma coisa ele consegue de um jeito ou de outro. 

Ajeito a minha posição somente para olhar em seus olhos verdes que parecem bem escuros por conta da noite, mas muito brilhantes por conta do luar.

—Sabe, no começo foi desconfortável, me revoltei, mas agora sei que Robson fez um grande favor a mim mesmo. Eu não teria conhecido você, não teria como ajudá-la em tudo isso que tem de enfrentar. Talvez seria desesperador pra você. Fico feliz em poder estar aqui. 

—Achei que fosse uma droga pra você. Sempre tive medo de incomodá-lo. —Neguei com a cabeça após umedecer meus lábios. 

—Mesmo quando estava revoltado com a proposta eu não a culpei por nada. Até que gostei dessa tarefa. Apesar de achá-la um pouco esnobe no começo. —Começo a rir e ela me olha assustada. 

—Dei essa impressão? —Concordo com a cabeça ainda rindo. 

—Você com aquele ar de patricinha deslocada , que o papai precisava cuidá-la. Depois vê-la fumando, mostrando um ar de superioridade, que depois pude perceber que era somente defesa. Seus momentos de dor. —Ella se entristece o olha para o céu. 

—Quis ficar no meu mundo, onde ninguém mais poderia me machucar. Se fosse possível fugir para um mundo solitário onde eu pudesse cultivar a minha dor. Mas você veio para me mostrar que as coisas não são bem assim, que podemos sim nos livrar do sofrimento que nossa própria alma alimentou. —Ela olha para mim agora e eu a encaro com ternura. —Acho que é isso que espero do futuro, Michael. Me libertar, poder enfrentar os meus medos, e a frase "clichê" ao qual mencionou... ser feliz! Penso que eu mais do que todo mundo merece. Ficar ao seu lado, poder ter o seu carinho, quem sabe o seu amor? É tudo que eu desejo. 

—Ella isso você já tem. Eu disse que não iria a lugar algum e não estava mentido. Preciso que confie em mim e possamos enfrentar juntos, não precisa enfrentar sozinha. Tudo que mais quero é lhe ver bem. 

Percebo uma lágrima rolar de seus olhos, limpo com a ponta dos meus dedos. Eu seria o cara que secaria suas lágrimas sempre que derramarem. Estou disposto a qualquer coisa neste momento. 

Ela aproxima seus lábios dos meus e eu posso sentir sua respiração alterada. Recebo um beijo na boca, mas não tão demorado quanto o último. Um beijo cálido e rápido como uma confirmação de que é isso que precisa, do meu carinho. Aperto os meus lábios assim que se afasta e maneio a cabeça demonstrando-a que poderia sim contar comigo. Ella se aconchega no meu peito e eu sinto o cheiro de xampu dos seus cabelos, acaricio os fios e sinto sua mão acariciar o meu peito. Deposito um beijo no topo de sua cabeça e permanecemos nessa posição até achar que deveríamos ir embora.









Capítulo 14 — Ella Robson



A reação mais natural que eu deveria assumir, seria de desespero total, depois de ter ouvido tudo que aquele rapaz disse na reunião. Minhas lembranças voltariam sem pedir licença — o que aconteceu de fato —, mas não deixo que o sentimento ruim me possua. Não deixei que me derrube mesmo ter ficado tão impressionada com a história dele. Tudo que sofreu tudo que sua vida se transformou, era quase um milagre ter superado tudo isso. Me deu forças para buscar o meu milagre também. 

Invés de sofrer calada, afundada nas lembranças do passado, entro em casa saltitante, rodopiando em passos de bailarina. Meu coração transbordante, sorriso sincero no rosto. Aquele sentimento todo têm nome e sobrenome, endereço também. Michael Jackson, Sunset Boulovard 4563 Avenue, San Diego. 

Me sinto tão bem com sua presença que, é como bálsamo, um alento para a minha alma. Estou tão apaixonada por ele, que temo não sobreviver, caso saia da minha vida. Espero que esse dia jamais chegue. Lembro-me do seu sorriso perfeito, do seu cheiro masculino, da sensação maravilhosa que sinto quando nos abraçamos. Não tem como ficar imune. É uma emoção que por mais que tente, sou incapaz de controlar. 

Rodopio e quando meu corpo para, dou de cara com meu pai no fim da escadaria, olhando-me com surpresa. Abre o sorriso quando eu o noto e aos poucos vou me recompondo. 

—Pelo visto, a noite foi boa. —Assinto com altivez, começando a pegar o meu rumo para o quarto.

—Maravilhosa. —Dou de ombros, sem querer argumentar.

—E como foi? Assistiram qual filme? —Subo um degrau da escada quando me pergunta.

—"E o vento levou." —Subo mais um. Não quero esticar a conversa. 

—Estão juntos? Se beijaram? —Sorrio sem humor e continuo subindo. Quando papai percebe que não falarei, segura no meu braço e me impede de subir mais. —Fala comigo, Ella! Não é assim que um pai deve agir com a filha? Saber o que acontece em sua vida? 

Papai está tentando se aproximar, pelo menos é uma forma de conversar algo sensato que sei que não faria mal para nenhum de nós dois. Seria muita crueldade da minha parte ignorá-lo.

—Estamos juntos sim, papai. E nos beijamos. —Ele junta as mãos como um ato de agradecimento aos céus. Sei que é a oportunidade perfeita para que Robson tenha tudo que quer, usando o meu relacionamento para conquistar benefícios próprios, mas não quero que isso estrague nada. 

—Sempre soube que Michael é o cara certo para você. Tive a certeza logo de cara. Aquele jeitinho de rapaz exemplar, sempre andando na linha. Fazendo as melhores escolhas no trabalho. —Ele balança a cabeça em um sorriso bobo. —É impressionante! Minha capacidade em fazer julgamentos das pessoas nunca me desamparou. 

Sua empolgação me preocupa, ainda mais levando em conta que meu pai sempre agia por impulso, tenho certeza que até o casamento ele começaria a planejar. 

—Papai, olha. Não quero que se meta nisso, tudo bem? Não faça nenhum alarde sobre o que Michael e eu estamos vivendo. Até porque, nos beijamos somente uma vez. Não sei o que vai acontecer conosco, não sei se vai dar certo e se ele sente o mesmo que eu. 

—E o que você sente por ele? —Ergue a sobrancelhas em forma de desafio ao me perguntar. 

Busco dentro de mim o que estou sentindo, e uma onda de felicidade se apodera de mim. Percebo que Michael tem esse poder de transmitir alegria para o meu coração.

—Estou apaixonada, papai. —Ele toca o meu queixo e sorri de leve, penso que meu pai está feliz por mim.

—Viu só? Você o ama, e tenho certeza que ele também sente o mesmo. Michael é um cara incrível, eu sei, eu trabalho com ele. Não o conheço em sua vida pessoal, mas parto de um pensamento de que um homem quando é pra ser correto, ele é em qualquer lugar. Michael ouve, obedece, sabe se impor quando algo não está justo. Sabe esperar o seu momento certo, sem assumir uma presunção ridícula. Homens assim é raro e é de um caráter impar. É o tipo de ser humano que sempre presei. 

Meu sorriso se abre diante de suas palavras, me sinto segura ouvir tal coisa de uma homem tão experiente que conhece a vida e as pessoas, tão bem quanto o meu pai. Se ele pensa assim, é porque deva ser verdade. 

—É por isso que não o sobe de cargo? —Finjo que ignoro suas palavras para lhe dar um sermão. Papai sorri. 

—Ele estava passando no meu teste primeiro. O confiei em uma missão e ele precisava passar pra, só então ter a minha aprovação. Parece que conseguiu. —Reviro os olhos e balanço a cabeça. 

—Vocês homens, são sempre assim? Ainda não esqueci o que me falou sobre ter netos, papai. Não quero que use meu relacionamento com Michael para obter benefícios, cuidado. —Ele esfrega sua mão na nuca, seu costumeiro jeitinho sacana está lá, junto com o sorriso cínico.

—Filha, você e Michael já estão juntos, o que acontecer daqui pra frente é lucro. Prometo que não vou interferir. A não ser uma festa que darei amanhã. Convide-o, ele também faz parte disso. —Olho com cara feia para ele, não posso acreditar. 

— O que acabamos de conversar? Você não tem jeito. 

—Ella, eu sei que passamos tempo demais longe um do outro. Sei que invés de assumir um papel de pai eu a mandei para um internato, mas acontece que eu tinha apenas vinte e poucos anos. Estava começando a conquistar as minhas coisas. Sua mãe havia morrido e não fazia ideia do que fazer da minha vida. Eu estava confuso, minha filha. Muitas responsabilidades nas mãos, eu tive medo de fazer sofrer com tudo isso. Não queria que o que houve com a sua mãe pudesse te afetar de alguma forma. Eu sei, fui um covarde, mas quero reparar estes erros, quero mostrar a você que eu posso sim ser o seu pai de novo. Que ainda dá tempo de corrigir os erros, mas eu preciso fazer do meu jeito, é assim que funciona comigo. 

Suspiro exausta. Lidar com ele era cansativo, mas devo admitir que suas loucuras trouxe benefícios para mim. Conheci Michael e estou apaixonada por ele, e sei que tem um dedo de Robert Robson. 

—Tudo bem, papai. Sorte a minha que seus desejos também se tornaram os meus, não é mesmo? —Rimos. 

Seus dedos longos tocaram o meu rosto com carinho. 

—Eu quero me aproximar de você, quero ser seu pai, conhecê-la e recuperar o tempo perdido. 

Entristeço, sabendo que me conhecer do jeito que quer só serviria para magoar nós dois e isso está fora de questão. Se dependesse de mim, meu pai nunca conheceria essa... parte de mim. Deposito um beijo em sua bochecha e subo as escadas. 

—Ah. —Paro no último degrau só para aconselha-lo. —Suba Michael de cargo, ele merece. —papai dá uma piscadela e eu sorrio para ele. 

***


—Papai faz questão da sua presença, sabe como ele é, né? Vai fazer de tudo um espetáculo. —Ouço sua risada ao fundo do telefone. Adoro aquela risada, adoro o jeito que leva as coisas naturalmente, adoro ele. 

—Pois eu irei. Se esse "espetáculo", como você diz, é para nós, farei questão de estar presente. 
Quando será que Michael deixaria de ser fofo? Porque sinceramente eu espero que nunca. Ele me faz tão bem que sou incapaz de sentir raiva do meu pai por estar forçando a barra. Michael me faz pensar que nossa relação não é nenhuma forçação de barra, muito pelo contrário, é espontâneo. Não tenho nenhum motivo para querer esganar o meu pai. 

—A festa acontecerá às 19:00, papai até já preparou o buffet. Espero que não se sinta pressionado, sabe como ele é? 

—Não estou me sentindo pressionado, não mais. Sabe que farei tudo para que se sinta bem. E quanto a senhor Robson, já me acostumei. Sei que é impulsivo e exagerado. Não se preocupe, Ella, vai dar tudo certo. 

Se ele diz, quem sou eu para contestar?

-Você é um amor. 

-E você é o meu anjo.

***
O gramado do jardim está todo ornamentado com mesas para os convidados, até músicos em um pequeno palco está tocando violino, penso que não estou em uma festa para comemorar meu começo de relacionamento com Michael, mas sim um noivado. Reviro os olhos, diante daquele exagero de papai, mas meu incômodo esvai quando meu moreno de belos olhos e corpo espetacularmente, sensual, aparece diante de mim. Ele está vestido com uma camisa escura, acho que é azul, ou grafite, deixando seus belos bíceps a mostra. Calças jeans que deixa suas coxas bem torneadas e evidentes. Michael é um espetáculo de homem, não dá para ignorar. E aqueles óculos escuros lhe dá um charme a mais, naquele rosto masculino que tanto me impressiona. Está simples para a grandiosidade do evento que papai organizou, mas ainda assim continua perfeito.

Ando rapidamente ao seu encontro, me aninhando em seus braços, aspirando o seu cheiro acostumado pelos meus sentidos. Não consigo ficar imune ao toque do seu corpo, me acende, me enlouquece. Minha testa encosta na sua, e acaricio seu rosto, sua barba arranha minha pele, mas não me incomodo, acho perfeito. Capturo seus lábios com a minha boca e começamos a compartilhar um beijo envolvente, ali no meio do campo, sem nos importarmos quem estivesse vendo. Aquela língua macia acarinha a minha boca com uma maestria singular. Ah, Michael! Se soubesse o quanto me derreto por você! 

—Aí estão vocês! —A voz do meu pai, faz com que nós nos separamos. Michael me abraça de lado voltando-nos para ele. -Que bom que veio. —Papai aperta a mão do meu novo namorado e sinto que aquilo realmente é oficial. Meu ventre se agita em expectativas.

—Eu não perderia por nada. 

—Vem, vou apresentá-lo a todos. —Papai caminha em direção às mesas. Michael e eu o seguimos. 

Há algumas pessoas das quais eu não faço a mínima ideia de quem sejam. Todos engravatados e engomados. Uma forma de papai fazer negócios as minhas custas. Distorço a face em uma carranca, mas Michael com aquele sorriso impecável, ergue os ombros. O jeito dele dizer que papai é assim mesmo e que devo acostumar, ou ficaria chateada à toa. 

Acho que meu pai excessivo e cheio de impulsividade, está apresentando Michael como meu novo namorado, mas para ser sincera me desligo de tudo por um instante. Começo a pensar no futuro daquela relação, nos medos que ainda tenho, e as coisas das quais ainda não contei a ele. Um medo me invade de repente, me sinto travada, um gosto ruim na boca e um nó preso na garganta. Avisei a ele que quando descobrisse o que aconteceu comigo poderia me deixar. Devo contar a ele de vez, mesmo correndo o risco de perdê-lo, mas não quero perdê-lo, não sei se minha vida voltaria ao normal sem o seu apoio. 

Vejo que papai o levou mais adiante. Estão conversando sobre negócios eu acho, e aproveito para me afastar. Não foi proposital deixá-lo sozinho com o meu pai e aquela situação, mas não tenho cabeça para bajulações, ainda mais com uma questão interna para resolver. 

Me embrenho nas árvores do vasto hectares que papai adquiriu, me afastando da casa e de tudo. Está bem escuro e meus pensamentos são os meus inimigos agora. Encosto em uma árvore e mexo nas pontas do cabelo, pensando em mil maneiras de continuar aquele relacionamento sem ter que pensar nas consequências. Não quero e não posso magoar ninguém, muito menos decepcionar. Também não posso ficar longe dele. 

Sinto uma mão forte e macia tocar-me pela cintura, depois envolver-me em uma abraço por trás. Sua respiração arrepia os pelos na minha nuca e eu suspiro, como se uma nuvem estivesse me carregando, tamanha é a tranquilidade. 

—Robson lhe entediou muito? —Ele ri.

—Não exatamente, só disse o que é verdade. Que estamos namorando, e que sou o melhor genro do mundo. —Sorri todo orgulho. —Ah! Sou oficialmente diretor-geral na área de divulgação. —O tom animado dele me empolga.

Virei a cabeça para olhar em seu rosto. Fico tão feliz por ele que o abraço com força. 

—Meu Deus, parabéns! Eu sei que é tudo que queria. —Eu tinha certeza que papai faria a coisa certa. 

—É tudo que sempre quis sim, mal posso acreditar que seu pai finalmente reconheceu o meu trabalho. —Deposito um beijo em seus lábios toda eufórica, esquecendo que estava entristecida anteriormente. —Passei a minha vida inteira desejando fazer o que sempre gostei em uma empresa ao qual sou aceito. Conheci Robson, conheci... Você. —Meus olhos estão iluminados, posso apostar. 

—Não sei o que seria da minha vida hoje em dia se não conhecesse você, Michael. Provavelmente uma droga... Literalmente. —Seus dedos acariciam meu rosto, sinto um arrepio.

—Claro que não. Você é forte, eu nunca duvidei do que é capaz, e você não deve duvidar também, Ella. 

Ele acaricia o meu rosto com delicadeza de novo, fecho os meus olhos para absorver o seu toque melhor. Tantas sensações maravilhosas, tantos desejos loucos para serem explorados, que eu nem saberia dizer o que preciso primeiro. Uma vontade de que Michael pudesse apagar tudo que eu vivi um dia. 

—Não duvido, amor. Não vejo mal algum querer o que desejamos ao nosso lado. Você é tudo que desejo. E sei que conseguiu finalmente o que sempre desejou. Meus parabéns. 

—Eu já tinha o que desejava. Você Ella. Você conseguiu ser ainda mais importante do que ser diretor-geral na empresa de seu pai. Apesar de estar muito feliz por isto. Acho que você se tornou a minha prioridade principal ao longo deste tempo, que não consigo mais pensar em outra coisa. 

Eu quero gritar, me libertar, dizer o quanto sou feliz por ter o conhecido, para todo mundo que quisesse ouvir. Mas não sei se é uma boa ideia. Eu quero guardá-lo só para mim, como um tesouro precioso que somente eu posso descobrir. Michael está mesmo me colocando mais ou tão importante quanto o que sempre sonhou? Nunca ninguém havia feito tal ato por mim até agora, nem mesmo o meu pai, sangue do meu sangue. Sou ou não sou a mulher mais afortunada do mundo?

—Tem muita coisa sobre mim que você ainda não sabe, Michael. —O medo me invade de novo, só que dessa vez com mais força, por conta da expectativa que deposita em mim. Não quero que possa se arrepender depois. —Coisas terríveis. 

Deixo uma lágrima escorrer de meus olhos, não consigo mais olhá-lo. 

—Seja o que for, vamos superar juntos. —Balanço a cabeça sabendo que é bem mais do que ele pensa que é. 

Meus batimentos cardíacos aceleram, começo a ofegar. 

—Michael, escuta. Não é tão fácil assim. —Uma lágrima escorre dos meus olhos e ele as enxuga. —Eu não sou quem você está pensando. 

—Ella, eu amo você! —Sua convicção é tão precisa que meu coração falha por um instante, olho rapidamente para ele. Michael parece que está surpreso tanto quanto eu por confessar. —Minha nossa, é isso! Eu amo você. E quando a gente ama alguém somos capazes de superar qualquer coisa. 

Meu medo se esvai de repente, sinto paz, uma força incrível. Sei que Michael diz porque não conhece a minha verdadeira história, mas só de ouvir aquelas palavras me derreto. O abraço com força, sendo amparada por seus braços. Nossas bocas se encontram e a necessidade que tenho dele revigora. 

Enfio minhas mãos por dentro da sua camisa, sentindo a textura rígida de suas costas. A musculatura contrai ao meu toque. Percebo que me quer tanto quanto eu o quero. Nossas línguas duelam serpenteando uma na outra como uma dança, uma valsa dos amantes. Subo sua camisa até a metade de suas costas, ele entende o recado e me ajuda a retira-la completamente. Admiro o seu corpo que desperta os meus instintos femininos, aguça os meus desejos e me arrebata. Meus dedos percorrem pela estrutura rígida, admiro ao olhar. É bem forte, definido. Seu umbigo é perfeito. Meus lábios caminham por sua pele permitindo com que eu me perca, me perca de prazer e deleite. Sugo seu umbigo e ele geme deliciosamente. O que sinto é muito forte, tão forte que mal penso em nada a não ser tê-lo para mim.

Faço um caminho de saliva por todo o seu peito, sugo o mamilo, ouvindo-o gemer de novo. Estou em seu pescoço, lambo-o inteiro enquanto meus dedos sentem os ossos salientes do seu colo.

Volto a abraçá-lo, agarrando sua boca ainda com mais força. No meio das minhas pernas está úmido e suplicante, tamanho é o tesão. Estou morrendo de tesão por Michael e não posso mais controlar. Sua ereção esfrega em minha barriga, solto um gemido longo ao senti-lo. Suas mãos grandes e fortes, também entram dentro da minha roupa, porém estou de vestido. O toque em minha bunda, subindo cada vez mais pelo meu corpo, tira-me o fôlego. Seus dedos são hábeis, fazem com que me arrepie à medida que percorrem da lombar até as costas. Sou arrebatada por sensações intensas novamente. 

Ele me despe com cuidado. Seus olhos intensos e desejosos estão em cima de mim, admirando-me, contemplando-me. Mal penso, só preciso dele. Exibo meus seios os projetando para frente, mostrando-os para o meu amado. Michael circula seus lábios com a língua umedecendo-os.

Meus seios são tocados bem de leve. O polegar esfrega pelo meu bico, até que eles ficassem duros, são explorados com muito esmero, como se fosse uma rosa bem delicada. Michael é um apreciador e eu uma peça a ser apreciada, é assim que me sinto. É assim que ele me faz sentir. Fecho os meus olhos me deleitando àquela onda de sensações, que não posso fugir e nem controlar, mas não quero fugir, quero ficar. Somente o homem que amo, seria capaz de lavar a minha alma, marcar-me e me livrar de toda a dor que meu corpo estava cheio. Só ele tamparia as feridas e devolveria a vida para mim. 

Sou pega para o seu colo e deitada com cuidado na grama. Sinto minhas costas pousando no gramado fofo e úmido. Está muito escuro, mas consigo ver Michael abrindo o cinto da calça e os botões, despindo de suas calças diante de mim. 

Seu corpo é perfeito, masculino. Está muito excitado e glorioso. Olha-lo nu me deixa sem ar, atônita, não consigo desviar os meus olhos, quero admirá-lo. Mas, mais do que tudo, quero senti-lo. 

Michael fica de joelhos na ponta dos meus pés. Minha perna direita é erguida e beijada, da ponta dos dedos até as minhas coxas. As imagens ruins me pegam, já vi aquela cena antes. Porém tudo que vejo são dois pares de olhos negros e apaixonados me encarando com amor. O medo some de novo. Sua boca sobe agora para o meu ventre. Seus lábios estão febris e bem úmidos, sinto uma onda de prazer me atingir, e gemo de novo. Meu umbigo é chupado, sinto meu clitóris trêmulo vibrar. Ele está beijando a minha barriga como beija a minha boca, de língua e intenso. É tão gostoso que entro em parafuso, sinto que estou perdendo a cabeça. 

Seus dedos percorrem as cicatrizes daquele dia, me assusto, por ele descobrir. Ele franze o cenho, mas logo beija as marcas sem entrar em detalhes. Sei que sabe o motivo, mas que agora não importa mais, porque estou segura em seus braços.

—Está tudo bem? —Ele pergunta rente ao meu rosto, minhas pernas circulam em sua cintura e já posso senti-lo duro e quente por cima da calcinha úmida. 

—Muito... —Sussurro sendo incapaz de dizer mais nada. Estou sem fala e sem ar.

Claro que estou bem, ele é perfeito, gentil. Nunca senti nada parecido. 

Meus seios são explorados mais uma vez, mas agora com sua boca. Sou sugada, lambida e saboreada. Ele tem esse poder de me tomar para ele e me envolver de uma forma única. 

—Você é perfeita, Ella. Se dá conta de quão linda você é? Do quanto a desejo e quero que se torne minha? Eu te amo, meu amor. Te amo tanto que é difícil suportar. 

Quero chorar, mas não faço. Antes aquelas palavras eram de dor neste exato momento. Ouvia risadas, deboches, crueldade. Mas agora ouço ternura, amor e carinho. Não há dúvidas o quanto eu também amo aquele homem.

Michael se posiciona entre as minhas pernas, retira a minha calcinha, estou exposta e pronta para ele. Ele cheira a minha peça sem desgrudar seus olhos de mim. Fico com vergonha, mas é muito satisfatório. Meu ego feminino é agraciado. 

Com uma mão ele afasta as minhas pernas, posicionando sua cabeça entre elas. Minha intimidade é beijada, apreciada. Meu corpo treme com a sensação, é bastante prazerosas e intensa. Sou tocada no fundo com a sua língua macia, meus dedos se retorcem. Também conheço este momento, mas não chega nem perto das sensações horríveis que foram, muito pelo contrário. É um deleite afável. Sua língua me chupa, me suga, me toma. Solto um gemido alto, seguro em seus cabelos os puxando de leve. Seus olhos me encaram enquanto ele me ama com a boca. Por um momento me desligo de onde estou, nem quero saber que alguém possa aparecer e nos ver, e mesmo que nos veja, eu não pararia. 

As ondas de prazeres se intensificam, meu corpo está suado e quente. Preciso dele, do seu corpo dentro de mim, só assim para que eu me sinta completa. 

—Me ama, Michael? Preciso de você. 

Minha voz é de súplica o faz acatar as minhas ordens. Delicadamente para de me beijar, posiciona-se entre as minhas pernas. Seu corpo pesado e duro está sobre o meu. Seu rosto afundado na curvatura do meu pescoço, beijando aquela parte entre meu ombro e meu pescoço. 

—Eu vou fazer amor com você. Vou lhe amar até o final. Vou torna-la minha, mas jamais, jamais vou machucá-la. —Minhas mãos seguram suas costas apertando-a quando sua ereção me invade com força. — Gemo mais alto. —Quero ser capaz de curar as suas dores e seus temores, Ella. Quero ser para você o que ninguém mais foi capaz de ser. 

Estou no céu! É o momento mais completo da minha vida, estou apaixonada, eufórica. Meu corpo todo responde aos seus toques. Sugo a pele do seu ombro, beijando com avidez. 

Sinto dor, muita dor. O pênis do homem que amo é bem grande e grosso. Me alarga, me consola, me preenche. Não quero interromper. Mais uma vez contemplo faces, ouço vozes, risadas. A dor triplica. Gemo, me debato, mas quando olho para o rosto dele tudo se esvai de novo. Ele é um anjo, seus beijos no meu rosto me tranquiliza. Acaricio sua barba arranhando a minha pele. Minha boca suga seu queixo, logo mordiscando seus lábios. 

Ele é delicado agora, escorrega para mais fundo de mim sem nenhuma dificuldade ou empecilho. Noto que seu rosto franze, tenho quase certeza que pensou que eu fosse virgem, mas não diz nada, nem eu quero dizer. De qualquer forma sou sim.

Seus movimentos são mais intensos, descobrindo-me, alargando-me... curando-me! Dizem que o amor cura tudo, pois seu poder é bem mais forte do que qualquer sofrimento, ou medo. O amor de Michael está me curando. Lavando da minha alma, toda a rapina maligna em que foi submetido a mim. Perdoando os meus pecados.

As estocadas são mais ritmadas, um vaivém frenético que me arrebata deste mundo, levando-me ao céu em questão de segundos. Estou em paz, encontro a paz, ali nos braços do homem que amo. Um prazer insano me atinge, sinto contrair o meu sexo e me desfaço em seus braços, gemendo em seu ouvido. Os músculos rígidos de Michael paralisam, seu gemido é alto e animalesco, sinto-o contrair dentro de mim. Sou preenchida pelo seu amor. Estou curada... liberta!







Capítulo 15


Olho para o céu estrelado está um brilho incrível. Tão iluminado quanto o que eu estou sentindo por dentro. Ella se aconchega em meu peito, sua pele está ainda quente. Posso ouvir seu coração bater forte, é agradável. Seu cheiro de mulher me enlouquece ainda, mas o que sinto dentro de mim é bem mais revigorante. 

Ella não era mais virgem, mas não quero que este detalhe se torna importante em nossa relação. Sei que Ella viveu naquele internato trancafiada, não haviam homens naquele colégio de freiras, mas também sei que ela é o tipo de mulher que sempre deu suas escapadas; ver filmes, tocar piano, sempre em companhia de sua amiga. Provavelmente conheceu um cara nesse meio tempo e por causa destas e outras, sofrera punições. Para falar a verdade não quero saber o que houve antes de nos conhecermos, com quem esteve, ou quem não esteve. Ella é a minha e eu sou muito grato. 

Seus olhos esverdeados sobem quando ela levanta a cabeça para me olhar. Minhas mãos acarinham seus braços com leveza. Cobri nossos corpos com as roupas em que nos despimos, mas continuávamos aproveitando aquele momento de amor. 

Deposito um beijo cálido em sua testa, ela sorrir, está extasiada assim como eu. A encaro com ternura. Preciso lhe dizer algo.

-Se me perguntassem qual é o momento mais feliz que você já viveu na vida, desde que fui criança até aqui, minha resposta seria este momento. Aqui... com você. Fazer amor com você foi surreal para mim, Ella. Foi algo inesquecível. —Seu sorriso se abre, seu coração acelera mais, diante das minhas palavras e ela beija a minha boca. Suga os meus lábios longamente, uma forma de mostrar que para ela fora o mesmo. 

Seu corpo nu sobe em cima do meu, suas mãozinhas miúdas e delicadas seguram o meu rosto. Ella é tão maravilhosa que falta muito pouco para que eu reverenciasse a sua beleza. 

—E se eu disser que este momento foi como uma renovação para mim, você acreditaria? —Assinto sentindo dentro de mim chacoalhar. —Me sinto liberta como nunca antes. Minha alma está livre e renovada, como a águia. Buscando suas forças, encontrando sua liberdade, sua rendição. 

Duas lágrimas rolam de seus olhos verdes. Também me emociono e muito, meu coração está tão acelerado que falta sair pela boca. Sou um adolescente de novo, experimentando o mais puro amor. Sou capaz de fazê-la feliz, de trazê-la de volta à vida. Deus do céu! Tem noção do quanto estou feliz neste momento? É tão forte que não posso suportar. 

—Eu te amo, Ella. Te amo como nunca amei ninguém, te amo como preciso amar. Não sei lidar com essa emoção porque nunca foi me apresentada antes, porém sei, e tenho a plena certeza que não quero deixar de senti-la nunca mais. 

Ela reivindica minha boca com ânsia e fulgor. Seguro em suas nádegas a erguendo sobre o meu corpo para intensificar ainda mais o beijo. Sua língua suculenta se embola na minha. O sabor doce me embriaga, sou comedido por um sentimento além das minhas forças. Sou envolvido por um desejo carnal quase palpável. É bem além do que posso suportar, é perene e conturbado ao mesmo tempo. 

Estou pronto para adentrá-la. Como um animal irracional, manuseio-me e a penetro. Aperto sua bunda com força, movimentando-a em mim possessivamente. 

—Não importa o que esteja passando, Ella. —Arremeto dentro dela potente e viril. Seus gemidos de prazer invadem os meus ouvidos, fico inspirado. —Sempre vou dá um jeito de enxugar suas lágrimas. Meu amor se encarregará do resto. 

Seus seios estão imprensados no meu peito, o corpo de Ella é perfeitamente delicioso. Consigo me mover dentro do meu amor, mas ao mesmo tempo sou apertado, esmagado até uma onda de prazer chacoalhar-me inteiro por dentro. Aquela mulher é perfeita e é toda minha. 

Ella ergue seu tronco ficando assim, sentada sobre mim, suas mãos postas no meu peito, permitem ter um impulsividade melhor sobre nossos sexos. Está mais solta, sem vergonha, cavalga em mim como louca, entorpecida de desejo. Seguro em seus cabelos que já estão úmidos de suor.

—Michael. —Ela chama meu nome ao encostar sua barriga na minha, sua boca colada a minha, sinto sua respiração. —Eu amo você. Você é a melhor coisa que já aconteceu na minha vida. 

Seu rosto se enterra no meu pescoço, os gemidos dela são incessante. Sinto uma mistura de sentimentos ao ouvi-la dizer tais palavras. Sou tudo que Ella sempre precisou, é uma responsabilidade entanto, porém corresponderei suas expectativas com muito prazer. 

Giro o seu corpo, ficando por cima dele. Minha boca circula seu seio direito o sugando, enquanto arremeto profundo, mas sem força. Ella é uma bonequinha de porcelana, jamais quero quebra-la. Cuidar e amar é tudo que desejo neste momento. Aquela menina sofredora e cheia de sentimentos abalou o meu mundo, sou um privilegiado. Quero-a junto a mim. 

Uma onda de prazer se apodera de mim, fico sem forças, sem controle. Meus braços apoiados um do lado do outro de Ella, estão com as veias saltadas, tamanha a pressão que excesso buscando o equilíbrio. Não posso mais suportar, me entrego ao prazer, que me devasta por completo. Solto um grito rouco, me liberando dentro da minha amada. Seu sexo se contrai, apertando-me ainda mais, sinto-a pulsar. Ella se desfaz lindamente em meus braços, cravando suas unhas nas minhas costas, olhando nos meus olhos. Fora um encontro das almas, algo sublime em que compartilhávamos. 

Desabo em seu corpo e sou protegido em seu abraço. Ela beija a minha testa, meu rosto, tudo que ela encontra pelo caminho. Meu corpo está relaxado, tranquilo, como se nada pudesse me abalar. 

Ella beija a ponta do meu nariz, fecho os olhos para senti-lo. Somos agora carinho e cuidado. Amor e paixão.

Mas algo nos interrompe. Ouço um barulho de jatos de água, quando olho ao redor, os sprinklers estão ligados derramando água por todo o lugar. Ella e eu assustamos, nos levantamos rápido para não nos molharmos.

—Michael, oh meu Deus! —Ela gargalha, eu faço o mesmo. 

—Pega as roupas, cuidado para não molhar. —Começamos a pegar as nossas roupas ao chão. 

Pego a calcinha de Ella, ajuda-a se vestir. Passa uma perna depois a outra, subo-a até se vestir no corpo. Depois pego seu vestido, ela levanta seus braços e eu a visto. Não paramos de nos olhar. Era o meu jeito de cuidar dela, de mostrar que me preocupo. 

Minha amada faz o mesmo, ajudando-me a vestir a cueca, depois a calça. Enquanto coloco a camisa, ela fecha o zíper e o cinto. Estamos prontos. 

Entramos na casa as gargalhadas. Não sabíamos do que estávamos rindo, mas mesmo assim ríamos. Nunca estive tão vivo como estou agora. Passamos pelo jardim, Senhor Robson ainda está por lá com os convidados. Fica surpreso em nos ver.

—Aí estão vocês! Onde se meteram? Os procurei por todo lugar. —Ella e eu olhamos um para a cara do outro e começamos a rir. Quem visse, pensaria que aquele casal abraçados e sorridentes haviam fumado um. 

—Não procurou direito, papai. —Ella morde os lábios e por mais que eu quisesse segurar o riso, para não dá muito na cara, é o que mais faço. 

Robson nos encara com desconfiança, mas não diz nada.

—Já que estão aqui. Venha Michael, preciso lhes apresentar a alguém. —Ella segura firme no meu braço quando fiz menção de ir, impedindo-me. 

—Papai, deixe meu namorado em paz. Ele já pousou o bastante de seu genro, agora quero ele todo para mim. —Robson olha para mim, depois para Ella. Ergui o ombro como se dissesse que agora Ella quem manda por aqui. 

—Okay. —Eu sei, vi no rosto de Robson o quanto ele sabe o que está rolando ali. Será que sabe o que eu e Ella andamos fazendo no jardim? Fico envergonhado só de pensar sobre isso. —Divirtam-se crianças, mas tome cuidado. —Avisa e Ella sai me puxando sem responder o pai. 

Subimos as escadas aos beijos, risos, mais beijos, mais risos. Não largo a sua cintura, tampouco ela a minha. Nem sei como chegamos até o seu quarto que me deslumbrei ao vê-lo. Um quarto digno de princesa, bastante feminino e bem a cara dela. 

Sua cama é de casal bem no centro do lugar, cortinas brancas nas janelas, e penteadeira com todas as suas maquiagens, tudo intocável. Carpetes felpudos e brancos ao chão. 

Ella praticamente me joga em sua cama, sentado. Vem para cima de mim. Sua intimidade roça no meu pau por cima da calça jeans. Seu rosto acarinha o meu, seus lábios tocam nos meus, vez ou outra. O som da sua respiração é audível diante do silêncio. Os risos sessaram. O que há era somente o encontro das almas. Seu coração continua acelerado. Fica séria por um instante, entristecida. 

—O que houve? —Achei que nunca mais ficaria triste depois de hoje, no entanto...

—Há tanta coisa que você não sabe sobre mim, Michael. —Suspiro enfadado, cansado deste medo, desta insegurança.

—Eu não preciso saber. Pra quê? Pra te magoar ainda mais? O passado já passou, não quero que atormente o nosso futuro. —Sua testa cola na minha, seus suspiros me mostram que está chateada, não quero mais vê-la assim. 

—Pode ser que nosso futuro se abale por conta do que houve comigo. Não quero que isso aconteça. —Balanço a cabeça mostrando que nunca acontecerá. 

Nossos narizes se esfregam e eu seguro com força em suas mãos. Quero fazê-la sentir o meu amor, que seria capaz de tudo para que fique bem. 

—Ella, não há nada neste mundo que faria nosso futuro se abalar. Prevejo tantas coisas boas, meu anjo. Pense em um futuro melhor, quando você finalmente se torna feliz, livre desses tormentos. 

Ela treme, geme um pouco e eu sei que é de angustia. O passado dela ainda a tormenta, pensei que não se sentiria mais assim depois que ficássemos juntos, mas não posso ser tão prepotente a este ponto. Há feridas no meio disso tudo e feridas enormes. Não sei quando se cicatrizariam, ou se, se cicatrizariam. 

Ela ergue a cabeça, olhando em meus olhos. Ajeito as mexas de cabelo que estão em seu rosto. Não consigo acreditar que uma hora estava tão bem e agora tão fragilizada de novo. 

Lembro-me que quando Ella e eu fizemos amor, vi que não era mais virgem. Talvez ela pense que me chateei, mas não foi o que aconteceu e preciso que saiba. 

—Não importa com quem esteve no passado. Estamos juntos agora e é isso que importa para mim. —Ela franze o cenho. —Você não era mais... virgem. —Seu corpo estremece e ela soluça, mas não chora. Minhas dúvidas são respondidas pela sua reação. —Ella, não importa. —Acaricio seus cabelos. —Sou eu quem está com você agora. 

—Michael... —Ela me encara. Sinto que tem algo na oculta, mas não sei definir. Talvez tenha sido uma experiência ruim, há muitos casos como este. 

—Quer falar sobre isso? Foi ruim? 

—Não! —Se empertiga toda sobre o meu colo, coloca as mexas laterais do cabelo atrás da orelha. — Não quero falar sobre isso. Olha, você tem razão, não devo me preocupar com o que aconteceu. O que senti hoje, foi bem mais importante para mim do que você imagina. Algo que nenhum outro poderia ser capaz de me fazer sentir. 

Não posso negar o quão meu orgulho masculino vibra. Mas sei que Ella não fala apenas do meu desempenho sexual, ela fala de sentimentos, de emoções, coisas que também senti quando estivemos juntos. Me sinto ligado a ela, de uma forma que nunca fiquei com mais ninguém. 

Penso sobre almas gêmeas que os piegas e romancista dizem entre dois casais. Nunca desacreditei, mas também fora algo que duvidei encontrar um dia na minha vida. Nunca me dei bem em relacionamentos, a não ser aquelas mulheres fáceis que estão a fim apenas de uma trepada. Nunca algo sério e pra valer. Com Ella foi bem mais do que sério e pra valer, foi um encontro, uma conexão. Era como se nos completamos, nos conectamos. Ela passou ser o meu mundo inteiro, e eu o dela. Jamais eu deixaria a minha outra parte de mim sofrer de novo, ou estaria me machucando também. 

Ouvimos batidas na porta e paramos o beijo abruptamente. Era Robson entrando no quarto. Ella desceu do meu colo com uma pressa impressionante sentando-se ao meu lado, mas acho que não deu muito certo disfarçar, Robson percebe. Fico muito, mais muito envergonhado. 

—Não sabe bater? —Ella reclama. Estou sem jeito, bastante sem graça.

—Os convidados querem vê-la tocar, minha filha. —Comenta como se não houvesse percebido nada. Adoro Robson por isso, é um cara bastante tranquilão em relação a relacionamentos, principalmente com sua filha. 

Mas quando fala sobre Ella tocar, abro um sorriso empolgante. Eu também quero vê-la tocando. 

—Não fará esta desfeita, não é mesmo?

—Vamos Ella. Quero tanto ouvi-la. —Faço cara de pidão e ela sorri. 

—Só porque o Michael quer. —Sorrio por saber que há coisas que Ella só faz para me agradar. 

Como no previsto, os convidados estão todos na sala, pude notar um piano negro, muito bem envernizado no centro. Algo bem sofisticado. Olho para àquelas pessoas e não sei quem são, mas o que importa é observar a minha namorada enquanto toca. 

Ella se senta em um banquinho em frente ao piano, com elegância, como uma moça bem educada deveria ser. Seus belos dedos cumpridos de mãos pequenas posicionam nas teclas, e com muito esmero, começa a dedilhar as primeiras notas. Reconheço esta canção, é Let's stay together de Al Green. Ella sabe que sou fã de blues, sei que é uma homenagem a mim. Me emociono, pois a canção está impecável naquela melodia. Seu olhar terno me encara e eu sei o quanto conversávamos. Ternura, amor, paixão; tudo conversa com o olhar, a música e as emoções. Era puro, especial, repleto de sentidos e significados. Parece um anjo tocando as harpas no céu, de tão divino que é. 

Recebo uma cutucada de Robson no meu braço, ele pisca para mim quando eu o olho. Sabe que estou apaixonado, sabe que Ella também está apaixonada por mim. 








Capítulo 16





Me pego pensando como minha vida mudou de uma hora para outra. Antes, um homem tranquilo, batalhador, buscando o melhor para si mesmo. Depois sou imposto a uma vida atribulada, repleto de desafios que nem sabia como solucioná-los. Hoje, um louco apaixonado, com uma vontade insana em ser feliz e fazer quem estiver ao meu redor feliz. Acho que sigo o meu caminho, as expectativas estão ao meu favor e finalmente consegui o meu reconhecimento profissional. 

Diretor-Geral da Robson's Enterprises! É uma realização profissional entanto. Meu sorriso está de orelha a orelha, entro naquela empresa de cabeça erguida. Vince me dá efusivos parabéns, todos estão contentes por mim. Robson me diz que está me entregando um tesouro, mas como já me entregou Ella, acha que confia em mim o suficiente. Me sinto em família, integrado àquele ambiente do jeito que sempre quis que fosse. 

Em nenhum momento penso que meu relacionamento com Ella deslanchou tudo na minha carreira. Sei que Robson só estava fazendo charme para finalmente me nomear. Zelar pelo bom desempenho midiático da empresa e nossos clientes era tudo que eu queria.

Robson fez um pequeno brinde para a minha promoção e sou ovacionado por comemorações. 

—Este brinde é para o melhor publicitário já visto na Robson's Enterprises. —Robson levanta a taça de champanhe para o alto. Penso que recebo mais do que mereço, mas levando em conta tudo que lutei, acho que mereço sim. —Além de meu genro, é claro. 

Recebo tapas no meu ombro de toda a parte. Cada um querendo me cumprimentar. Estou tão feliz que é difícil tirar o sorriso do rosto. 

—Quando fundei a Robson's Enterprises, parti de uma filosofia que me levaria a tornar-se, anos depois, no cara que sou hoje. Paixão no que faço, determinação, atitude e foco. Michael Jackson é um dos poucos caras quem têm tudo isto. É... o cara é especial! —Sorrio. — E nada me faz mais feliz do que tê-lo como um dos responsáveis deste grande sonho meu, se tornar realidade. Parabéns meu rapaz. 

Consigo o que sempre desejei, ser reconhecido. Aquele discurso de Robson serviu para que eu tivesse a certeza absoluta do que sempre quis. Estou no meu caminho, na direção certa. 
***

Quando chego finalmente em casa me sinto um pouco cansado, mas morrendo de saudade da minha namorada. Tomo um banho rápido e me visto mais rápido ainda, preciso chegar à casa de Robson para vê-la. 

Quando abro a porta para sair, me deparo com Ella já me esperando na porta pronta para tocar a campainha. Parece que sentiu minha falta, tanto quanto senti a dela. Mas sua expressão não transmite a mesma empolgação que eu, ao vê-la. Está distante e apreensiva. 

—Ella? —A abraço pela cintura. Minha namorada recebe o meu abraço e eu a beijo no rosto. Seus lábios se desviam quando tento beijar sua boca, mas não rudemente, apenas um desencontro de intensões. —Já estava indo até a sua casa, estava com saudades. —Sorri de lado, sem empolgação. —Aconteceu alguma coisa?

Ela balança a cabeça em negativo e caminha trôpega para dentro do apartamento. 

—Queria ir ao grupo de apoio esta noite. Pode me levar? —Vira-se para mim. Seu pedido me alegra, porém sei que algo a perturba profundamente. 

—Claro. Mas achei que não iria mais depois da última noite. 

—Não queria, só que percebi que ainda preciso. Me livrei de boa parte do que me aprisionava, porém tudo que preciso agora é deixar tudo para trás, e só esta noite será capaz de fazer isto acontecer. —A encaro apreensivo. 

Algo dentro de mim me diz que Ella não estaria a fim de só ouvir histórias. Será que desta vez eu conheceria tudo que a minha menina passou no internato? Esperei tanto por este momento que agora parece que não estou muito preparado. 

—Podemos conversar, Ella. Não precisa se expor. —Percebo que engole algo que aperta a sua garganta, seus olhos brilham com intensidade, mas sei que são camadas de lágrimas que se formam. 

—Não, não! Tenho que ser do meu jeito, Michael. Só assim eu terei coragem. 

Só de pensar sobre o assunto ela já sofre tanto, não quero nem imaginar como será colocar para fora tudo que a angustia. Minha menina chorando aperta meu coração, me faz sofrer também. Queria que não existissem estas turbulências entre nós, mas tenho uma leve impressão que é apenas o começo. 

Relaxo os meus ombros em desânimo caminhando para próximo, afim de abraçá-la. Beijo o topo de sua cabeça, lhe passando um pouco de apoio. Ella beija o meu peito e vejo que seu corpo relaxa com o meu carinho.

É somente o tempo de pegar o meu casaco e irmos juntos para o lugar. Como Robson disponibilizou carros para que eu pudesse dirigir, não demoramos muito para chegar ao centro. 

Pessoas estão contando suas histórias, enquanto Ella e eu nos acomodamos. Havíamos chegado atrasados. 

A sala está bem mais cheia do que no último dia em que estivemos ali. Pessoas das quais ainda não havia conhecido. Um quadro negro emoldura a parede atrás, na parede. Um quadro onde está escrito os horários das reuniões. Percebo que o lugar era uma espécie de colégio, ou cursos extra escolares, algo que soa que uma grande turma aprendia ali, e que agora serve como incentivo à pessoas com problemas. Tanto com vícios, como problemas pessoais, como no caso de Ella. 

O gordinho do dia anterior, está discursando. Como chegamos atrasados, não ouvimos o começo da história, mas já está na parte onde dizia que havia assassinado um cara por causa dos vícios. Passara alguns anos na cadeia, mas que ainda não largou do vício. Era uma tarefa complicada para ele, mas ao menos está tentando, tomando a atitude de buscar por ajuda. 

Ella está no mesmo estado em que esteve antes; trêmula e amedrontada. Sua mão está suando entre os meus dedos. É como se gritasse por ajuda por dentro. Quando o moço se senta a assistente social pergunta quem quer ser o próximo a falar. Sinto a mão de Ella escapar da minha abruptamente, fica por cima de seus pés em uma velocidade impressionante, como se não fizer de uma vez, não seria capaz de fazer de novo, pois não teria mais a mesma coragem. Não sei, estou receoso. Sei que vou entender definitivamente tudo que Ella passou naquele inferno, pois é assim que aquele lugar se tornou para ela. Não sei o que esperar, mas também não sei se estou preparado para saber. Tenho uma ideia, mas sei que a minha ideia é bem inferior do que provavelmente ela tenha passado de fato.

Ella caminha em passos duros e lentos até o centro do círculo, depois vira-se para nós. Seus olhos estão secos, mas sei que é questão de tempo para desabar tudo de novo. Meu coração está acelerado. Todas àquelas pessoas que estão ao nosso redor se tornam pequenas e somente Ella, é visível aos meus olhos. Preciso prestar atenção e passar confiança para ela através dos meus olhos. 

—Pode começar. —Recebe permissão para falar. Ella toma uma lufada de ar. Suas mãos estão abrindo e fechando, abrindo e fechando. Um tique nervoso. 

Tento por diversas vezes balbuciar um "Vai dar tudo certo" "Fique calma" "estou aqui com você", porém não consigo. Ella nem ao menos olha para mim, encara um ponto fixo ao nada e sei que está querendo evitar o meu olhar. Como se me olhasse, também não teria coragem de abrir a boca. 

—Meu nome é Ella Robson, tenho vinte e seis anos. Nascida em San Diego, mas criada na França. —Sua voz é baixa, parece um bichinho indefeso. Luto contra os meus instintos para não ir até ela e abraça-la. Me tornei um protetor e gosto deste papel, porém precisa cumprir com o que deseja e se livrar. 

—Quando tinha seis anos, recebo a notícias que minha mãe havia falecido, comedida de um câncer mamário. Eu era apenas uma criança sem saber direito o que havia acontecido, estava atordoada. Mas eu tinha a certeza absoluta de que minha vida poderia mudar para sempre depois daquele momento. 

Abaixo a cabeça, conheço aquela história. Parece que o que também vivi, quando minha mãe se foi, volta à tona. Conheço aquelas dores e o sentimento de desolação. Como seguiremos? E, como viveremos? 

—Eu estava certa. —Respira fundo, continua a olhar para um ponto fixo. Um riso sem humor saiu da sua boca, mas logo fica séria. —Fui obrigada a viver em um internato ao redores da França a mando do meu pai. Ele por mais que sustentasse uma vida luxuosa e cheia de conforto, preferiu que eu fosse criada por outras pessoas que nem ao menos conhecia. Uma criança sozinha que acabava de perder a mãe em um lugar desconhecido, acreditem, por mais que pareça difícil, não chega nem perto do que houve em minha vida a seguir, durante uma sucessão de vezes. 

Logo minha mente imagina os maus-tratos, punições e correções severas. Algo que pudesse justificar as marcas de hematomas no corpo de Ella. Cicatrizes que percebi em seus seios e ventre durante nossa primeira relação sexual. Já começo a me irar, a partir daí. 

—Estudávamos na parte da manhã com ensinamentos normais que qualquer criança aprende na escola, e durante à tarde, praticávamos exercícios extras curriculares, como; aula de piano, artes, música e qualquer outra coisa que você quisesse estudar. Sempre preferi ficar trancada no meu quarto, pois eu não suportava encarar o dia e nem o sol lá fora. Tudo parecia negro para mim, como a minha alma havia se tornado. 

Acho que minha expressão distorce em pensar nesta hora, preciso lhe balbuciar algo, mas Ella não olha para mim de jeito nenhum. 




Ouçam a partir daqui

—Uma vez, joguei tinta vermelha no chão quando fui pintar o meu quadro na aula de artes. A tinta sujou completamente o carpete branquíssimo da sala de aula. Fui mandada a puxões de cabelo para "a sala do castigo" que as freiras caracterizaram para nós. Lá seria o nosso calvário. —Ella respira fundo de novo, sua voz está calmíssima, mas noto que está trêmula. As pessoas ao redor não fazem nenhum mínimo de barulho, prestam atenção nela, provavelmente já deduzindo o que acontecera. —Eram proferidos a mim todos os tipos de xingamentos e ofensas. Coisas como " aqui filha de papai não tem moleza" ou "pensa que está em um palácio, princesa?". —Sua voz embarga, mas ela segura firme para não desabar. 

Deve ser horrível voltar ao passado, provavelmente a lembrança da voz daquela mulher preenchendo seus ouvidos lhe causa dor.

—Eu não queria me comportar como nenhuma princesa, ou alguém de dinheiro. Apenas queria voltar pra casa. —Respira fundo, buscando o controle da voz. —Eu tinha acabado de chegar quando recebo o primeiro flagelo. Eram correias grossas e grandes, elas atravessavam todo o meu corpo com apenas um chicote. 

Aperto as minhas mãos, parece que sinto a dor daquela criança sofrendo. Começo a sentir raiva, estou desconfortável, mas sei que é só o começo. 

—Eram dores terríveis, que queimavam o meu corpo, ardiam a minha pele parecendo que haviam aberto as feridas e temperado com sal, como fazem com carne de churrasco. 

Olho para o lado e o moço mais próximo aperta os olhos, acho que também imagina a dor. 

—Eu não conseguia dormir de tanta dor, fazendo-me repetir um mantra constantemente de que jamais deixaria nada cair ao chão de novo. Mas aquilo acabou de perder a importância quando sou mandada para àquele lugar novamente. Quando estava gripada e não conseguia parar de fungar o nariz. Estava atrapalhando a aula e eu também fui punida. 

Solto um palavrão mentalmente! Não é possível que Ella era castigadas por conta de coisas banais. Tinta no carpete a agora por fungar o nariz? Percebo que meu maxilar está tremendo de raiva. Tento controlar, mas estou inquieto demais. Uma vontade insana de punir os culpados. 

—Os castigos eram os mesmos sempre. Era levada para a sala do castigo e açoitada, xingada e pressionada psicologicamente. 

Começo entendê-la, a sua revolta, a sua fragilidade. Sua vontade em se livrar daquele passado de merda, das suas dores dos medos e dos pesadelos. Se eu soubesse que foi por isso que a mulher que amo foi submetida, eu jamais teria gritado com ela quando estava se drogando. Não é justificável, mas também seria uma ação bem provável levando em conta tudo que passou. Eu teria tentado ajudá-la invés de julgá-la e dizer que estava machucando o seu pai. Me sinto um estúpido. 

—Eu já estava acostumada, de verdade. Já sabia o que me esperava na mínima ação banal que faria. Mas acredite, sempre piora. —Solta mais um riso sem humor. 

Acho que continuo despreparado para ouvir o pior. Se este não fora o pior, não sei como denominá-lo, estou nervoso, muito mesmo. Fecho os olhos, estou muito duro sentado naquela cadeira. Meu ar está um pouco escarço, mas necessito de saber de tudo. 

Abro os meus olhos de repente para olhá-la, assim que escuto um barulho alto do seu choro. Desta vez Ella não consegue se recompor, seus olhos está marejados, consequentemente os meus também ficam. A dor que ela sente é transferida para mim. É como uma ferida que sangra sem parar, todas às vezes que mexe.

—Eu estava com doze anos quando tudo começou. —A voz de Ella está embargada e sinto meu peito pular. —Aquela sala era assustadora. Escura e sempre acontecia às 22:00. As velas eram a nossa única fonte de iluminação, os quadros de Jesus e o sacrifícios fazia o meu coração tremer. Sou colocada em uma maca de aço e amarrada, meus pés e meus braços. Aquela velha me olhava com um riso medonho. 

Madre Bianca! Jamais esqueceria este nome. 

—Ela gritava para mim algo como: "Quer saber como viemos ao mundo?" Quando eu não respondia nada, era espancada e incitada a responder. Responda princesinha desgraçada! Ela dizia. 

Aperto ainda mais as minhas mãos, desta vez com mais força. Não quero ouvir o que estou imaginando. 

—Minha única opção é falar que queria, eu não tinha outra, ou era espancada de novo. "vai ser muito bom, princesinha, você vai ver. Foi a criação do nosso Deus." Uma tesoura é pega de dentro de uma gaveta e ela começa a cortas as minhas roupas, fico nua e completamente exposta. 

O urro que solto fica preso na garganta, estou em descontrole Ella está chorando. Parece um pesadelo, me sinto em um filme de terror, ou algo ainda pior, era a realidade e aconteceu com a mulher que amo. 

Pela primeira vez Ella me encara de cabeça erguida, porém seus olhos estão vermelhos, e uma enxurrada de lágrimas escorre de seus belos olhos verdes. Faço cara de choro, não consigo mais segurar, sei que o que está por vir é forte e não encontro forças para lidar com isto. 

—Começo a chorar, imploro por misericórdia, mas todas as minhas súplicas são ignoradas. Não sei porque estava sendo punida daquela forma. Pensei por diversas vezes que eu deveria ser culpada pela morte da minha mãe, era a única explicação que me restou para entender tudo que vivi. —Seu choro está exprimido. O único som ouvido, era os eu choro angustiado, desesperado. A muito custo ela engole o choro e volta a falar: — Vejo uma espécie de bastão sendo pego e revelado a mim. Madre Bianca diz que é uma coisa como aquela que os homens têm entre as pernas e eu sentiria a sensação que uma mulher sente quando estão transando. 

Tenho uma parada cardíaca em questão de segundos. Sinto-me tonto, falta de ar, respiro, respiro, mas não adianta de nada. Sinto que estou sendo levado para outra dimensão, os meus pés não têm mais apoio, estou caindo em queda livre. É o que aquelas palavras me rementem. 

—Recebo um golpe forte entre as minhas pernas. —Seu choro vem com tudo. Inclino minha cabeça em direção aos joelhos, uma tentativa de não ouvir aquilo. Uma raiva me consume de uma tal maneira que começo a chorar, meu corpo chacoalha e eu não tenho mais controle sobre mim. 

Ella, a minha Ella. Aquela moça linda e frágil, aquela mesma moça ao qual fiquei incumbido de ficar em sua cola, que imediatamente tive uma necessidade absurda em ajudá-la a superar a sua dor. Ao qual sempre pensei, que por mais que fossem dolorosas, ela seria capaz de superar. Vejo que não é bem assim, Ella fora torturada e estuprada cruelmente por uma desgraçada que invés de cuidar dela, a aterrorizou. Comentando atrocidades, para tentar manter o controle de algo que pensava que tinha algum tipo de controle. Uma filha da puta que se chama de santa, mas é o diabo em pessoa. Tenho ódio, muito ódio. Se encontrasse com essa desgraçada eu a mataria com as minhas próprias mãos. Nunca me senti tão desolado na vida, parece que uma massa de obscuridade havia pairado sobre mim, tudo fica sem graça, como se nunca mais fosse feliz de novo. Era perturbador, pior, desesperador. 

—Recebo mais outro, outro... outro. —Suspira exausta. —É uma dor insuportável. —Ella desaba em um choro atormentado, quero abraçá-la bem forte. —Começo a sangrar, mas Madre Bianca diz que somente as virgens são aceitas para o ritual. Ela começa a falar em latim, e os risos envolta de mim é horroroso. Aparecem mais duas freiras e um homem, eles começam a terem relações diante de mim. A sensação que dava é que viria o diabo em minha frente a qualquer momento.

Salto na cadeira. NÃO QUERO MAIS OUVIR ISTO! Saio pela porta sem dar explicação de nada, ouço Ella chorar bem alto. Encontro a saída, está uma chuva bem forte lá fora. A rua está deserta e escura, mas não era pior do que o que eu sinto por dentro. Estar em frangalhos era bem pouco diante do que estou sentindo. Estou desesperado, louco para esganar, ávido por justiça. Uma sede que necessito ser saciado. Tudo em minha volta roda, e minhas pernas perdem a força. 

—Michael! —Ouço meu nome sendo chamado bem alto atrás de mim. Viro o meu corpo e a encaro.

Minha Ella está com a expressão sofrida, mas não era por menos. Seu corpinho todo delicado havia passando por traumas ainda piores do que imaginei. Me sinto culpado por não conhecer a história antes. É como se eu tivesse ignorando tudo que havia acontecido com ela, mesmo sabendo que não era a minha intensão. Se eu tivesse feito falar, se eu tivesse imaginando antes, eu teria agido de outra forma. Sinto ódio de Robson, aquele filho da puta a mandou para uma porra de abatedouro, um cenário sombrio com uma sujeira impregnada por todos os lugares, que minha mente remete. Ódio, ódio e ódio. 

Ponho a mão na cabeça, começo a chorar alto, o desespero é bem maior do que posso suportar. A mulher que amo está em minha frente e eu não posso fazer nada para apagar aquele passado. Caio de joelhos diante dela, meu choro vira berros, minha garganta dói, mas só dessa forma que consigo liberar toda a angustia que me envolvia por dentro, massacrando a minha alma. Puxo Ella pela cintura aproximando a de mim. Encosto minha cabeça em sua barriga. Só quero que sinta meu amor, preciso me render àquele pesadelo que Ella viveu por anos e anos. A chuva nos molha, nossos choros se encontram com força total, mas nada daquilo fora capaz de lavar as nossas almas. 







Capítulo 17 —Ella Robson


Me aninho no corpo de Michael enquanto ele dirige de volta para o seu apartamento. Está um silêncio insuportável, ele está muito sério e distante. Eu quero que fale alguma coisa, qualquer coisa que me fizesse saber o que passa pela sua cabeça. Mas tudo que recebo de volta, fora um escuro terrível. 

Sei que toda aquela revelação o abalou demais, posso entendê-lo e saber o que deva estar passando em sua mente. Mas eu preciso ouvir qualquer coisa que confortasse o meu coração, não importa, eu só preciso ouvir sua voz, e o que pensa. 

Vê-lo se desesperar daquele jeito fora como uma adaga perfurar o meu coração. Nunca imaginei que a reação de alguém fosse esta quando soubesse. Meu pai talvez, ou alguém que me conhecesse tão bem. Michael me ama, e era bem claro para qualquer um que enxergasse, até mesmo os cegos sabiam. Porém aquela dor me desestruturou, me dá medo. Não sei do que seria capaz de fazer, temo pelos dias que se seguiriam. 

Chegamos em casa, em sua casa. Continua o silêncio medonho. Michael coloca a chaves do carro em cima da bancada ao lado da porta. A chuva ainda está muito forte lá fora e estamos encharcados. Acho que era um reflexo do que passa-se dentro de nós.

—Tome um banho, senão ficará resfriada. 

É só o que consigo ouvir de sua boca até agora, mas mesmo assim não é suficiente. Sua voz está fria, bastante "a quem". Não sinto a envolvência costumeira, aquele toque aveludado que me acolhe quando fico em turbulência. Sinto um golpe no estômago e outro no coração, esfrego a mão para passar, mas é inútil. 

Maneio a cabeça e vou para o banho com o coração pesado. 

Me dispo das roupas molhadas indo para o chuveiro em seguida. A água quente aquece o meu corpo do frio, é uma sensação boa de conforto. Mas sei que é apenas exterior, porque por dentro continuo gelada. Por um momento penso que Michael entraria pela porta e compartilharia aquele banho comigo. Ele está molhado como eu e tenho esperanças. Só que elas dissipam quando estou quase terminando e nem vejo sinal. Estou com vontade de chorar, sei que seria assim quando soubesse, sentiria nojo de mim. Às vezes até eu mesma sinto nojo de mim, quanto mais um homem que acaba de me conhecer na íntegra. 

Fecho o registro, e espero a água escorrer pelo meu corpo, para só assim, enrolar-me na toalha. Quando saio do banheiro, Michael está usando somente uma cueca, sentado no sofá. Pensativo, distante. 

—Vá se banhar também. Ainda está molhado. —Minha voz chama-lhe atenção e ele assente. 

Levanta-se do sofá caminhando rumo ao banheiro. Tento lhe dizer algo, mas passa por mim tão rápido que não consigo. Um nó se forma na minha garganta e não posso desfazê-lo. 

Vou para o quarto. Há uma roupa cuidadosamente arrumada para mim em cima da sua cama. Era sua camisa e um short meu. Não sei como uma peça minha fora parar lá, mas de qualquer forma a descarto a procura de uma cueca sua no armário, preciso ter contato com sua pele e seu cheiro intimamente. Não queria ter nenhuma distância entre nós, apesar de que é isto que tínhamos agora. Sua boxer cabe bem nos meus quadris apesar de um pouco folgada, não me importo. Penteio os meus cabelos antes de secá-los muito. 

Michael aparece pelo quarto e troca de roupa sem dar um piu. Não tenho coragem de pedir atenção e nem começar a conversa. 

—Vou preparar algo para comermos, deve se alimentar, Ella. Não comeu nada até agora. —Ele está preocupado com a minha saúde, este era um ponto positivo, porém ainda não é o suficiente. 

—Não estou com fome. Pode comer se quiser. —Ele nega com a cabeça.

—Estou sem fome também. 

A energia acaba, deixando-nos em um completo breu, só a luz da lua é capaz de nos iluminar. Mas nem este acontecido nos faz ter uma conversa sensata que não fosse apenas para que eu tomasse um banho ou me alimentasse. 

Quando fomos deitar, me aninho em seus braços, bem aconchegada em seu peito, Michael fez questão que eu fizesse. Sinto um pouco de alívio, mas ainda preciso tocar no assunto. Continua em silêncio me deixando cada vez mais perturbada. 

Sei que não está dormindo, seus olhos fitavam o teto, permanece duro incapaz de se mover. Deposito um beijo em seu peito na tentativa de aproxima-lo, dá certo porque sinto um beijo no topo da minha cabeça. Acho que consigo fazer com que se interaja comigo. 

—Está tão calado. Queria saber o que passa em seus pensamentos neste momento. —Levanto a cabeça para fitar os seus olhos. Michael sorri um pouco sem vontade. 

—Não há nada de bom nos meus pensamentos agora, Ella. —Sinto a dor daquela frase, meu peito se comprime. 

Levanto-me, ficando sentada em cima da cama, para conversar com ele olhando em seus olhos. Queria muito ter aquela conversa. 

—Eu sei que não deve ter sido fácil pra você ouvir aquele tipo de discurso, e daquele jeito. Mas foi a única forma que consegui para poder falar. —Michael faz o mesmo que eu, senta-se na cama, encostando a costas na cabeceira. 

—Não foi fácil para mim? Me diga sobre você! Todos esses anos sofrendo o que sofreu. Agora entendo aqueles pesadelos, todo o seu medo. Sinto tanto ódio que parece que vou pirar. —Aproximo o meu corpo do seu, aliso suas pernas desnudas, os pelos de suas pernas anelam em meus dedos. 

—Realmente foi um pesadelo para mim durante muitos anos, mas sei que vou ficar bem. Eu só não consigo me sentir bem diante desse seu silêncio. Não quero que nosso relacionamento se abale por conta do que eu disse. Deve ser horrível eu sei, mas não quero que sinta nojo de mim. —O nó na garganta volta com força bruta, e por pouco não choro. 

—Ella eu sinto tudo neste momento, menos nojo de você. —Suas palavras são sinceras e deixo uma lágrima escorrer dos meus olhos por conta da angustia. —Como você pode pensar uma coisa dessas? 

—Não sei, Michael. Eu sei o quanto deve ser perturbador descobrir que a mulher que você foi pra cama possui alguma marca repugnante em seu corpo. —Ele ri sem humor, balança a cabeça por várias vezes, apresenta incredulidade. 

—A única repugnância que sinto, são dessas desgraçadas que fizeram isto com você, ainda mais agora sabendo o quanto você se sente culpada quando a verdadeira culpa são delas, daquelas mulheres que deveriam ter lhe protegido. —Suas mãos estão fechadas com força e sei o quanto está com ódio. —Elas devem pagar, Ella. Por tudo que fizeram, não vou descansar até ver este dia chegar. 

Arregalo os olhos e começo a fica inquieta. Michael está revoltado e uma pessoa revoltada faz qualquer coisa. Começo a ficar apreensiva.

—Michael, por favor, deixa esta história pra lá, eu já esqueci. Só contei mesmo porque você deveria saber. Não é para mexer nisto de novo. —Seu olhar é obstinado quando olha para mim, a claridade do relâmpago me faz perceber. Me tremo toda. 

—Que bom que você esqueceu, Ella. É a melhor coisa que você faz, seguir a vida e se livrar de uma dor que não é sua, que foi imposta a você. Mas eu não esqueci e nem vou, até vê-los todos os responsáveis atrás das grades. Pode demorar, anos, mês, não sei, não importa. Mas este dia há de chegar.

Eu sei que este seria o seu desejo assim que Michael soubesse. Ele tem essa sede de justiça que o faz ter ânsia em seguir em frente em suas decisões. Não posso dizer que não passou pela minha cabeça que ele tomasse tal decisão, porque fora um dos motivos que tive medo de contá-lo. Mas assim, desta forma. Ter a certeza que faria algo para que os culpados pagassem me deixa toda angustiada. Michael me ama demais para deixar de lado, este é o meu desespero. 

—Por favor, Michael, pense bem. Aquele lugar é protegido, eles têm um fortíssimo poder em esconder as coisas. São protegidos pela lei e, para todos os efeitos, é o melhor colégio da França. Eles guardam seus segredos à sete chaves, nada irá fazer qualquer pessoa acreditar sobre o que acontece lá. —Suspira vencido, senti um alívio, pois pareceu que iria desistir. 

—Nunca ninguém os denunciou? Não pode ter acontecido somente com você. —Balanço a cabeça em negativo.

—Não, elas nos ameaçavam. O terror que nos fazem sentir, o poder psicológico que exercem sobre nós é suficientemente neutralizador. Não somos capazes de abrir a boca. 

—Droga! Tem que ter um jeito, e eu vou descobrir como. Não vai ficar assim. —Seguro sua mão confirmando que seria capaz de fazer qualquer coisa por mim, mas sinto medo por ele, não quero que sua vida desmorone por minha causa. 

—Não quero pensar sobre isso agora. Só quero ficar com você, sentir você. Tudo que mais quero é ter seu amor de volta, saber que tudo ficará bem entre nós. Quero sentir a sensação de ama-lo mesmo depois de tudo que sabe. 

Michael balança a cabeça em negativo, está me rejeitando e doía tanto notar, que era como uma faca me cortando toda. 

—Não consigo acreditar que ainda me quer. Ella, eu transei com você mesmo depois de tudo que houve. Me sinto um idiota, um bruto. Você deveria era ter me mandado embora após ousar a achar que teríamos algo íntimo. —Uma gota de lágrima pinga na minha mão. 

—Não, não, não! O seu amor me curou, Michael. Me sinto livre, como uma libertação. Eu tenho a marca do seu amor agora, foi como um renascer. Tudo que preciso é do seu amor, quero ter certeza que estamos bem. —Seus dedos cumpridos e masculinos tocam em meu queixo, fico toda arrepiada com aquele toque carinhoso que foi me dado. Sinto realmente que está tudo bem entre nós. 

—É claro que está tudo bem, eu te amo. Te amo mais que minha própria vida, é sério. Pode parecer bobo, mas é verdade. Só não quero machucá-la ainda mais. Eu não suportaria, entende? —O nó de antes foi se derretendo, no lugar esperança e amor. Meu corpo é envolvido por uma euforia reconfortante. 

—A última coisa que você faria é me machucar. Você é o amor da minha vida, o homem que me fez sentir todos os tipos de sentimentos bons que eu jamais experimentei em toda a minha vida. Um homem disposto a me ajudar a cuidar de mim. Acha mesmo que seria capaz de me machucar? Não, Michael, seu amor é capaz de me curar. Levar embora tudo de ruim que um dia experimentei. 

Meu amor está emocionado, posso ver o jeito que respira, seus batimentos cardíacos aceleraram quando o toco. Talvez seja tudo que Michael gostaria de ouvir de mim. 

—Eu te amo tanto, Ella. Tanto mais tanto, que chega a doer. —Meu sorriso é encantado, fascinado. Estou tão apaixonada quanto. Meu coração acelera de paixão e eu pulo para o seu colo, me sentando perfeitamente em seu colo.

Ele me ampara bem em seus braços, sinto o quentura gostosa do seu peito desnudo. Começo a me sentir em segurança de novo. Nossas testas se encostam, na costumeira aproximação que venhamos compartilhando. Seu coração está tão acelerado quanto o meu. 

Estou ávida por seus beijos, ansiosa pelo seu corpo, é quase insuportável. Michael retira a camisa do meu corpo, sou perscrutada com cuidado, seus dedos esfregam nas minhas cicatrizes, é como se fizesse uma análise. Aquilo me incomoda, mas sei que é importante, é o jeito dele de cuidar de mim. 

—Uma menina tão frágil. Sinto raiva de tudo. —Seguro sua nuca trazendo seus lábios para os meus, começo dar beijos em sua boca. Tentar desfocar os seus pensamentos. 

—Sou forte, Michael. Muito. —Ele assente. 

—Eu sei que é, e me orgulho disto. —Meu nariz é beijado. 

Me agarro em sua cintura, este ato faz com que minha intimidade roça em seu pênis e meus seios colam em seu peito duro. Necessito demais naquele homem, do seu corpo, do seu amor. Nossas bocas apreciam, se envolvem se comem. O gosto suave da sua boca desperta o meu prazer, o jeito com que me pega, a forma como me aperta em seu corpo me faz tremer. O amor que sinto chega a doer. 

Sua mão escorrega para dentro da cueca em que estou usando, me levanto para que ele a tirasse do meu corpo. Estou nua, toda molhada querendo demais que me invadisse. 

—Você toda gostosinha e eu morrendo de medo de machucar você. —Ele Morde o meu lábio de um jeito sensual que fazem as minhas pernas amolecerem. 

—Você seria incapaz de me machucar. 

Meu corpo é erguido e deitado na cama. Ele sobe em cima de mim, depositando seu peso sobre o meu. Abro minhas pernas para poder acomoda-lo melhor. Enfio minhas mãos dentro da sua cueca, única peça que está vestido, a retiro até a metade da sua coxa. Estou ansiosa para senti-lo. 

Michael começa a adentrar-me aos poucos, com muito cuidado, sei que ainda está receoso, porém estou necessitada. Envolvo minhas pernas em sua cintura conectando-nos. Seu pênis escorrega para dentro de mim ainda mais, solto um suspiro de prazer. Meu pescoço é atacado por beijos, minhas cicatrizes são acariciadas por ele, nunca me senti tão amada como naquele momento. 

Seus movimentos começam bem lentos, mesmo assim está muito gostoso. Ataco sua boca beijando-o com força aos ritmos daquela transa. Estou ofegante, amando e sendo amada. Estou tão emocionada, fora de órbita. Suas mãos sobem para os meus seios, são apertados, mas com muita delicadeza. Sinto-o mais fundo, alargando-me. Ele é enorme, e viril. Minha virilha dói pelo peso do seu quadril, mas é suportável. 

—Sim eu seria incapaz. —Ele suspira. Urra de prazer. —Você é um anjo, uma menina delicada, Ella, não deveria ter sofrido tanto. 

Sua cabeça enterra no meu pescoço, sou beijada naquela área. Pouso minhas mãos em seu bumbum sentindo seus músculos enrijecerem por conta o esforço em arremeter dentro de mim. Ele é lindo, tão sexy que perco o ar, misturado com o prazer natural daquela transa. Sinto tudo se agitar dentro de mim, uma onda boa, um relaxamento. Sei que está tudo bem entre nós, sinto o amor do homem que amo, não há mais nada o que temer. 

—Não estou sofrendo agora, tenho o seu amor. Ele é o suficiente para mim. —Sua língua invade a minha boca com uma fome impressionante, Tento acompanhar aquele beijo repleto de intensidade. Estou sem ar, extasiada, entorpecida de amor.

—Você é o suficiente para mim. —Sussurra no meu ouvido.

Michael está mais calmo agora, não se sente culpado ou nada do tipo. Investe com mais força, seu pênis entra e sai em descontrole, estou perdendo o juízo. Meu gemido vai ficando cada vez mais alto. Cravo minhas unhas em suas costas. Ele urra, seu suor começa a pingar. Adoro seu cheiro, adoro o seu corpo, seu pau. Adoro ele. 

—Michael. —Chamo por seu nome, clamo por mais. 

—Ella! —Ele rosna. Sua barriga se choca com a minha, a cama range, estou no meu limite. 

Seus músculos paralisam e em um gemido profundo, Michael goza lindamente dentro de mim. Não consigo aguentar aquela onda de sensação, me desfaço com força, minha cabeça roda, entro em parafuso. Me sinto muito melhor, amada e finalmente próxima do homem que amo.












Capítulo 18




Seu corpo está em repouso, parece serena, em paz. Jamais interromperia este momento para acordá-la. Fora uma noite repleta de emoções, o maior tempo de conforto e tranquilidade que podia ter para mim melhor.

Percorro os meus dedos superficialmente por suas cicatrizes nas costas. Me revolta, estou com uma sensação de raiva quase intoxicante. Eu preciso fazer alguma coisa. Ella se movimenta um pouco, logo deixo-a em paz. Tenho outros assuntos para resolver nesta amanhã. 

Depois da minha higiene matinal, preparo um café da manhã para Ella, me arrumo e vou para empresa, não estou a fim de trabalhar, mas de pedir algo para o meu chefe. Aquela ideia não sai da minha cabeça desde que acordei, e só Robert poderia me ajudar com o que preciso neste momento. Não vou deixar esta história como está, jamais vou fechar os meus olhos para o que aconteceu. Os responsáveis iriam pagar, e eu correrei atrás do que for preciso para que isso acontecesse. Nem que para isso eu teria que atravessar o outro lado do mundo. 

—Michael! —Vince aparece pelo meu caminho assim que faço menção de pegar o elevador. Não quero ser ignorante, mas o meu humor está péssimo. —Quem diria que se tornaria o diretor-geral, não acha? Tantos anos sonhando, Robson fazendo pegadinha, te desviando do caminho. —Gesticula com a mão como uma curva. —Mas em fim conseguiu.

—É, Vince, consegui. —Sorrio sem graça louco para entrar no elevador. 

—Mas não parece animado. O que houve? 

—Preciso conversar com o Robson, coisas importantes. Estou um pouco atrasado. 

—Ah! Então pode passar, não quero atrapalhar. —Abre espaço para que eu passe. Agradeço com o maneio de cabeça. —Boa sorte, bro. Seja feliz. 

Eu deveria agradecer por ter tantas pessoas me apoiando, felizes com o meu sucesso, no entanto estão tão perturbado que não consigo sentir ânimo em nada. Era para eu ir à empresa trabalhar, começar os meus planos, pôr os meus projetos em prática, colocar aquela área de publicidade à todo vapor, mas acabo esquecendo de tudo. Não encontro vontade e muito menos tenho saco para aturar elogios agora. Só preciso estar frente a frente com Robson.

Meu sogro me recebe com a simpatia costumeira, não sorrio, estou com raiva dele também. Sua negligência é que me dá nojo, porém não é este motivo que me fez ir até lá.

—Estou providenciando alguns computadores novos, toda a parafernália de criação e divulgação que você merece. Logo está chegando por aí. Quero tudo do bom e do melhor para o meu genro. —Forço os meus lábios se abrirem, acho que dá para notar que é forçado, não sei esconder quando algo me desagrada. 

—Muito obrigado, senhor Robson, mas vir por outro motivo. —Ele desfaz o sorriso simpático, parece que se preocupa. 

—Aconteceu alguma coisa? Ella está bem? 

—Não, não, não aconteceu nada com a Ella, não se preocupe. Só preciso lhe pedir algo. 

—Pode dizer. —Se arruma em sua cadeira, puxa o seu terno elegantemente para se ajeitar ao corpo esperando que eu falasse. 

—Se importa se eu ficar alguns dias sem aparecer? É que preciso muito fazer uma viagem. Uns três dias no máximo, só pra visitar os meus parentes em outra cidade. —Robson franze o cenho.

—Seus parentes? Pensei que não tivesse ninguém. —E não tenho mesmo, só não encontrei uma desculpa melhor. 

—Sabe como é, né? Às vezes ficamos longe demais da nossa família e é como se estivéssemos sozinhos no mundo. Mas estão precisando de mim no momento e eu não posso recusar. 

—Não, sim, sim, claro. Vá até a agencia de viagens no centro, peça uma passagem para qualquer lugar que quiser no meu nome. Está liberado para visitá-los. 

Bingo! Era exatamente isto que queria. Não tinha nenhuma condição no momento em fazer uma viagem desta, acabei de subir de cargo e não recebi o valor correspondente do meu trabalho. Agora com as condições de Robson eu poderia fazer o que precisava. Ele jamais me deixaria ir sem me ajudar, eu sabia direitinho que disponibilizaria para mim aquelas passagens.

—Muito obrigado, senhor, está me ajudando muito. 

—Ora, Michael, não me chame de senhor. Sou Robert, seu sogro. —Ele pisca, tento sorrir de novo, mas não vai. 

—Como desejar Robert. —Entono o nome um pouco rude, sem que ele perceba. 

Me levanto da cadeira, ele começa a escrever algo em um papel, como sabe que estou prestes a sair, nem liga mais para mim. Encaro com muita revolta. Em pensar que as coisas que aconteceram a Ella pudessem ter sido evitadas se ele fosse um pai melhor é o que mais irrita. Quero abrir a boca, mas desisto. Abro a porta e sigo o meu caminho. 
***



Nunca fui tão bem tratado em toda a minha vida antes, quanto naquela agencia. Acho que quando virei as costas Robson fez uma ligação, pois recebi toda uma atenção de rei. Pedi uma passagem para França, ida e volta tudo na conta do meu chefe e agora sogro. Mas não foi somente isto. Até o hotel foi disponibilizado para mim, com toda a mordomia que uma pessoa possa sonhar em ter. O que achei uma beleza, pois quando chegasse a França não quero me preocupar com nada a não ser fazer o que tinha que fazer.

Sei o quanto Ella ficará brava comigo quando souber que fui a França tirar aquela história a limpo. Mas estou obstinado demais para recuar, mesmo se ela implorasse. Não seria eu se deixasse como está. As marcas que Ella carrega no corpo, aquele trauma, os momentos de horror que teve de passar, tudo isso me leva a seguir em frente em busca de justiça. Passei muito tempo me perguntando o que poderia fazer para ver Ella sorrir de verdade, para vê-la mais feliz e esquecer. Sei que não irá apagar o passado, mas farei o que estava ao meu alcance para colocar os responsáveis atrás das grades. 

Quando chego ao apartamento não há mais ninguém Ella deve ter ido embora. Aproveito para arrumar as minhas coisas, muito pouca coisa, apenas para ter o que usar durante os três dias. 

Escrevo um bilhete a punho quando estou prestes a sair de casa e deixo entre as frestas da porta para quando Ella fosse me ver, soubesse onde eu estava. 
" Sabe como sou, não consigo lidar com o fato de que há tanta gente ruim à solta fazendo suas vítimas sem controle algum. Uma vez você disse que espécie de pessoa sou, referindo-me como um anjo. Tenho uma resposta para lhe dizer: Sou um ser humano mais vivo do que nunca, e o coração que pulsa no meu peito não me permite que fique de braços cruzados, ou enfurnado na empresa planejando uma logomarca para os clientes, ou ficar ao seu lado martirizando, com lamúrias que não nos levaria a lugar algum. O ser humano que sou me faz mentir para o meu chefe dizendo que apenas vou visitar uns parentes para que ele me ofereça passagens para a França e busque por justiça. O planejado seria três dias, mas se caso não der, ficarei por um ano, mas não voltarei sem antes cumprir com o que vou fazer. É Ella, eu sinto muito, o homem que você escolheu para sua vida é um babaca sentimental que não vai descansar até vê-la sorrir com sinceridade" -MJ

Dobro o pedaço de papel e impresso na porta. Coloco a mochila nas costas e deixo o meu apartamento. 

Meus pensamentos estão conturbados, não consigo pensar em mais nada que não seja aquele discurso de Ella no grupo de apoio, a sensação ruim ainda lateja dentro de mim. Me desligo de tudo. Faço o check-in usando o piloto automático, embarco com o mesmo em ação. Até a comissária de bordo me oferece drinks e comida, mas escuto apenas depois de muita insistência e mesmo assim recuso. Nem lembro quando me alimentei pela última vez. Não sinto fome e vontade para nada, apenas me foco no meu objetivo. 

Planejo mentalmente o que faria quando estivesse frente a frente com aquela gente. Provavelmente estaria me segurando para não cometer nenhuma loucura, ou freando minha língua para que não pudesse falar demais. Queria conhecer o ambiente, especular, para só depois agir. Temo por não ter ideia do que sentirei, provavelmente nojo, pois raiva eu já estava sentindo. Talvez desespero, nada que me fizesse voltar de novo à Califórnia.

Algumas horas de viagem e continuo na mesma posição, mão no queixo pensativo, sem pregar o olho para nada. Me torno um robô, sem atender aos comandos do meu corpo, aliás, nem sei se sinto o meu corpo. Quando chego em fim um táxi está prestes a me levar ao Four Seasons. Um hotel luxuoso, que o hall mais parecia um palacete. As recepcionistas são simpáticas, o bagageiro também, mas não escuto nenhuma palavra do que falam. E nem é porque falam uma língua diferente, estão arranhando bem o inglês, só para me atender. A culpa é da minha audição preguiçosa, ou os meus sentidos que se desligaram. 

Abro o apartamento e me sinto um bilionário importante. Um quarto enorme com vista para Torre Eiffel, móveis requintados, e uma cama digna de um rei. Na mesa há uma taça de champanhe mergulhada em um balde de gelo. Os pisos em porcelanato, dois degraus de escada que me leva ao quarto. A suíte era incrível, mas não me importo muito com a estética apesar de tê-la reparado. Era bem mais do que mereço. 

Jogo-me na cama, já começando a sentir o efeito do cansaço mental e físico. Exigi demais de mim, estou um trapo, um abalo profundo no peito. Pego no sono. 

Quando acordo no outro dia sou importunado por uma visita agradável, são enviados para mim um banquete de café da manhã. Estou faminto e veio bem a calhar. 

Eram frutas frescas, pães frescos e sucos cítricos. Me alimento do jeito que necessito repetindo umas dúzias de vezes, mal me lembrava a última vez que senti tanta fome assim. Era o meu corpo dizendo que passei tempo demais sem comer nada. 

Tomo um banho rápido assim que termino o meu café. Faço uma pesquisa no meu laptop e encontro o endereço do colégio interno de Ella. Chama-se École Interne Saint Marie. Nem o nome me remete a tranquilidade que é esperado. Acho que já estou dominado até demais por uma onda de indignação que não consigo encontrar paz nem mesmo em um nome que deveria trazer paz. 

Com o endereço em mãos parto para o meu próximo destino. 

Encaro aquele castelo medieval diante dos meus olhos assim que desço do táxi. Retiro os óculos escuros do rosto para poder ver melhor. O castelo era como a alma do lugar; frio, assombroso. A atmosfera ruim perpetua em cada tijolo posto, acho que mesmo que eu não fizesse ideia do que acontecia ali, ou acontece, — vai depender do que descobrirei —, ainda assim aquele arrepio frio irradiar-me-ia, mesmo com o sol ameno que fazia lá fora. 

—Merci. —Agradeço ao taxista lhe entregando alguns euros que Robson também disponibilizara para mim. 

—Pour rien. —Responde de volta e eu sigo o meu rumo sozinho.

Cada passo que dou é uma sensação de forca, de penitência. A raiva que antes estava amenizada, por uma noite quase desmaiada de sono, parece que ressuscita em forma da uma tempestade feroz. Estou tremendo, não de medo, mas sim de coragem, ansiedade e tormento. Meus pés caminham em passos lentos, meus olhos fixos à construção antiga. Imagens do que deva ter acontecido a pobre garotinha Ella, me enlouquece. Me agarro àquela fúria para enfrentar os meus inimigos em potenciais. 

Estou agora na entrada. Há algumas freiras do lado de fora, estou enlouquecido. Finalmente ficaria cara a cara com a mulher que fez da vida de Ella um inferno e estou ansiosíssimo para que isto realizasse de uma vez.








Capítulo 19




—Com licença! 

Chamo atenção de uma senhora logo na frente das grades enferrujadas, que eu podia jurar que se a movesse, faria um barulho medonho. Conversa com um moço de uniforme que julguei ser o jardineiro, apesar de não avistar jardins por ali. Não me acanhei em pronunciar a minha língua mãe, pois sei o quanto aquele colégio é mundialmente conhecido e que provavelmente falavam inglês, devido aos contratos de pais americanos ocorridos por vários anos. 

Ela me encara com desconfiança, mas minha cabeça continua erguida sem qualquer tipo de vacilo. 

—Gostaria de falar com a Madre Superiora. —A senhora perscruta seus olhos por todo o meu corpo analisando a minha aparência, sei que não estou devidamente vestido como gostariam; Terno, gravata, uma limusine a espera. Estou de calça jeans e uma camiseta. 

—Não recebemos nenhum visitante. —Ela faz menção de sair, mas eu a impeço.

—Não gostaria de dispensar um futuro acordo, certo? —Ela para de caminhar e volta-se a mim novamente. —Quero fazer a matrícula da minha filha. Tenho boas recomendações deste colégio. Coisas incríveis. —Rosno a última frase, Deus sabe o quanto aquela mentira doía na alma. 

Nunca que cometeria o pecado em colocar uma filha minha naquele abatedouro. Jamais feriria uma parte de mim, eu seria um monstro se fizesse. É assim que considero Robson, apesar de saber que não sabia de nada. Porém não o livra da culpa, há outros quesitos que lhe aponta, que não é tão inocente assim. 

Seu rosto retorce em uma simpatia que antes não encontrei, e seu sorriso amplo se abre em animação. 

—Por aqui, por favor. —Indica o caminho e eu agradeço com um maneio de cabeça. Minha entrada é mais fácil do que imaginei. 

O caminho a partir dos portões até  o vasto quintal de flores secas, e árvores mal podadas, é tranquilo. Mas assim que entramos ao castelo a coisa muda de figura. Um arrepio incomum me invade novamente, aquele lugar é sombrio até demais. Sinto uma angustia, como se estivesse enclausurado. Era escuro, somente velas e castiçais para iluminá-lo. Parece um tanto assombroso, como aquelas histórias macabras sobre espíritos perambulando em castelos antigos ou casas abandonadas. 

À minha esquerda uma menininha corre pelo corredor segurando uma boneca nas mãos. Consigo imaginar o que deva ocorrer a ela à exatas 22:00hrs da noite. Ela está sorrindo apesar de tudo, seus cabelos loiros esvoaçam enquanto corre. É apenas uma menina nos seus dez anos que só se preocupa em brincar e correr. Lembro-me das meninas na minha época, brincavam de corda, adoleta, esconde-esconde. Elas adoravam me encontrar embrenhado pelos arbustos, sabiam exatamente o meu lugar favorito. Penso que as mulheres são muito observadoras. Penteavam os cabelos uma das outras nas calçadas. Choravam quando se machucavam ao cair, e eram apenas cortes bobos que em dois tempos melhoravam, a não ser na hora de ir tomar banho que ardiam a beça. 

Uma vez sequei as lágrimas de uma coleguinha minha que se machucou, eu tinha uns seis anos. Vi em seus olhos o quanto estava doendo, aparentava doloroso. Sentei-me ao seu lado, sequei suas lágrimas e disse que tudo ficaria bem. Não medir esforço para ir até em casa e pedir para que minha mãe fizesse um dos seus remédios curandeiros, que usava em mim quando me machucava, para usar nela também. Queria que parasse de chorar, de sentir dor. Quando o sorriso voltou aos seus lábios, vi que fiz algo de bom a alguém. Mas o melhor foi ouvir de seus lábios que eu tinha razão e que o machucado parou mesmo de doer. 

Naquele momento sei o quanto a dor daquelas meninas não eram por uma queda boba, a dor era na alma, algo muito mais profundo e difícil de curar. Algumas carregariam para sempre as marcas em sua vida, assim como Ella. Outras superariam com muita terapia, mas em todos os traumas psicológicos perduraria por longos anos. Me sinto tonto, garganta seca, não há nada que pudesse fazer com que aquele nó descesse. Me sinto preso assim como sei que Ella se sentiu, ou aquela menina que corria a pouco pelo corredor. Minha vontade de desarticular toda essa trama, revive com força. 

—Está tudo bem, senhor... —Especula o meu sobrenome até que lhe digo.

—Jackson! Me chamo Michael Jackson. Estou bem, não é a mim que tem de se preocupar. —Ela assente desconfiada, mas volta a andar. 

Continuo a segui-la, mas minha mente está tão rodada que simplesmente paro de prestar atenção no ambiente, me desligo.  Volto a me ligar apenas, quando a porta da sala da Madre Superiora se abre e sou convidado a entrar.

—Este senhor deseja matricular a sua filha. —Ouço-a dizer para Madre, mas ainda não estou dentro da sala, Mas é só questão de tempo até conhecer a toca de vez. 

—Pode entrar. —Apareço pela sala, e encaro aquela mulher. 

É uma senhora gorda, uma verruga em seu nariz e seu sorriso  amarelo é grotesco. Lembro da descrição de Ella  e realmente é medonho. Parece que estou diante da impiedosa Madre Bianca. 

Sou convidado para  sentar, e a outra que havia me levado, nos deixa a sós. A Madre Superiora senta-se em sua cadeira atrás de uma mesa com vários papeis espalhados, sento-me em sua frente, encarando-a com asco, sem deixar com que perceba. 

—Deixe-me apresentar. —Começo a dizer. —Sou Michael Jackson, um empresário interessado em conhecer o colégio. Quero que minha filha tenha a melhor educação possível. Será que o colégio correspondem aos meus requerimentos? 

Seu sorriso amarelo abre de novo, sinto nojo, não pela sua aparência, mas por sua essência. Quero confrontá-la, mas sei que ainda não é hora. 

—Mas é claro, senhor Jackson. Temos a melhor educação em questão internato na França. Somos conservadores, um grupo afim de instruir suas filhas para o mundo. Mas não somente educação profissional, moldamos o caráter também. —Levanto uma sobrancelha a encarando. 

Oh santo colégio interno! Capaz de moldar caráteres. Ferrar com os sentimentos de meninas inocentes, como se fosse lixo. Slogan mentiroso que causa-me asco.

—Certo, Madre Bianca. É como se chama, não é? —Uma maneio de cabeça ensaiado aparece, e minha ira aumenta. 

—Ótimo. 

Começamos uma conversa muito profissional. Devo ressaltar que Madre Bianca é muito bem polida e sabe convencer. É mostrado a mim um mapa da carga horária das alunas, seus horários escolares, atividades extras curriculares que aparecem. Aulas de piano, de violão ou qualquer coisa que uma aluna escolher. Tudo detalhado e bem explicado. Aulas de línguas e natação. Há horário para tudo; acordar, dormir e se alimentar. Aparentemente uma ótima educação, com aulas religiosas e históricas. Qualquer pai que desconheça o caso com certeza não pensaria duas vezes para matricular sua filha. Era este fato que me deixava cada vez mais inquieto em desmascarar aquele lugar. Não quero que mais ninguém como Ella sofresse de novo. 

—Venha conhecer nossas instalações, Senhor Jackson. —Assinto me prontificando. —Tenho certeza que não irá pensar duas vezes, antes de trazer sua filha para nossos cuidados. —Uma não, mas um milhão de vezes e mesmo assim minha decisão seria única. Não, não e não. 

Conhecer aquele lugar seria intoxicante, porém estou bem preparado. Conheço as salas de aula, não havia aula naquele momento, está tudo vazio. Madre Bianca alega que hoje é dia de folga. Mas mesmo assim posso ver algumas meninas brincando por ali, todas usando seus uniformes: saias rodadas até os joelhos, terninhos e gravatas, chapeuzinho na cabeça. As meias até o joelho e sapatos antigos na mesma cor do resto do uniforme, azul. 

Não parecem sofrer, muito pelo contrário, mas também percebo quando encaram a figura da Madre, desfazem o sorriso e se encolhem como um bichinho. Consigo saber o que sentem, posso imaginar. 

Eu precisava conhecer o ambiente para saber como Ella viveu naquele lugar, consigo entendê-la apesar de não presenciar nada demais até agora. Mas como disse antes, aquele clima assombroso perdura mesmo não havendo nada demais até onde meus olhos alcançaram. 

—Está satisfeito, senhor? —Ela me arranca do devaneio. 

—Na verdade, queria fazer algumas perguntas. —Ela assente esperando que eu fale. —As internas, elas têm horário para tudo, pelo que vi no panfleto que me mostrou. Horário para acordar, fazer suas refeições, brincar e dormir. O que fazem durante à noite? Quero dizer, após o toque de recolher? E se não quiserem dormir? —Fica pensativa por um instante, mas não demora muito a me responder. 

—Ao toque de recolher todas  vão para os seus dormitórios, sem exceção. Se não quiserem dormir, em cada dormitório tem uma pequena TV, podem ver televisão. Podem transitar pelos corredores, podem fazer o que quiserem. A regra é mais para manter o controle. —A analiso bem. Aquele discurso parece um dos bem mentirosos. Madre Bianca é uma tirana, duvido muito que deixam as meninas fazerem o que quiserem. 

—Hum... entendo. —Olho ao redor, tenho a necessidade de perguntar mais. —Estão brincando agora, a senhora disse que estão de folga. Qual é o motivo sendo que  é um dia normal de terça-feira? —Ela sorri com a minha pergunta. 

—Ora, senhor. Até umas meninas que estudam em um dos colégios mais bem preparado do mundo, têm a necessidade de tirar alguma folga, não acha? —Não sei, aquela justificativa não me convence. Há mais algo por trás disto. Ainda mais vindo daquela mulher. 

—Ganharam algum prêmio? Uma gincana? Quem marcar mais pontos ficam sem aulas, em plena terça-feira sem feriados? —O olhar que me lança, me mostra o quanto a minha pergunta a desagrada. Parece que toco na caixa de maribondos, e todas eles estão prontos para me ferroar. Levanto uma sobrancelha esperando que me responda. 

—São ótimas alunas, disciplinadas. Acho que merecem um dia de folga. —Esta séria ao dizer, me encara profundamente como quem está desconfiada de algo. Não me abalo. 

Talvez as maltratou demais no dia anterior, e a maioria não conseguem nem levantar das camas. Só de imaginar meu peito retumba em angustia. Ou simplesmente não quis dar-se ao trabalho de ensinar hoje, dando a si própria uma folga.

—Sendo assim. —Abro um sorriso largo que só servia como uma ironia plausível. —Ah, só mais uma coisa. —Aponto o dedo para ela querendo fazer o último pedido. —Gostaria de conversar com uma das meninas, pra saber como se adaptam ao colégio, e coisas do tipo.

—Homens devem se manterem afastados das meninas, é regra do lugar. Eu sinto muito. —Sua expressão é repugnante, está mentindo, não quer que eu me aproxime das meninas por medo de descobrir algo. Das meninas a delatarem. 

—Entendo, porém não concordo. Se minha filha virá para o colégio preciso colher o máximo de informações possíveis, não acha? —Ela cruza os braços diante do pergunta. Encara-me de olhos semicerrados. Está mais que desconfiada. 

—Está preocupado com a vida que as internas levam por aqui? Isso é uma investigação, senhor Jackson? Pois bem, acho que está tentando me enganar com essa de matricular a filha. Trajes de um pai que tenha condições para pagar um colégio como este o senhor não tem. Por acaso é da polícia? —Sorrio com ironia, levanto a cabeça até para poder sorrir mais. Dá para se notar daqui o medo das suas desconfianças. 

—Eu lhe faço a mesma pergunta, Madre Bianca. Há algo que tenha a esconder? —De início percebo um choque em sua expressão, mas logo sua gargalhada medonha aparece, algo repugnante que tenho vontade de esgana-la. Quero que pare de rir daquela forma, mas o deboche fica cada vez pior a cada minuto que se passa.  

Quando percebe minha expressão nada boa, finalmente para de rir. 

—Não há nada a se esconder. —Levanta uma sobrancelha em afronta. —Anda, vamos. Iremos fazer a sua ficha. 


—Não. Há outros lugares que preciso ver. —Aquela sala que Ella descreveu. —Aquela sala ali foi a única que não me mostrou. Por quê? —A questiono mais uma vez, vejo seu semblante mudar. Parece que encontrei a sala. 

Havia uma sala solitária no meio do castelo, como não fora me apresentado, logo desconfio. Desconfio ainda mais quando Madre Bianca tenta me afastar de lá.

—Aquela é uma área restrita, senhor. Não há nada para se ver lá. —Coloco um sorriso sarcástico no rosto.

—Se minha filha virá preciso conhecer tudo! 

—Já conheceu o suficiente. —Sou desafiado e não gosto nada disto.

—Vejo que está escondendo sim algo de mim.

—Claro que não. —Ela muda de cor também. —Só não é conveniente um homem entrar. Se trata de algo imaculado para as nossas internas, nada demais. Algo que homem nenhum poderá ter contato. Será que não deixei  claro, para o senhor? Há regras senhor Jackson, que se serem  compridas poderá ser muito mal. —Não paro de encará-la, nem por um só segundo. Tento buscar uma mensagem subliminar. Talvez até tenha, mas não a encontro.

—Parece que gosta muito de regras. E as senhoras? Há regras para as freiras? Limites, um momento em que param, de vez em quando, as suas atividades costumeiras. Moderação, ou até mesmo refreamento? —Agora sou eu que a desafio. Sua cor está tão pálida que penso que irá cair. 

—Acho melhor o senhor ir embora. Daqui a pouco terei uma reunião, estou um pouco atrasada. —Assinto muito satisfeito. 

—Entendo e respeito. —A encaro sem vacilo. 

Não insisto, apesar que por enquanto não é a minha intensão contestar nada. Não quero estragar tudo de cara, apesar de ter a língua coçando para falar mais do que disse. 

***

Depois de muito debate, volto ao hotel. Não sei qual será o meu próximo passo, muito menos o que farei para desmascarar aquele colégio fajuto onde se tornou ponte para destruir as vidas de meninas inocentes. Estou com os neurônios pipocando, acho que não fiz um planejamento, apenas fui motivado pelo impulso. 

Meu celular toca em cima da cama, olho no visor quem está ligando. A foto da Ella está lá, suspiro fundo e atendo. 

—Oi, princesa. Como vai? 

—Não acredito que está aí, depois de tudo que conversamos. Michael você tem ideia do risco que está passando? Por que você está fazendo isto? —Ella está nervosa, muito. Chorando até, posso ouvir os soluços.

Sou tomado por uma incompetência terrível e me odeio. Ella está me cobrando desistência ao qual  não faz parte de mim, de quem sou.

—Desculpa se sou incapaz de cruzar os braços enquanto as coisas ocorrem ao meu redor. Não posso deixar por isso mesmo. Eu estive lá, Ella. Aquelas meninas. —Dou uma pausa. —Elas passam pelo mesmo que você, e tem que acabar. 

Ouço o seu choro ao fundo, meu peito se comprime, estou angustiado. 

—Você é especial, Michael e eu te amo por isso. Mas têm coisas que você simplesmente não pode mudar.

—Mas posso tentar e vou, Ella. Você pode ter certeza. —Ouço o seu suspiro e faço o mesmo. —Não quero brigar com você por telefone, depois a gente conversa. 

—Então deixa que eu faça isso com você, ao seu lado. 

—Não! Está protegida em casa, é melhor você ficar bem longe.

—Eu conheço a história, sou a testemunha, a vítima. Posso ajudar tanto quanto você. —Sim, ela testemunha, pode informar coisas valiosas para a polícia. 

Claro! Meu próximo passo seria informar a uma delegacia. E convencê-los a isso, só uma denuncia da própria vítima. 

—Você está mesmo a fim de fazer? 

—Sim, estou. Tive medo por muito tempo, não quero mais temer. Eles precisam acabar com isso sim, e eu também farei o que for preciso. —Abro um sorriso enorme no rosto. Sinto orgulho da minha menina, seu poder de superação é impressionante.

—Estou orgulhoso, Ella. De verdade, adoraria que viesse. 

—Então venha me buscar no aeroporto. Já estou aqui a sua espera. —Me levanto de uma vez da cama, sem acreditar no que os meus ouvidos ouvem, tomo um susto.

—Aqui? Na França. —Ela sorri. 

—Sim. Venha logo me buscar. —Começo a sorrir bobo sentindo meu coração acelerar. 

Estou morrendo de saudades de Ella, tê-la ao meu lado me encoraja para fazer o que vim fazer, mas também vem o receio de mexer naquela ferida. Não quero pensar nisto, só preciso abraçá-la. 

Desço feliz pelo elevador, estou ansioso em revê-la e olha que estou na França apenas dois dias. Encontro um dos funcionários do hotel, o mesmo que me levou até o quarto, recepcionando-me com honras e regalias. 

—Deseja alguma coisa senhor? —Ele retira o seu cape em forma de reverência. É assim que as pessoas tratam hóspedes que acham que estão podres do dinheiro. Não sou podre de dinheiro, mas estou pelo nome de quem tem. 

Ser genro de Robson abre as portas e eu compreendo isto, porém é uma importância tão pequena diante de tudo que estou vivendo que nem me lembro que posso pedir qualquer coisa. Mas aquele pedido refrescou a minha memória. 

—Preciso de um carro. Qualquer modelo, só preciso estar no aeroporto em dez minutos. 

—Sim senhor. —Bate as duas mãos juntas ao corpo em cumprimento de ordem, e sai para atender o meu pedido. 

Em uma velocidade recorde, recebo na porta do hotel uma Mercedes-AMG GT luxuosíssima que meu queixo cai. Não tenho muito tempo para admirações, preciso ir ao encontro de Ella, não quero que espere muito. 

Estaciono o carro na vaga e corro até o portão de desembarque, onde Ella disse que estaria. 

Lá estava ela, de vestidinho lilás, sapatilhas pretas, como uma princesa. Meu coração se enche de amor, tenho vontade de beijá-la. 

—Ella! —Grito o seu nome, e isso faz com que ela se vira para me olhar. Corro o mais rápido que posso e a ergo em meus braços beijando a sua boca. 

Suas pernas prendem envolta da minha cintura, seguro a parte traseira da seu vestido para não levantar. 

Ela está afoita, me beija com desespero, posso notar que está perturbada, talvez por eu ter sido capaz de chegar até aqui em busca de justiça. Consigo entendê-la, compreendo essa vontade de me afastar de tudo isso, mas estou envolvido demais para esquecer. 

—Você é louco sabia? —Seus olhos estavam marejados. Suas mãos acarinhavam o meu rosto. Pode ter uma noção de quão louco eu deva ser.

—Sou louco por você, talvez este seja o meu calvário. —Minha frase divertida a faz sorrir. —Vamos embora. —Ela assente. 

Quando chegamos no apartamento Ella fica em silêncio, pensativa. Analisa cada canto do apartamento, percorrendo as mãos pelos móveis à medida que ia andando bem devagar. Sei o quanto está difícil para ela estar naquele lugar, às vezes me sinto um pouco culpado, mas é inevitável para mim.

—Seu pai sabe que você veio ficar comigo? —Ela afirma com a cabeça.

—Disse que iria conhecer a sua família, uma forma de tornar tudo oficial. —Assinto.

—Acha que ele acreditou? —Ergue os ombros.

—Talvez. —Ella para de andar e me encara, meu coração se aperta. —Você já foi até lá? —Suspiro sentindo o clima ruim aquela conversa. 

Seguro em sua mão quando me aproximo a levando para o quarto, sento-me na cama e coloco-a sentada no meu colo. 

—Sim. —Queria contar somente coisas boas a ela, mas não há coisas boas a se contar. Ella conhece aquele lugar e todas as impressões ruins que tive ela sentiu na pele. Abaixo a cabeça reunindo forças para ser o mais sincero possível. —Foi horrível, Ella.

—Madre Bianca foi rude com você? 

—Não, não. Ela na verdade nem desconfia do que fui fazer lá, é só...Talvez desconfiasse fiz muitas perguntas a ela ao qual a deixou intrigada, pude perceber. Mas nem é por isso, é  o ambiente sabe? Eu jamais poderia ter olhado aquele lugar com outros olhos. Imaginar o que aquelas meninas passam. Todas umas crianças, deveriam estar felizes ao invés de passar por tudo aquilo. Enxerguei em cada uma o seu olhar, era o mesmo de quando nos conhecemos e agora entendo. —Olho para ela, seguro firme em sua mão. —Isso não pode mais continuar. —Ella balança a cabeça concordando com o que falo.

—Para mim seria muito mais fácil deixar toda essa história de lado e seguir a diante. Talvez esquecer que um dia estive ali, esquecer tudo que passei. Estou bem no final das contas. Tenho um namorado incrível que me ajuda e muito, que entende tudo que passei e não me julga. Estava no meu conforto perfeito. Contudo sei que seria egoísmo demais deixar pra lá enquanto tem outras passando por tudo que passei. 

Concordo, foi exatamente o que pensei quando vi aquelas meninas naquele lugar. Não poderia continuar em hipótese alguma.

—Vai dar tudo certo, meu amor. Você vai ver. Estive do seu lado e vou estar até o momento que  tudo finalmente acabar. 

Seus olhos cobertos por uma emoção impar me encaram. Suas mãozinhas miúdas seguram o meu rosto. Bem devagar acaricia seu rosto no meu. Não consigo evitar, beijo sua testa, dou carinho em sua pele. Ella se ajeita em meu corpo, sentando-se com a perna aberta de frente para mim. Sinto uma necessidade em tocá-la incrível, e sei que ela também quer. Que precisa de mim. 

Seu corpo impulsiona o meu para se deitar. Ela levanta a minha camisa, beijando a minha pele. Todo os meus músculos são agraciados pelo seu carinho, pelo doce toque de sua boca. Estou tão necessitado por ela que gemo um pouco. 

Minha princesa retira seu vestido revelando-me seu corpo nu. Tão delicada que parece mais uma flor frágil, porém perfeita e com um perfume inigualável. Circundo sua cintura com o meu abraço, a deitando sobre o meu corpo. Quando terminamos de nos despir, sou eu quem deito por cima de seu corpo e a adentrando com fulgor, mas delicadamente. Os gemidos roucos de Ella preenche o quarto. Me abraça colocando mais o nossos corpos. Fazemos amor com toda a paciência do mundo. Nos amando com carinho. Queria dizer a ela o quanto a amo, estando dentro de seu corpo. Queria lhe transmitir coragem e afeto. Às vezes sexo serve para isto também, para fazer com que quem amamos se sinta amado. E eu a amo, sem dúvidas nenhuma, sem receio e sem falsidade. Éramos feitos um para o outro o casal perfeito, almas gêmea, ou qualquer coisa que quiser denominar. Estou onde quero estar e nada me faria recuar. 










Capítulo 20 —Ella Robson





Estou de pé primeiro que Michael naquela manhã, estou pronta para cumprir com o meu propósito. Não sinto mais medo, muito pelo contrário, estou pronta para a guerra e pretendo sair vitoriosa. Estar naquele lugar de novo, causou-me angustia, mas sei que é por apenas alguns instantes, o gosto da vitória seria muito melhor depois. 

Michael acorda, tomamos café da manhã juntos e partimos para a delegacia assim como combinamos. Já cheguei até aqui, iria até o final, contando tudo que sei, expondo-me se fosse necessário. 

A delegacia modesta aos redores da França é como uma condenação sem julgamento para mim, aquela atmosfera fria arrepia a minha pele. Talvez por ter sido obrigada a ficar encarcerada por muito tempo, quando me deparo com algo parecido é como se o trauma revigorasse. 

Michael faz a honras em nos apresentar para o delegado, e eu abro um sorriso sem graça para ele. Não estou afim de sorrir, apenas fazer o que devo.
Sentamos nas cadeiras em frente ao delegado que usa um terno. Sustenta um bigode em seu rosto magro. Sua estatura baixa não me transmite nenhum pingo de confiança.

Leio seu nome rapidamente na plaquinha em sua mesa. Delegado Preston, está escrito.

—Temos uma denuncia muito grave a fazer, senhor delegado. —Michael começa a dizer e meu coração treme. 

—Sou todo ouvidos. —Michael olha para mim e eu para ele. Dou graças a Deus que o homem fala nossa língua, assim Michael conversaria com ele invés de mim. 

—O colégio École Interne Saint Marie, pratica ações repugnantes dentro daquelas portas que ferem a integridade das alunas. —Os olhos do delegado se esbugalham, um pouco ofendido eu diria. -Isto tem que acabar!

—Deve ter algum engano aqui, meu caro. Este colégio é um dos melhores, um dos mais respeitados de nossa cidade. —Eu sabia que não seria fácil, disse a Michael. 

—Entendo que possa parecer um mal entendido, mas não é o que as meninas que vivem ali pensam. São submetidos a elas todos os tipos de torturas, maus-tratos e humilhações. Sem contar com os abusos frequentes. 

—Não é possível! —O delegado indignado se levanta. Está bastante inquieto e muito, muito perturbado, como se o afetasse diretamente as acusações de Michael. —Minha filha estudou lá, assim como uma gerações de meninas que convivemos diariamente. É possível ter algum tipo de irregularidade sem que não soubéssemos antes. 

—Sinto muito, senhor. As praticas repugnantes ocorridas naquele castelo foi muito bem guardadas, escondidas com muito cuidado para que ninguém soubesse. Infelizmente apenas as meninas podem confirmar, porém têm medo das represálias, ou vergonha. 

—Os senhores têm algum tipo de prova? —Ele encara Michael com um desafio contido, começo a me revoltar com a situação. Depois me encara com desdém. Ele tira suas próprias conclusões, sabe que não temos provas o suficiente. —Sendo assim, fica difícil abrir algum tipo de queixa contra o colégio mais bem preparado do estado. 

—Tem razão, doutor, não temos provas. Mas há um fato nisto tudo, acontecem coisas terríveis àquelas meninas, e se o senhor não fizer nada, estará compactuando com cada atrocidade, cada humilhação e cada agressão moral que aquelas freiras comentem! —Michael está irritadíssimo e não é para menos. Porém percebo que meu namorado não quer me expor, em nenhum momento disse que sou uma das meninas humilhadas, porém se esta for a única forma de fazê-lo acreditar.

—Não temos provas, mas sou uma testemunha. —Levanto-me impostando a voz, pela primeira vez meu medo some, sou encorajada pela vontade de justiça. —Aquele colégio é bem visto por todos desta cidade, como desconfiar de senhoras temente a Deus? Mas o que o senhor e nem ninguém sabem é que fui estuprada, molestada em um ritual pagão que tenho certeza que não tem nada a ver com Deus. Minha alma foi dizimada, senhor delegado, por anos. Sem ter direito a misericórdia. Não temos provas, mas eu sei bem o que sofri lá dentro. 

As lágrimas já escorriam pelos meus olhos sem que eu me desse conta. Michael segura a minha mão sem vacilar. Eu só queria que acabasse de vez. 

—Só cheque, doutor. —Pediu Michael. —Os rituais são a partir das 22:00hrs da noite. O senhor tem a chance de saber o que rola durante este período. Só peço que não feche os olhos para que essas meninas continuem sofrendo. Sua filha pode ter sido uma destas e fechar os olhos será como permanecer maltratando-a constantemente. Pense nisso. 

O delegado ficou mexido, desconfiado também, mas pelo jeito não daria o braço a torcer. Ou levaríamos as provas, ou ele não levaria em consideração. Posso entendê-lo, ainda mais sabendo que sua filha estudou naquele lugar, ele não quer acreditar. Fico pensando como aquelas malditas conseguiram esconder muito bem suas atrocidades, vejo que não sou a única a ter medo de denuncia-las, a vergonha era bem maior, mas hoje não. Não iria me calar. 

—Deixe-me passar! Tenho o que me pediu, agora ele terá que me receber. —Aquela voz vinda da entrada da delegacia me deixa em alerta. Eu conheço aquela voz. 

Não é possível!

Levanto-me da cadeira só esperando a hora que a pessoa entrasse. Lá está ela, ainda lindíssima, com seus cabelos louros soltos e sua bravura de sempre, pisando duro e fazendo reclamações. 

—Karoline?! —Ela paralisa ao me ver, fica admirada.

—Ella? É você mesmo! —Fica embasbacada, assim como estou ao vê-la. —Oh meu Deus, quanto tempo! —Corro até ela e envolvo em um abraço fortíssimo, repleto de saudade e emoção. 

Me encho de alegria, finalmente Karoline e eu estávamos de novo juntas. Minha amiga de confinamento, minha parceira da dor. Nunca irei me esquecer de tudo que fez por mim. 

Uma vez estava prestes a levar um castigo daqueles, mas desta vez não era com o chicote e nem a sala do terror. Eu ficaria trancada em um quarto escuro repleto de ratos — morro de medo de ratos. Eles me causam fobia, se cumprisse aquele castigo com certeza morreria de ataque cardíaco. Karoline foi no meu lugar, assumiu a culpa de ter derramado grãos de comida no carpete. Me senti mal por ela ter ido invés de mim, mas nunca contestou. Fez para o meu bem e disse que faria de novo se fosse necessário. Nunca vou me esquecer às tantas vezes que salvou a minha vida. 

—O que está fazendo aqui? —Pergunto curiosa. 

Michael levanta-se, pondo-se ao meu lado, também está curioso em saber quem Karoline é. 

—Estou aqui para fazer justiça, Ella. Anos e anos reuni provas contra aquele lugar, finalmente tenho a chance de fazer algo que valha a pena. 

—E conseguiu? —Michael pergunta todo curioso, está mais ansioso em fazer aquilo dar certo, mais que eu. 

—Que cabeça a minha, não os apresentei. Karoline este o Michael, o meu namorado. —Karoline sorri para ele e depois para mim. Sei o quanto ficou feliz por mim ao saber. —Esta Karoline a amiga de quem lhe falei. 

—Muito prazer. —Apertaram-se as mãos. 

Michael está mais ansioso em saber o que Karoline carrega nas mãos do que de fato conhecê-la, mas eu sabia que não era má educação. 

—Sim, Michael, eu consegui. Provas das quais terão que fechar aquele lugar de uma vez por todas. Jogar aquelas desgraçadas no fundo de uma delegacia e deixá-las apodrecerem. —Ela se vira para o delegado, que está apreensivo ainda sentado em sua mesa. —Desta vez o delegado vai ter que intervir. 

Percebo que minha amiga também tentou alertar a justiça, mas o delegado não a escutou como fez conosco. Pelo visto Karoline continua com aquele instinto selvagem capaz de qualquer coisa para conseguir o que deseja. Adoro este lado dela, corajosa e destemida. 

—E o que você tem? —Pergunto apreensiva.

—Descobri coisas horríveis, Ella. Aquelas freiras não são freiras. —Olho em choque para Michael e também tinha a mesma expressão. 

—Eu sabia. —Resmungou ele irritado. 

—Não, mas aí é que tá. Elas são sacerdotisas de uma divindade pagã. Adoram uma deusa, que necessita da inocência de meninas em um ritual satânico, em troca de riquezas e qualquer pedido que desejar. Acharam que um colégio que permite a entrada somente de meninas abririam as portas necessárias de que precisariam. Foi a oportunidade perfeita.

—Claro, ninguém iriam desconfiar de senhoras religiosas, cujo o objetivo é educar e instruir garotas ricas. —Michael bufa irritado. 

—Já que tem as provas, senhorita. Mostre-as para mim. —O delegado incrédulo chama a atenção de Karoline que abre um sorriso desafiador. 

—Pois confira, doutor. E eu espero e muito que vá até aquele lugar e prenda cada uma daquelas víboras. 

Karoline joga a pasta que carrega nas mãos na mesa, o delegado a abre com cautela. Michael e eu não tiramos os olhos do objeto. São papeis, fotografias, flagrantes, tudo daquela sala, e do que acontecia lá dentro. 

Temo aparecer alguma fotografia minha em condições humilhantes, por este motivo não encaro muito os objetos. Sinto meu peito pular em agonia.

—O que é isso? —O delegado levanta nas mãos um CD.

—São gravações que consegui, onde contém as cenas asquerosa dos rituais, algo que sucedia comigo, com a Ella e com todas nós que perdemos nossa inocência por culpa de sacerdotisas satânicas, afim de enriquecerem as custas da nossa alma e do nosso sossego. Confira! É um pouco pesado, mas vai valer a pena. 

O delegado estava trêmulo, sua cor muito pálida. Posso imaginar o desespero que ele está passando. Talvez depois daquelas revelações nada seria a mesma em sua vida e nem na vida de mais ninguém. 

Não pude ver o vídeo quando ele o inseriu no computador, pois estou em uma posição oposta do computador que impossibilita a minha visão. Porém os gritos das meninas ecoam. As reações dele foram a pior possível. Michael permanece segurando na minha mão com força. Vi que também está abalado com tudo que ouve. Michael é sensível demais à dor das pessoas. Ele detesta vê-las sofrer. 

Nunca vi um homem feito, como o delegado, começar a chorar. Lembro de sua filha, provavelmente é nela em que está se lembrando também. Sua expressão é de perplexidade. Sinto sua dor, seu desespero. Madre Bianca destruiu nossas vidas, mas não somente as nossas, meninas sofredores dentro das paredes sombrias daquele palácio. Destruiu as vidas dos pais e das mães que permitiram os filhos frequentarem aquele lugar. Será como meu pai se sentiria quando soubesse? Aquele homem de bom humor, completamente seguro de si, que acha que tudo está sobre o seu controle? Não quero nem saber. Ainda não, ou eu me desesperaria de vez, e não é o meu objetivo. Quero ser forte e seguir em frente. 

—E então delegado? As provas são o suficiente? —As sobrancelhas de Michael se levantaram em desafio, o delegado cambaleia quando se senta na cadeira. 

—Quantas horas disse que procedem esses atos? 

—Às 22:00hrs todos os dias. —Respondeu Karoline. 

—Mandarei uma viatura para lá amanhã mesmo, neste horário. 

A vitória em nossos rostos foi a melhor. Nunca me senti tão bem quanto naquele momento. Olho para Michael e o abraço, Karoline está sorrindo.
***




Era como se uma brisa refrescasse a minha alma. Parece um sonho estar a dois passos da liberdade total. Karoline foi uma benção na minha vida neste momento. A sua força era admirável, queria ter tido esta força logo de início, mas nem sempre agimos como gostaríamos. É tudo tão mais complicado que isto. 

Michael me deixa conversar a sós com Karoline, disse que precisávamos matar a saudade. Concordei com ele. Michael está sendo tão bom para mim que reafirmo minha intuição de que é um anjo caído na terra para mim, ou senão, algo bem parecido com isto. Meu namorado tem sido para mim tudo que eu preciso e sou grata a Deus por ele. 

—Ele é um gato. —Comenta Karoline com aquela cara de sem vergonha como ela sempre costuma fazer. 

Começo a rir igual uma boba, toda envergonhada, mas muito, muito orgulhosa. 

—Ele é especial, a melhor pessoa que pude encontrar na minha vida. —Sentamos em um banco bem próximo a área de lazer do hotel em que Michael e eu nos hospedamos, o clima está tão bom que me dá paz. —Foi como você disse que seria. Michael é o meu Rhett. —Ela bate palmas empolgadas, algumas lágrimas rolam do meu rosto. 

—Você merece, Ella. Não poderia ter sido diferente, tudo que nós sofremos naquele lugar, havia de ter uma recompensa.

Concordo com ela, acho que tem razão, Michael é a minha recompensa. Eu já sabia, mas agora vejo que a confirmação está bem aí diante de mim. Eu não teria chegado até onde cheguei se não fosse por ele. 

—Tão empenhado em me ajudar. A força que ele me transmitiu durante esse tempo todo. Ele me salvou, Karoline. E eu sou a mulher mais feliz desse mundo. Primeiro foi papai quem o colocou na minha vida. —Ri ao lembrar tudo que Senhor Robert Robson fez. —Fiquei com tanta raiva, mas agora vejo que estava certo. 

—Sério que o seu pai apoiou? Senhor Robson parecia tão bravo e fechado. —Começo a gargalhar. 

—Você não conhece o meu pai, ele é o oposto. Todo cheio de irreverência, age sem pensar. Suas atitudes podem ser invasiva e cruel, mas ele faz porque sabe que é o melhor. Aquele homem tem uma sabedoria admirável. Tudo que ele fez para chegar onde chegou. Sei que senti ódio dele por vários anos, mas hoje... hoje eu sei que faria qualquer coisa por mim. Prova disso, foi colocar Michael na minha vida. 

—Ele sabe o que houve no internato? —Abaixo a cabeça, me sentindo péssima, depois nego. 

—Nem sei como reagiria se soubesse. Tenho certeza que o destruiria, se sentiria ainda mais culpado do que sei que ele se sente. Papai pode ser um desalmado às vezes, por não saber demonstrar o que sente, mas eu sei que ele me ama. 

—Sua volta pra casa foi cheia de surpresas, Ella. Conseguiu conhecer o seu pai, saber o que realmente sente por você e ainda conseguiu um grande amor. Talvez tudo que tenha passado conosco naquele lugar foi justamente para isso, para sabermos valorizar o que há de mais importante em nossas vidas. Ou apenas serviu para aliviar a dor. 

—Sabe? Me sinto forte, sinto algo que nunca havia sentido antes. Quando vivemos ali parecia que seria só aquilo e pronto, eu morreria nas mãos daquelas mulheres e meu pai nem saberia o que aconteceu comigo. Voltei pra casa e tudo não parecia fazer sentido, estava perdida. Então as coisas começaram a se encaixar, comecei a ter forças nos braços do único homem que já amei. Acho que se eu não viesse com aquela carga do que passei, eu jamais teria aberto os meus olhos para toda aquela felicidade que senti, eu jamais teria sentindo a intensidade, a emoção que foi. Não seria a mesma coisa, eu não enxergaria o quanto sou amada de verdade. 

—A dor se consiste disso. Só ela é capaz de nos dar o que precisamos. Enxergar e valorizar todas as coisas boas que veem em nossas vidas. 

Abro um sorriso iluminado para Karoline. É muito bom ter a minha amiga ao meu lado. Conversamos por muitas horas naquela noite. Ela disse que trabalha com algumas vítimas do internato, virou uma espécie de psicóloga voluntária. Aquelas meninas só confiavam nela para se abrirem um pouco, justamente porque havia passado pelo mesmo abuso. Karoline também alcançou a sua rendição, sem o sofrimento ela jamais poderia fazer algo que sempre gostou. Ajudar as pessoas. Acho que cada uma de nós lidamos com a dor de uma forma positiva. No começo eu não, mas aos poucos tudo ficou melhor. Não uso mais drogas e nenhum outro tipo de artifício para mascarar as minhas dores, assim como Michael disse uma vez. Acho que minha droga se tornou ele mesmo, ou simplesmente a vontade de viver cada vez melhor. 

Ele está tomando banho na banheira quando chego no quarto. Lindo como sempre, completamente nu espalhado na banheira. Não pensei duas vezes antes de me despir e me juntar a ele. Seus braços me envolvem com carinho, sinto seus lábios beijarem o meu pescoço, é tão bom! Viro a minha cabeça para beijar sua boca, sua língua macia se embola na minha. Adoro o gosto dela, adoro a forma como me envolve ao me beijar. Michael desperta em mim os melhores sentimentos. 

Seus braços cobriram o meu corpo inteiro por trás, ouvi seu gemidinho quando beijou a minha bochecha depois do beijo. 

—Como foi com a sua amiga? 

—Maravilhoso! Ela é muito especial. Me fez entender o quão eu estava sendo egoísta, me trancando em meu mundinho enquanto outras pessoas sofriam. 

—Não, não é bem assim, Ella. Você estava machucada, ninguém espera que uma pessoa neste estado vai e dá uma de herói, quando não consegue lidar com a própria dor. Você não é egoísta, muito pelo contrário. — Seus dedos tocaram o meu queixo de uma forma carinhosa.

—É incrível como você só ver o lado bom de mim. 

—É porque só há lado bom em você. —Sorrio boba, tenho o prazer de contemplar aqueles dentes brinquinhos de Michael se abrirem quando sorriu também. —Como se sente para amanhã? —Suspiro. 

—Um pouco apreensiva, porém confiante. Sei que tudo vai mudar e para melhor. —Ele suga o meu pescoço abraçando-me mas forte por trás. Seu gemidinho está lá de novo.

—Estou orgulhoso de você, muito mesmo. 

—Eu te amo, Michael. 

—Eu também te amo, Ella. 












Capítulo 21





Ella aperta com força a minha mão ao segurá-la. Toda a caminhada até aquele corredor era demais para ela, eu sabia e conhecia sua apreensão. Dava para se notar a tremedeira do seu corpo. Olhando em seus olhos enxerga-se o pânico ao regressar àquela fortaleza que tanto a perturbou por vários anos. Eu queria que não tivesse vindo, mas Ella insistiu dizendo que era a única forma de enfrentar a situação — olhar nos olhos daquela mulher e vê-la ir para a cadeia. 

Uma equipe de investigação está conosco, o delegado responsável, aquele que recusou a vir tem o mesmo semblante de Ella. Está morrendo de medo de ser verdade, de ter a certeza do que houve a sua filha naquele lugar. 

Não foi difícil entrar pelos portões, o segurança tentou nos impedir, mas diante de um mandato de busca foi impossível resistir mais. O delegado consegue um, apresentando as provas que Karoline lhe entregou. Acho que faltava pouco para desarticular toda aquela farsa sustentada pelas falsas freiras depois de anos. 

As luzes do corredor estão apagadas, é um completo breu, apenas os castiçais ilumina nosso caminhado escuro. Estamos indo em direção ao quarto da tortura, onde as meninas eram estupradas para praticas religiosas, pagãs, ou seja lá qual o nome. Só sei que o que acontecia a Ella, com certeza está acontecendo neste exato momento com outra menina. Me vi ansioso em chegar logo e acabar com aquilo. Finalmente acabar com o sofrimento desta pessoa, ao qual eu não sei quem é. 

—Vocês não podem estar aqui! Este local é proibido. —A mesma freira que me atendeu quando estive aqui, apareceu histérica diante de nós. Nem ao menos respeita a presença do delegado, queria que nos mantivéssemos o máximo de distância possível. 

—Somos da polícia. Recebemos uma denuncia e viemos averiguar. —O delegado mostrou o distintivo. O pânico na face dela, de quem foi pego no flagra era genuíno para mim. 

Seu olhar se voltou para Ella, a raiva tingiu seu rosto. Havia se lembrado dela. 

—Seja lá o que esta ninfeta tenha lhes dito, é tudo mentira! —Berrou avançando em Ella, me pus no meio das duas. 

—Não ouse a se aproximar dela! Nunca mais tocará um dedo em Ella, irmã. Nunca mais. —Nos encaramos com dois animais de briga.

—Se não tem o que temer, deixe-nos entrar naquela sala. —Aponta ele, para o que seria a sala que procurávamos. 

—Não há nada lá dentro, verdade. Somente bagunças e bobagens. 

—Sendo assim, não vejo problema algum em verificar. —O delegado dar dois passos em direção a sala, quando a freira fica toda nervosa, impedindo-o que se aproxime mais. 

—Deixe-os passar, irmã Magnólia. Eles já sabem de tudo. —A freia olha diretamente para Ella, um olhar ainda mais frio que antes. 

A muito custo os detetives se aproximam. A porta está fechada, mais tudo que ouvimos é o silêncio. Temo de terem cancelado as práticas, mas a freira estava nervosa demais para ser este o motivo do silêncio. Talvez os instrumentos usados poderia ser a razão pelo nervoso. Óbvio que coisas comprometedoras haviam lá dentro, porém torço muito que eu esteja errado. 

—Detetives! Detetives! —A irmã começa a berrar, em direção a porta, como se alertassem quem estivesse lá dentro. 

Delegado Preston não se intimida, aproxima-se da porta e a abre em um empurrão. Os outros policiais, mantém as armas a punho. 

A cena é chocante, perturbadora eu diria. Iria além do que eu havia imaginado pelos relatos de Ella. Uma cena que me depararia em um dos pesadelos que vivenciaria de agora em diante. A menina está esticada em cima de uma maca de aço, presa pelos pés e braços, completamente nua e exposta. Minha alma chora, meus pedaços se quebram. A cena me deprecia. Não consigo respirar. Meu coração acelera. O olhar daquela menina clama por socorros. Não há lágrimas em seus olhos, apenas um roxeado ao redor indicando que chorou até não sair mais nada. Seus cabelos longos e loiros estão amarrados. Percebo que há sangue na lateral de sua boca. Olho para sua barriga, marcas de flagelos estão por toda a parte. 

Não pude deixar de notar aquele ambiente. Velas para todo lado, imagens de santos, decoravam o lugar. Nada se compara algo divino e tranquilo, muito pelo contrário. É assombroso. Quando Ella disse que as imagens não a remetiam nada acolhedor, ela estava certa. Olho para a menina mais uma vez, há algo introduzido no meio de suas pernas, algo longo e grande, enfiado, forçado a está em um lugar que não deveria. Meu estômago embrulha, sinto uma agitação dentro das entranhas que é horrível. O detetive está em choque, tanto quanto eu, mas não permaneço olhando-o, preciso me virar rapidamente, tirar os meus olhos daquela imagem, ou vomitaria. Seguro na parede mais próxima a minha direita. Agacho forçando um vômito, mas ele não sai, está preso, golpeando o meu estômago. Ella corre até mim, abraçando-me por trás. As lágrimas quentes escorrem, estou desesperado. 

—A senhora está presa, Madre Bianca! —A voz do delegado está embargada, tenta segurar o choro, mas sei o quanto aquela cena o afeta intimamente. 

A velha bruxa cruel, o olha com escarnio. Está furiosa. 

—Eu. Não. Vou. A. Lugar. Algum! —Sua voz está horrenda, parecia possuída. Não ouso a pensar por quem. Seus olhos ganha um tom avermelhado, seus dentes estão ainda mais amarelos. —Eu preciso terminar o ritual, as deusas me darão tudo quando eu terminar. 

Está insana, fora de si. Olho para Ella, que aperta o meu bíceps com as unhas. 

—Irá terminar, oh sim, mas na cadeia! —Preston acena com a cabeça para os policiais tirarem a menina daquela situação. 

—Não, não, por favor! Não façam isso! —Madre Bianca se joga no chão quando a menina é solta das amarras. Um dos policiais tentam retirar o objeto de dentro dela, mas seu gemido e a dificuldade em sair fazem com que desistem.

—Levem-na ao hospital. —Ordena o delegado. —Levem esta mulher também. —Ele rosca, a encara como se quisesse matá-la, coisa que eu também queria e muito. —Irá passar alguns anos na cadeia. 

—Se eu interromper os rituais eu não vou conseguir nada. Todas as minhas riquezas vão ser tiradas de mim, minha alma padecerá. A deusa me consumiria se eu não lhe der o que quer.

—Isso já não é problema meu, maldita! 

Assim que os policiais levam a menina, mais outros levam madre Bianca algemada. Ao passar por nós se lembra de Ella, pois lhe lança um olhar maligno. 

—Foi você, sua vermezinha insolente. —Ela tenta avançar, mas é puxada para trás pelos policiais. —Animam tuam in infernis arderet, et semen tuum post peribit. Que toda a maldição deste lugar recaia sobre todos vocês. E que Sekhmet a deusa da destruição e do caos derrame sua fúria em suas vidas. 

Sinto meu corpo se arrepiar por um instante, ainda mais quando começa a falar em latim, mas não me afeta. Madre Bianca está louca e é bem visível de se notar. Provavelmente pararia em uma manicômio judiciário, com diretos a camisa de força e remédios controlados diários nas veias. 

—Parece que seu ninho de cobra foi desfeito, não é madame? —Ella a enfrenta, está com um sorriso satisfeito no rosto. É corajosa e eu fico orgulhoso. —Irá fazer seus rituais na cadeia. Aposto que as presas gostariam de fazer em você. —Ela bufa de ódio, tenta mais uma vez sem sucesso avançar em Ella. Falam mais algumas palavras em latim ao qual não entendo nada, porém tenho certeza que é algo ruim.

Ouvimos meia dúzia de protestos da falsa Madre, mas não adiantou nada. É levada para a cadeia e eu já podia ter a certeza que aquele pesadelo havia se encerrado. Tanto para Ella, como para as internas que seriam livres finalmente.

Abraço a minha menina, e sinto seu alívio. Deposito um beijo em sua testa, mas percebo que não é o suficiente para ela, quando toma minha boca em beijo tão forte e tão intenso que sinto minhas pernas fraquejarem de emoção. Aquele beijo me dizia tudo. Finalmente Ella está livre. 

O delegado balbucia para nós um "obrigado" eu sabia que não tinha condições nenhuma de falar mais nada, e que estava se segurando ao máximo para não perder sua pose. Sei que o que houve naquela sala e naquelas muros altos do colégio interno mudou e irá mudar as vidas de todo mundo.



***




—Está pronta para voltar pra casa? —Pergunto a Ella, enquanto arrumávamos nossas coisas para nossa volta. 

A notícia sobre o que acontecia no colégio já estava em todos os veículos de comunicações. Rádios, TVs, jornais. Ella tinha uma preocupação compreensiva se Robert Robson já soubesse, pelo visto tenho certeza que sim. O escândalo foi enorme, o colégio foi fechado e todas as meninas foram mandadas de volta para a suas famílias. O que deu um alívio enorme. Karoline, amiga de Ella ofereceu ajuda voluntária psicológica para cada uma delas, Ella ficou com vontade de ajudar também, mas precisávamos voltar para os Estados Unidos. Mas alguma coisa me dizia que voltaríamos mais vezes. Ella queria ajudar, queria passar-lhes todo o apoio possível. Dizer que ela superou e com certeza iriam superar também. 

Madre Bianca, junto com as outras freiras e os envolvidos, pegaram pena por vários crimes, incluindo falsificação ideológica, já que usou o clero como uma forma de enganar pessoas. Nem preciso dizer que estupro estava na lista, junto com tortura e maus-tratos. Porém como previsto, em um manicômio judiciário. A sanidade de Madre Bianca não era boa, e mesmo assim conseguiu convencer tantas outras freiras que agora iriam pagar pelos seus pegados. 

Um peso saiu de minhas costas por termos feito justiça. Mas é um assunto que muito me preocupa ainda. Não sabemos que tipo de criação nossos filhos estão tendo por aí, se estão sendo bem tratos, ou não. Estamos preocupados demais em colocar a responsabilidade em terceiros que fechamos os olhos para suas necessidades. Prestemos mais atenção no comportamentos de nossos filhos, vejamos mais o que estão precisando, conversemos mais com cada um. O diálogo sempre resolve os casos mais complicados. Falo "nós" pois é um comportamento natural do ser humano. Queremos ser pais, ter um tipo de autoridade em cima de nossas crianças e esquecemos que antes disto, somos quem eles podem confiar, ou confiarão em pessoas que irão leva-los para um caminho ruim. Antes de sermos pais, somos amigos e instrutores para a vida. 

Se Robson estiver sabendo o que aconteceu a Ella, sei que seria algo doloroso de se enfrentar. 

—Sim, estou. —Ella fechou sua mochila e a coloca no ombro. Fiz o mesmo. 

Pegamos o voo das duas e meia da tarde, para chegarmos aos Estados Unidos antes de anoitecer. Ella está com um sorriso de orelha a orelha, nem parecia que havia sofrido na vida. Algo lindo que dava gosto em ver. Finalmente consigo contemplar um sorriso sincero em seu rosto.

—Será que Robson já sabe? —Aquela pergunta que estava engasgada finalmente saiu. Ella está deitada no meu peito, levanta a cabeça um pouco só para me olhar. 

—Provavelmente. A notícia se espalhou rápido demais. —Imagino por um instante como seria a reação do meu sogro diante da notícia. 

—Acha que irá sofrer muito? 

A resposta daquela pergunta era bem óbvia, mas eu queria saber o que Ella acha, queria ter certeza se o fato de seu pai saber a constrange demais. 

—Meu pai é um cara muito responsável e centrado em tudo que faz. Acha que tem controle sobre tudo, que as pessoas fazem o que ele quer, na hora que quer. Sua capacidade em ser pulso forte no trabalho, ou até mesmo em sua vida, o torna um homem seguro de si ao ponto de ter a pretensão de que nunca errará em seus julgamentos. Nada que ele faça pode estar errado, ou falhar. Talvez encarando o fato que errou tanto comigo a este ponto, desestruturaria sim, com certeza. 

Abaixo a cabeça e assinto cautelosamente. Não quero pensar muito sobre qual seria a reação de Robson, só queria que as coisas voltassem ao normal, principalmente para Ella, o que consegui e muito durante este tempo todo. 

—Qual será o próximo passo agora? Voltar para casa e depois? —Ella sorriu.

—Quero fazer uma faculdade. Quem sabe entrar em uma aula de canto e me aperfeiçoar no piano? Ser uma pianista profissional? —Mordi meu lábio. Meu orgulho por ela crescia cada vez mais. 

—Perguntei em relação a nós dois, se iremos nos casar, ter filhos, mas ser uma pianista está de bom tamanho. —Começamos a rir juntos com a minha brincadeira. —Estou brincando. —Respiro fundo. —Fico feliz por seguir está carreira, você toca muito bem. —Recebo um beijo estalado na bochecha, junto com um sorriso encantador.

—Sim, é maravilhoso. Mas se quiser me pedir em casamento e me fazer filhos, também estou aceitando. —Ela gargalha, eu por outro lado fico todo envergonhado. 

Tudo que quero é fazer Ella feliz, busco essa missão desde o início e ainda penso muito nisto. Já está na hora de construir uma família, ter a quem cuidar. Chegar em casa depois de um dia difícil e ter alguém me esperando, morrendo de saudades em me ver. Mas sei que ainda está cedo demais para levar nosso relacionamento a este nível. Por mim já me casaria amanhã mesmo, mas não sei bem se é isso que Ella quer. Espero que sim, mas também espero aparecer o melhor momento para acontecer. 

Desembarcamos no aeroporto de San Diego no horário previsto. Meus dedos estão entrelaçados nos de Ella enquanto caminhamos. Estávamos sorrindo, conversando bobagens e paparicando um ao outro. Vez ou outra nos beijávamos, nos abraçávamos. Nunca me senti tão bem em toda a minha vida ao seu lado como naquele momento. Aquela nuvem ruim que pairava havia sumido completamente, estávamos leves. Mas aquele momento descontraído acabou assim que ouvimos um berro ecoar pelo local: 

—Ella! 

O grito nos paralisou, fez com que o sorriso tranquilo sumisse assim que ouvimos. Olho para frente e imagem acabada do meu chefe, que agora se tornara meu sogro, fez o meu estômago se agitar. Eu sei qual é o motivo que o fez Robert Robson está completamente desalinhado e chorando diante de nós. Engulo em seco por saber que soube da notícia pela TV.

Seus joelhos foram ao chão como um império mais poderoso do mundo sendo derribado por uma tempestade fortíssima e arrasadora. Está em uma postura humilhante e humilde. Não sei mais quem é, provavelmente um pai desesperado que sente culpa de tudo que sua querida filha sofrera por "sua culpa" durante tantos anos. Um homem que fez tudo errado em sua criação, mas que ainda ama com todas as forças ao ponto de enlouquecer quem ousasse a mexer com a sua princesinha. O típico pai que tenta acertar, mas tudo que faz é errar. 

Ella solta dos meus braços e corre em sua direção, é tão rápido que nem consigo piscar. Se agacha na tentativa de amparar o pai quando está bem perto dele, e o abraça. 

—Me perdoa, minha filha, me perdoa! —Está choramingando agora. Sua respiração é descontrolada, seu corpo chacoalha pela tremedeira. Penso que Robson irá ter um treco a qualquer momento. 

—Está tudo bem, papai! —Ella também está chorando. É um momento dos dois, um encontro, pedido e aceitação de perdão. 

Uma aproximação entre eles, como uma conexão que foi arrancada dos dois depois de tanto tempo. Não há como ficar imune, não há como não se emocionar. Seguro na boca para conter a emoção, mas as lágrimas veem inevitavelmente. É transbordante, genuíno. 

—Se eu soubesse... É tudo culpa minha! Eu sempre fui um péssimo pai! Um hipócrita, que estragou tudo. 

—Não é culpa sua, papai. O senhor não sabia. —Ella tenta levantá-lo, mas parece que não é o que ele quer. Acho que o desejo de Robson era se jogar no chão em desespero. 

—Eu deveria saber, Ella. Porra! Você é minha filha, eu deveria cuidar de você. Eu deveria ter ficado ao seu lado nos bons e maus momentos. Invés disso, fui um filho da mãe cheio de medos. Um cachorrinho assustado por ter construído uma família. Eu matei sua mãe! Pelo visto acabei matando você também. 

Tento intervir, ajudo Ella a levantar o pai. Os olhos avermelhados e tristes de Robson me encaram. 

—Você sabia, não é? —maneio a cabeça sem muito querer fazê-lo. —Eu sempre soube que era a melhor escolha para a minha filha, mas nunca imaginei que seria tanto assim. —Seus lábios estão tremendo muito. 

—Eu a amo, senhor. Eu faria qualquer coisa por ela. —Recebo um abraço de Robson, um abraço forte que sei que é de gratidão. Me sinto abençoado, como se recebesse uma recompensa apenas por ser eu mesmo.

—Parece que você foi a melhor coisa que fiz na vida dela. —Ela concordou. 

Robson abraça sua filha de novo, aquele abraço de amor ao qual tenho a certeza que nunca se quebraria novamente. Nada e nem ninguém poderia quebrá-lo, porque era mais forte do que tudo. O sentimento mais bonito que já vi.






Capítulo 22 —Ella Robson


Meses mais tarde

Sabe aquela sensação apaziguadora que sentimos por dentro quando tudo finalmente está em paz e em ternura? Uma comoção agradabilíssima faz todo o seus músculos relaxarem. Então você se joga na cama e tem um sono longo e gostoso? É como estou sentindo neste momento. 

Acho que me tornei inabalável e que nada de ruim ousasse a me abalar novamente. 

Sinto os braços fortes do amor da minha vida envolta de mim enquanto olhávamos aquela vista do mar da lancha de papai, ao qual nos disponibilizou para comemoramos, está bem propício para o meu estado de espírito. Há uma flor presa no meu cabelo que Michael colocou dizendo que ficava bem em mim. 

—Uma vez você me perguntou o que eu esperava do futuro, lembra? —Perguntei a Michael, virando a cabeça para trás para olha-lo nos olhos.

—Sim, eu lembro. Eu disse os meus interesses profissionais e você só queria se livrar do peso do seu sofrimento. E, claro, ser feliz. —Sorri voltando a olhar o mar. O vento bagunçava os meus cabelos. 

—Acho que alcancei o meu objetivo. Não existe pessoa mais feliz do que eu. —Senti um beijo cálido na minha nuca assim que Michael afastou os meus cabelos. 

—Sim, existe. —Olho de novo para os seus olhos, esperando que completasse a frase. —Eu sou esta pessoa. 

Sorri coberta por uma emoção pura e arrebatadora, ele toma os meus lábios em um beijo tão romântico que dava vontade de chorar, mas claro, de pura felicidade. Acho que não podia ter tido alguém melhor para chamar de meu. Michael e eu fomos feitos um para o outro. Sei que é piegas demais, mas é só a verdade, simples e crua. 

—Ei, ei, ei. Não podem esperar o casamento? —Papai aparece interrompendo o nosso beijo. Sim, ele foi conosco e está com uma taça de champanhe nas mãos. —Quer saber de uma coisa, Michael? Acho que me deve uma por ter ficado com uma mulher tão maravilhosa quanto a minha filha. Eu fiz ela, e depois lhe entreguei de mão beijada. —O humor de papai nos fez rir. 

—Nunca duvidei disso. —Michael levanta as mãos em rendição acompanhando a brincadeira de papai. —Você sempre foi responsável por tudo, Robert. Vou lhe agradecer imensamente por todo o bem que fez a mim.

—Então mais que na hora quero cobrar a minha participação em sua felicidade. —Ambos nós olhamos para o meu pai com desconfiança. —Ah, não! Não façam essas caras, não é algo absurdo. Só estou comunicando que darei todo o apoio para que Michael abra a sua própria empresa de publicidade. Sei que sempre foi o sonho dele crescer nesta área. Nada mais justo que fazer isso ao meu genro que sempre cuidou da minha filha, até melhor que eu, não é mesmo? 

—Uau! —Michael está embasbacado, eu por outro lado sinto orgulho do meu pai por este marco. —Eu nem sei o que dizer. 

—Não diga nada. Só aceite. Não quero que meus netos morem em um apartamento pequeno no subúrbio de San Diego. 

—Se depender de mim, os seus netos serão as crianças mais felizes desse mundo. Muito obrigado. 

—Eu não tenho nenhuma dúvida. —Papai estende as mãos para Michael e os dois se cumprimentam, selando ali uma parceria para a vida. 

Não sei se um dia Michael e eu nos casaríamos, ou teríamos filhos. Estávamos namorando e para mim já era maravilhoso. Michael e eu somos um do outro e não é um papel de cartório que irá concretizar isto. Quando penso em minha vida no que foi e no que está sendo, só vejo o quão forte fui. E que todos os problemas por mais difíceis e conturbados poderia ser, há sempre uma solução. Uma palavra amiga, um rumo diferente que possamos seguir para superar, um amor que seria capaz de fazer tudo para te ver sorrir. Michael me deu a vida novamente, se empenhou para conseguir em mim tudo que desejava. "Um sorriso sincero" acho que não poderia ter um sorriso mais sinceros do que tenho hoje em dia. 

Aquela vida ruim ficara toda para trás. Me empenhei em ajudar Karoline com as vítimas que sofreram como nós, viajando vez ou outra para o lugar que jurei nunca mais pisar os pés. Mas eu sabia que precisavam de mim, de conhecer a minha superação, de serem fortes assim como fui. E posso dizer que foi gratificante. Tornara a minha vida útil, com mais cor e mais propósito. Quem irá dizer que existem razão pelas coisas feitas pela vida? 





FIM















































































84 comentários:

  1. Que lindo! Ja amei já,to aqui até o final.Ansiosaa

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  2. Olá meninas \o
    Então este é mais uma história que vim contar para vocês.
    Queria dizer que é uma história toda fofa, mas com muita muita tristeza
    principalmente pelo passado de Ella.
    Quero dizer a vocês que esta história não tem nada a ver com as minhas crenças
    ou com nada que passei na vida e nem o que penso. Que a figura do Michael usada nos textos
    é o seu personagem e nada de fato a figura dele. Bom, vocês são pessoas inteligentes e que sei que sabem entender. Nada de mimimimi dizendo que "Michael não está no meio dessas coisa e blá blá blá" Vou excluir comentários deste tipo, fiquem avisadas kkkkk sei que a maioria não fará, mas levando em conta algumas peças que aparecem... Em fim.

    Essa história tem trilha sonora, então é de suma importância que ouçam as músicas nos capítulos com os vídeos, pq faz parte da história. É uma história, na minha opinião, legal de se ler. Eu não sei, pq meu conceito de escrita mudou muito e pra pior viu kkkk então não sei se vão gostar como eu gostei. Espero que sim.
    Fique comigo que dia 11 tem \o/

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  3. Dia 11 ja chegou \o/ ... Ja pode postar, Tay ❤

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  4. Genteeeeee cheguei <3
    Desculpa não ter vindo postar ontem, eu tava sem net pq me mudei.
    Obrigada por estarem aquui <3 vou postar *-*

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  5. Quais vão ser os dias de postagem Tay? Continuaaa!!

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  6. Olá meninas *-*
    Obrigada pelos coments <3
    Postarei mais <3

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  7. Olá meninas cheguei com mais *-*
    Gente eu gostaria muito de saber o que estão achando da história
    sua interação no que vcs estão lendo "continua" não me revela nada kkkk
    Vamos lá com mais.

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    1. Me parece que Michael tera que trabalhar muito para mostrar a Ella que a vida não é da forma que ela pensa,e ela so vai mudar qnd Mike ja estiver se cansando e ela se apaixomar por ele...ai espero que eu esteja certa...kkkkk posta dois capitulos por favor

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  8. Tay eu estou amando demais ... Continua *-*

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  9. Tay pq ta demorando tanto pra postar?

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  10. Cheguei, cheguei, cheguei <3
    Desculpa a demora.
    Obrigada pelos coments, postarei mais um cap pra vcs <3

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  11. Muito bom! Ella não deveria entrar por esses caminhos, apesar do pai dela ser tão incensível...Michael têm de ajuda-la ....continuaaaa.....

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  12. Quero ler mais capitulos eu preciso por favor...

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  13. Cheguei com mais \o
    Obrigada pelos coments

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  14. Michael não vai se opor?kkk ……Continuaaa!

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  15. estou muio muito muito ansiosa pq agora ojá se sabe a intensão de Robert: Ele quer que Michael seja seu genro

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  16. estou muio muito muito ansiosa pq agora ojá se sabe a intensão de Robert: Ele quer que Michael seja seu genro

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  17. continuaaaaa pelo amor de deus!!!

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  18. Não demore pra postar já rui todas as unhas

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  19. Não demore pra postar já rui todas as unhas

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  20. Chegueeeeeeeeeeeei \o
    Vou postar dois caps pra compensar, suas lindas. Obrigada pelo carinho!!!

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  21. Olá, suas lindas!! Cheguei com mais \o
    Vou postar dois caps de novo pq sou boazinha :v <3
    Obrigada pelos coments, suas lindas.
    Próximo capítulo será um bônus
    narrado pela Ella, então terá muitas revelações sobre o que ela passou no internato.
    E muitas coisas irão desenrolar com o nosso casal. Fiquem ligadas.

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  22. ESSE MICHAEL É UM FOFO!

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  23. Estou muito ligada Tay!!! E amando tb!! Michael está tão fofoh e gentil!❤ Continua...

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  24. Genteeeeee, cheguei com dois caps muito intensos. Então leiam com cuidado e muita calma. Esses dois são fofos demais. Vamos lá então;
    Obrigada pelos coments. Quero comente enorme dessa vez hein? kkkkk

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  25. Meu Deeeeuuuss!!! Oh Tay por que vc para!!??? Eu hein!!? Kkkkkk quero nudez kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

    #Parei
    Continua logo se não eu morro de ãnciedade

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  26. kkkkkk rindo do comentário de vcs <3
    Gente, obrigada por estarem aqui comigo.
    Vamos lá com mais um cap da fic <3
    Ouçam a música, pelo amor de God

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  27. Ella tem q se abrir para o Michael!!"AssimEuFicoSabendoLogo"... Michael ta tão carinhoso😍😘❤Continuaaaaaa

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  28. Estou amando toda essa historia,Michael esta apaixonado por Ella e ela por ele,ela so precisa se livrar desses fantasma que a sombra e se jogar nos braços de Mike.

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  29. Para de me fazer chorar mulher ! obrigada, de nada ! e continua ! tá maravilhosa, eu amo tua escrita ! ❤

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  30. Genteeeeeee cheguei! Nossa que lindo chegar aqui e ler esses coments fofos. Obrigada de verdade a cada uma de vcs viu? Logo Michael vai saber sim, fiquem tranquilas. Obrigada, obrigada e obrigada.

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  31. Volteeeeei
    Obrigada pelos coments, suas lindas.
    trouxe mais um cap pra vcs, dessa vez um hot <3

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    Respostas
    1. Posta Mais flor!!!!!!!!!! Não demore por favor!! 😢😢😢😩

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  32. Ai q tudooooo!!! LINDOS!!!! Michael sempre sendo fofoh e maravilhoso..❤ Continuaaaa

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  33. Lindos!!!!!! Eles ❤❤❤❤❤❤❤❤ quero mais Nudez kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
    CONTINUAAA AMANDO DEMAI!!!*---*

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  34. Oiii oiii oii
    Cheguei gente. Obrigadaaaa pelos coments suas lindas, vamos lá com mais <3

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  35. nossa quanta emoção os dois se amarem de tal forma que ate me senti feliz.Mais uma coisa me incomoda...acho que o Sr Robson sabe do passado da filha,ou estou errada? continua vai morrendo de curiosidades.

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  36. nossa quanta emoção os dois se amarem de tal forma que ate me senti feliz.Mais uma coisa me incomoda...acho que o Sr Robson sabe do passado da filha,ou estou errada? continua vai morrendo de curiosidades.

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  37. Oiiii oii cheguei!!
    Obrigada pelos coments de vcs <3
    Será que desta vez Michael vai saber a verdade? veremos <3

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  38. Que horror que a Ella viveu..meu deus!! Isso não era freira que nada eram demônios..😡😡😡😢😢😢

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  39. adorei essa fanfic parabéns Tay Jackson

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  40. o enredo é impressionante tem misterio duvidas incertezas.Mas no fim das contas, foi e continua sendo perfeito

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  41. o enredo é impressionante tem misterio duvidas incertezas.Mas no fim das contas, foi e continua sendo perfeito

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  42. adorei essa fanfic parabéns Tay Jackson

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  43. Emocionada com esse capítulo..quanta dor e decepção Ella teve...Michael agora têm mais do q nunca a missão de salva-la desse inferno ao qual viveu....Continuaaa❤❤

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  44. Triste ais ela conseguiu se libertar agora

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  45. Cheguei gente!!! Nossa, que lindo vir aqui e ler esses coments lindos desse jeito. Muito obrigada mesmo por tudo, suas lindas <3
    Vamos com mais aqui pra vcs. :3

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  46. UAU!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! SHOW DE BOLA!!!!!!!!!!!!

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  47. " a mulher que você foi pra cama" kkk acho que deveria ser " a mulher que você foi pra grama" kkk amando a fic!!

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  48. Continuaaaaaaa quero ver o delicioso Michael kkkkkkkkkk

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  49. NOSSA!! NESSA FIC O MICHAEL TÁ TOTALMENTE GOSTOSO, SEXY E QUENTE. ....SÓ DE IMAGINAR ELE COM AQUELE CORPO DEFINIDO FICO COM INVEJA DA ELLA.....PODE RIO TÁ CAVALGANDO NAQUELA DELICIOSO DE CORPO KKKKKKKKKKK
    CHEGAAA PAREI KKKKKK CONTINUAAA LOGO ......

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  50. OOOWWW
    Continua.. finalmente to vendo essa fic completamente finalizada..
    Ficou show.. to ansiosa pra ver tudo..

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  51. Cheguei com maaaaaais \o
    obrigada pelos comentários calorosos, suas lindas. fico muito feliz <3
    Obrigada mesmo. Vamos lá com mais *-*

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  52. Anciosa pra saber o desfecho dessa fic

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  53. Cheguei com mais \o
    Obrigada pelos coments <3

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  54. Olá meninas, feliz ano novo para todas <3
    Obrigada por estarem aqui comigo mais este ano.
    Obrigada de verdade.
    Estamos na reta final de Aprendendo a viver, então leremos os momentos
    decisivos. Vamos lá com mais.

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  55. Rituais Satânico!! DEUS É MAIS!!!

    AINDA BEM QUE ESSAS "DEMONIAS" VÃO SER PRESA!!!!

    LINDO O AMOR DE MICHAEL E ELLA ❤❤❤

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  56. Olá suas lindas! Cheguei com mais pra vcs
    Obrigada pelos coments.
    Hj será postado o penúltimo capítulo, segunda volto com o final.
    Vamos lá

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  57. Continua *..* a não já está acabando ?!

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  58. Oii, cheguei com o final pra vcs <3
    Queria agradecer de coração quem esteve comigo do começo ao fim
    Obrigada por ter comentado em cada capítulo, obrigada por tudo.
    Aprendendo a viver chega em sua reta final e não tenho previsão de uma nova história
    Não tenho nada pronto ainda e nem ideias novas, então pela primeira vez na vida desde quando comecei a escrever
    Vou ficar um pouco afastada até poder trazer para vocês fics novas. Mas não se preocupem, não vou demorar muito, não sei viver sem escrever. Mas estou escrevendo uma fic com a Paulinha, então logo postaremos ela.
    Beijão e até breve

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  59. Omg!! Agora q voltei, acabou!!!foi linda Tay!! Parabéns!!! e espero ansiosa por novas fics suas❤ bjus😘😘

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  60. Parabéns Tay, espero uma historia em breve vou sentir saudades. Bjs

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